Banda Larga Cordel, o novo álbum do mestre Gilberto Gil, chega as lojas no final de julho e promete mostrar a todos que o sonho da tropicália se realizou.

A linguagem fragmentada pregada pelo movimento nas décadas de 60 e 70 converge para o primeiro álbum de inéditas de Gil em 11 anos.

Confira agora os comentários do cantor e compositor baiano sobre as faixas de Banda Larga Cordel.

DESPEDIDA DE SOLTEIRA
Recupera a tradição da malícia, como o Xote das Meninas que, para os anos 50 era uma ousadia. Despedida de solteira pode ser encarada como um comentário profundo, sobre um tema polêmico, dito pela pimenta do xote.

OS PAIS (com Jorge Mautner)
“Na véspera da gravação, fiquei inventando arranjos para essa música na guitarra, mas o resultado acabava mais complicado do que simples”, confessa Gil. “Quando o Liminha disse ‘vamos gravar, eu peguei a guitarra e fiz um som completamente diferente, coisa a la Jorge Benjor e meia hora depois tínhamos um resultado muito melhor do que a gente estava pensando”.

NÃO GRUDE NÃO
Quando assistiu ao copião do filme “O homem que desafiou o diabo”, para o qual se comprometera a escrever uma letra para o diretor Moacyr Góes, Gil ficou fascinado pelo bordão “não grude não”, repetido corriqueiramente pelo protagonista vivido por Marcos Palmeira. Daí nasceu a música. É uma vitória sobre o tempo, mas, ao mesmo tempo, uma derrota, porque ele, o tempo, inevitavelmente, passa. Se escafede. Ao mesmo tempo em que o ser humano é um itinerante no mundo, ele está preso à vida, aos afetos, sabores e desamores.

SAMBA DE LOS ANGELES
Regravação do original do Nightingale. Há um tempo atrás, Gil tocava essa música no violão, de um modo mais rústico, e o filho José gostou muito da nova roupagem. Lembrando do filho, começou a cantá-la no show da turnê Banda Larga e, por conta disso, resolveu regravá-la. “É um samba em 6/4, quase como um sorongo, que não é um samba binário, é ternário. E é de Los Angeles pois tem uma esquisitice que os músicos de jazz, sobretudo os de lá, gostam”, brinca Gil.

LA RENAISSANCE AFRICAINE
Feita por encomenda do festival de artes negras, que vai acontecer em 2009, na África. Gil escreveu uma boneca da letra para ser enviada pra Manu Dibango e Youssou Undour, mas acabou sem resposta. Compôs a letra tendo em mente o Senegal, daí a inclusão do trecho em francês. Qual foi a surpresa, no entanto, quando Gil mostrou a música para Liminha e Bem e eles reconduziram a música para um outro caminho. É um exemplo de “terceirização” da criatividade, como o próprio Gil gosta de chamar, que veio adotando nos últimos trabalhos e, sobretudo, nesse, em função da agenda ocupada no ministério.

NAO TENHO MEDO DA MORTE
Composta em Sevilha, durante a turnê européia de 2007. A letra foi escrita como um pop up, assim, de chofre, numa manhã no quarto do hotel. Quando Gil chegou ao Brasil, mostrou a letra para o filho Bem e explicou que pretendia um arranjo puxado para a cultura nordestina, para o cordel, baião, uma toada. Bastou. Um dia, Bem programou uma levada nordestina em sua maquina de ritmo e o próprio Gil se encarregou do arranjo que, assim como no processo de criação da letra, foi concluído de supetão. Uma espécie de “irmã pagã” de Se eu quiser falar com deus; deus, ou a plena vivência de sua ausência.

AMOR DE CARNAVAL
Eu tocava acordeon antes, mas não compunha nele. Quando veio o violão, por causa da Bossa Nova(João, Tom, Baden, Lyra) nesse sentido musical e o momento inicial meu, inspirado na Bossa Nova. Minha relação com o ímpeto romantizante que eu tinha, todo encontro no carnaval tinha que ser um namoro eterno. Eu idealizava, Naquela época brincávamos muito nos clubes, dançávamos as marchas no salão e surgiam as paqueras. O carnaval era um momento pra isso, destamparem as tampas de Eros, era o lugar e o momento de levar a permissividade. Acabava o carnaval, eu estava sempre apaixonado por alguém. Alguém que eu não via mais, sumia. O tema do samba é esse.

