Escrever para o <b>Vírgula</b> é uma grande alegria, principalmente pela oportunidade de divulgar uma ciência pouco conhecida e, ainda assim, mal interpretada.

Você sabe o que é a Psicologia do Esporte? É a ciência que estuda os fenômenos psicológicos que ocorrem antes, durante e depois de qualquer atividade física ou esportiva. O lado mental ainda é pouco considerado no meio esportivo. De três anos para cá, este quadro vem mudando, mas ainda tem muito chão pela frente. As técnicas e ferramentas que esta ciência oferece para a otimização da performance esportiva são extremamente importantes. O psicólogo, neste país, ainda é concebido com muito preconceito (em todas as áreas). São poucas as pessoas que assumem a necessidade de se desenvolver um trabalho de prevenção e promoção da saúde mental no esporte.

Ultimamente, alguns técnicos começaram a utilizar a palavra "Psicologia" de maneira equivocada. Estevam Soares e Péricles Chamusca, por exemplo, treinadores que mudaram o panorama de suas equipes dizem que o "trabalho psicológico" que estão desenvolvendo nos clubes tem auxiliado bastante no progresso de suas equipes. Gostaria de entender melhor quais as bases deste trabalho.

Ora, amigos, pronunciar palavras de apoio e motivação não significa, necessariamente, atuar psicologicamente. A ciência denominada "Psicologia do Esporte’ vai muito mais além dos discursos inflamados. Os tais "motivadores de plantão" adoram inflamar equipes através de seus shows pirotécnicos e verborrágicos. Se o acaso permitir, eles serão incluídos no sucesso da equipe. Do contrário, afundarão com os demais marinheiros.

A popularização do processo psicológico esportivo abre sérios precedentes para o distanciamento da execução de projetos sérios, compromissados com as normas científicas e atentos às demandas dos atletas.

Um psicodiagnóstico (levantamento das demandas psicológicas individuais e coletivas) é o primeiro passo para o sucesso da intervenção. Trabalhar questões relacionadas com a motivação, ansiedade, concentração, estabelecimento de metas e foco dependem diretamente dos resultados obtidos nesta etapa inicial. Um treinador não tem habilitação para desempenhar tarefas tão específicas como as citadas acima.

Muitos ainda acreditam que o psicólogo é um fazedor de milagres e só é lembrado quando a doença já tomou o corpo mental dos atletas e das equipes. A forma pela qual é anunciada a contratação de um psicólogo denuncia a dramaticidade da situação em que a equipe se encontra. Com isso, os próprios treinadores tomaram à frente, anunciando que suas "atuações psicológicas" têm sido priorizadas na preparação esportiva de seus clubes.

Vamos com calma, treinadores. É de extrema importância que os senhores valorizem o lado psicológico e emocional de seus comandados. Alerto, no entanto, para o risco iminente que estas atuações podem causar nos elencos.

O Corinthians pagou um preço altíssimo, ano passado, quando foi desclassificado da Libertadores por excesso de motivação. Os jogadores já haviam ultrapassado os limiares de ativação. Os nervos ficaram expostos. A concentração e o equilíbrio emocional simplesmente se dissiparam no meio de tantas expectativas e "trabalhos psicológicos motivacionais".

A coisa não é tão simples assim. É preciso conhecimento da área e bom manuseio das ferramentas oferecidas por esta nova área científica desportiva.

Não há como negar que Palmeiras, Santo André e Santos estão em plena ascensão. Estas equipes são dirigidas por treinadores que reconhecem as influências diretas exercidas pelos fatores psicológicos.

Cuidado, apenas, para que a tal "Psicologia" que os senhores andam "praticando" nos clubes não crie, ainda mais, preconceitos e desinformações recorrentes no mundo da preparação mental no esporte nacional.

<i><b>João Ricardo Cozac</b> é psicólogo formado pela PUC-SP. Atua no esporte há 11 anos. Professor de psicologia do esporte na Universidade Mackenzie de São Paulo. Presidente da Consultoria, Estudo e Pesquisa da Psicologia do Esporte (www.ceppe.com.br). Atende atletas de diversas modalidades em consultório. Atuou em grandes equipes do cenário futebolístico brasileiro, como Corinthians, Cruzeiro e Goiás. Colunista do site “Gazeta Esportiva.net”. Autor do livro ‘Com a cabeça na ponta da chuteira: um ensaio sobre a Psicologia do Esporte’, pela editora Anablume e do livro ´Psicologia do Esporte: clínica, alta performance e exercício físico’, em fase final de edição.</i>


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Psicologia Esportiva: ciência e banalização