GUEIXA NO TATAME-
O conjunto dessa musica, eu tinha feito para o NEGA NA JANELA naquele disco de sambas de breque com Germano Matias, ainda na época da Polygram eu cantava essa musica que eh uma musica pesada. Eta nega tu eh feia/ Dei um murro nela e joguei ela dentro da pia. Ela eh politicamente incorreta racista, .machista. Todo mundo falava, Flora falava: Como você, ainda mais agora Ministro, pode cantar uma musica tão barra pesada? O retrogrado que esta aí… Enfim eu não me incomodava muito. Ao mesmo tempo achava o arranjo da musica tão interessante, não queria abandoar a moldura da musica. Pensei Vou pintar outro quadro pra essa moldura. Vou começar fazendo com a mesma forma. Ai veio a idéia de Gueixa no Tatame. Não sou de queixa mas a gueixa me iludiu…. Mantive o esquema de rimas internas. Eh como se fosse uma outra letra outra musica para o blues. Eh como se eu tivesse feito daquela musica um gênero de samba. Fiz da Nega na Janela uma base pra Gueixa no Tatame.

A FACA E O QUEIJO
Desde Flora e A linha e o linho, Gil não compunha para sua mulher, Flora. “Poxa, Gil, há muito tempo que você não faz uma música pra mim”, brincou ela certa vez. “Um exagero”, retrucou o cantor, mas foi daí que nasceu A faca e o queijo, em homenagem a Flora. A faca e o queijo é a antiguidade, a modernidade e até a pós-modernidade do amor. Gil: “Resolvi fazer em estilo de balada americana. Liminha quis trazer mais pro jeito Motown, mais blues, mais elegante”.

OUTROS VIRAM
Ao lado de Os pais, foi uma das primeiras músicas compostas do disco (ambas em parceria com Jorge Mautner). Surgiu a partir das histórias contadas pelo parceiro, Mautner, sobre os grandes homens (Maiakovski, Ted Roosevelt, , Walt Witman) que profetizaram que do nosso país nasceria uma grande nação. Versa também sobre e, complementarmente, o processamento de misturas do Brasil: o bebê de Rosamaria, e não de Rosemary nascia com anjos cantando.

CANÔ
Celebração da vida, ijexa, o afoxé, ritmos do recôncavo muito natural daquela região. Uma vez, em São Paulo, quando Gil estava cantarolando a melodia da música, composta há um bom tempo, ele conta que a palavra Canô o rondava. Isso foi antes do aniversário de 100 anos da mãe de Caetano Veloso e Maria Bethânia. Segundo Gil, ele pensou também em Oscar Niemeyer e Dercy Gonçalves.

MAQUINA DE RITMO-
A Maquina de Ritmo é como qualquer outro instrumento. Caetano, por exemplo, as vezes diz que não gosta mas usa. Foi feita pra isso. E aquela coisa que a gente vai passando pro plano da mecanização pra ficar livre pra outras coisas. Essa musica eh pra resgatar, e de redenção da Maquina de Ritmo que é rejeitada pelos puristas. Se aperto o botão meu coração há de dizer que e samba sim Pois o samba e o instrumento que a gente tocar. Desde a caixa de fósforo que Ciro Monteiro tocava magistralmente, peguei o Bem pra tocar caixa de fósforo comigo em Aquele Abraço. Milhares de Canais, mais de 100 milhões de bambas de Escolas de Samba virtuais. Daí por diante, samba avante sem precisar de mim. Essa automação que vai tomando sempre em nome do espírito. Uns programao hip hop, alguns programam sambas no futuro você vai tocar meu samba duro sem querer.

BANDA LARGA CORDEL
É a mais política das músicas do disco. O município de Piraí, no Rio de Janeiro, criou um processo de provisão de meios eletrônicos para a população e estimulou o Ministério da Cultura a se posicionar em relação à oferta de um sistema de banda larga. O episódio propiciou uma ação mais efetiva no processo político de inserção das novas tecnologias. É a música que resume a “política” do disco, ou seja, a intersecção do próprio discurso político com o campo poético.

O OCO DO MUNDO
Também era pra ter entrado na trilha do filme “O homem que desafiou o diabo”, do diretor Moacyr Góes. “Produzimos uma demo e acabou não entrando e quando Liminha ouviu disse: já pode entrar no CD pois já tem um caráter, uma base, um formato.”
“O oco do mundo” também é uma fala do protagonista do filme, dita já perto do fim do filme. “Registrei aquilo. Bem, programe aí uma levada pesada”, pediu Gil. “Ele programou e eu saí cantando a canção em ritmo de poesia, rap”, “com elementos de rock, harmônicos, tem uma coisa dramática, carregada”. A bateria pesada foi feita por Bem e complementada por Alex Fonseca. Gil comenta a música: “Eu gosto de muitas imagens. O contentamento em fazer a música se dá logo na primeira estrofe: um raio de sol sem luz. Por ver preenchida essa necessidade filosófica de dizer o sim e o não ao mesmo tempo, o fato de dizer isso nos faz imaginar. Ainda que essa imagem não tenha suporte, nos faz imaginar.

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Gilberto Gil comenta faixa-a-faixa seu novo álbum

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