No mesmo passo em que cresce a variedade de informações e criações disponíveis na web, o cerceamento a conteúdos protegidos pelas legisçaões de direito autoral é cada vez mais rígido. Nos últimos meses, governos de vários países aprovaram leis que proíbem downloads de arquivos protegidos por copyright, enquanto associações da indústria fonográfica, de cinema e de softwares têm vitórias judiciais contra sites e internautas “piratas”. E a caça ao download “ilegal”, tão recente quanto assustadora para usuários comuns da rede, ameaça chegar ao Brasil.

No dia 17 de abril, Gottfrid Svartholm e Fredrik Neij, responsáveis pelo site Pirate Bay, foram condenados a um ano de prisão e ao pagamento de uma indenização de 30 milhões de coroas suecas (2,7 milhões de euros) por violação de direitos de propriedade intelectual. A página é um dos maiores indexadores de torrent do mundo e principal referência para quem compartilha arquivos na web.

Outro site conhecido mundialmente nesse segmento, o Mininova, também enfrentou problemas: sofreu uma ação civil por parte do grupo antipirataria holandês BREIN, que acusa os mantenedores do site de violação à propriedade intelectual. A ação se encontra atualmente em julgamento: o veredito deveria sair no dia 2 de junho, mas está atrasado.

Há cerca de um mês, a Assembléia Legislativa (equivalente ao Congresso Nacional) da França aprovou uma lei que pretende banir da internet as pessoas que infringirem leis de propriedade intelectual. Quem for detectado fazendo download ilegal pela primeira vez receberá um aviso por e-mail. Se tentar um segundo download, receberá um e-mail novamente e, na terceira tentativa, uma notificação oficial. Caso o acusado persista, perderá o direito de acessar a internet por um ano.

O Brasil também está embarcando na onda e tentando adotar iniciativas legais para acabar com a liberdade de downloads irrestritos. O caso mais simbólico é o do senador Eduardo Azeredo, que criou o Projeto de Lei Substitutivo PLS 137/2000 e PLS 89/2003 para acabar definitivamente com o anonimato na web no Brasil.

O projeto do senador prevê que “é crime permitir, com negligência ou dolo, acesso a rede de computadores ou internet ou sistema informatizado, por usuário não-identificado e não-autenticado”. Os provedores serão obrigados a guardar as informações de conexão e identificação do usuário – ou seja, nome e endereço do assinante, endereço do protocolo IP e número do telefone – por três anos, além de  relatá-los às autoridades se necessário.

Amadeu diz que a lei, se aprovada, atingirá todos aqueles que usam a internet para compartilhar conteúdo. “O Twitter, o Facebook, o You Tube, o site da paróquia da sua preferência, o WordPress, a Wikipedia, enfim, quase todo mundo que monta uma página na web será afetado”, afirmou ele, que teme não só pelos usuários dessa nova internet como pelas criações artísticas. “O senador considera que traduzir um mangá é um crime tão grave como invadir um banco de dados e subtrair dinheiro de um aposentado”, indigna-se.

Contestação

Esse cenário de perseguição, que interfere diretamente nos direitos do internauta, é questionado não só por milhares de usuários que baixam música na web frequentemente para uso privado como também por especialistas da área. Segundo Sérgio Amadeu da Silveira, especialista em inclusão digital e militante do software livre, “ninguém que ‘baixa músicas’ faz isso ‘ilegalmente’. Esta concepção é absurda e viola a idéia de uso justo de obras cerceadas pelo copyright”.

De acordo com Amadeu, todos os conteúdos presentes na web podem ser trocados, recriados e passados adiante, já que criações artísticas não têm função de ser existir a não ser quando compartilhadas. “As redes digitais permitiram que as práticas recombinantes ganhassem novamente destaque e assumissem um papel cultural de destaque. O remix, a colagem e a fusão de ideias são essenciais à criatividade”, explica.

O especialista garante que, se os usuários da internet não puderem mais compartilhar conteúdo, criarão outra maneira de buscar informação. “Se destruírem a rede, outra será criada. É impossível fugir disso”, garante.

Prós e contras

Sendo ou não uma atitude válida sob o ponto de vista da disseminação da cultura, não dá para ignorar o fato de que baixar música na web é uma prática considerada criminosa pela indústria internacional do copyright. E há uma razão em especial para combatê-la: segundo relatório oficial divulgado pelo governo britânico, os downloads ilegais causam prejuízo de cerca de 12 bilhões de euros por ano na economia do Reino Unido. David Lammy, Ministro de Propriedade Intelectual inglês, afirmou que “downloads ilegais roubam milhões e milhões da economia e arruínam diversos esquemas que buscam a inovação do setor cultural”.

No Brasil, segundo relatório da Aliança Internacional sobre Propriedade Intelectual, a situação dos direitos autorais é uma das mais complicadas no mundo. A estimativa de prejuízo em razão da infração das leis de direito autoral é de US$ 117 milhões no ano passado, um crescimento de 48% em relação a 2007.

O estudo afirma que o maior problema no Brasil é a venda de álbuns e DVDs ilegais em camelôs e mercados informais – nada a ver, portanto, com a rede mundial de computadores. Entretanto, considerando que o Brasil tem um número estimado de 67,5 milhões de usuários de internet, o problema na web também seria grave. “Todo ano existem mais de 1,7 bilhões de downloads ilegais no Brasil”, garante a entidade.

Estudos da Federação Internacional da Indústria Fonográfica, porém, mostram que, longe de ser vilão, o meio digital é cada vez mais influente e necessário para o desenvolvimento da indústria musical. Segundo relatório publicado este ano, a indústria da música digital internacional teve em 2008 seu sexto ano seguido de expansão, crescendo em um número estimado de 25%, ou seja, US$ 3,7 bilhões em valor de mercado. Além disso, o mercado da música digital hoje “equivale a 20% das vendas de todos os lançamentos da indústria”.

Mais dados: o download de faixas avulsas cresceu 24% em 2008, num total de 1,4 bilhões de músicas. No mesmo período, o comércio de álbuns digitais cresceu cerca de 36% – o campeão de vendas, Lollipop, do rapper Lil Wayne, vendeu no ano passado cerca de 9,1 milhões de unidades, contra 1,8 milhões do lançamento mais bem-sucedido de 2007: Back to Black, de Amy Winehouse.

Alternativas

Ainda que todo tipo de conteúdo, protegido ou não por copyright, possa ser encontrado na web para ser copiado e modificado, existem licenças específicas para quem quer fazer esses procedimentos sem infringir a lei.

O Creative Commons é a mais utilizada e permite que qualquer propriedade intelectual seja registrada. Se você compor uma música  e disponibilizá-la na web, por exemplo, pode se cadastrar no site do Creative Commons e escolher entre dois tipos de licença: sampling, que permite que outros usuários espalhem sua música, baixem gratuitamente e usem pedaços para remixes, contanto que não utilizem para propaganda; e share music, que protege contra remixes ou usos comerciais.


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Direitos autorais no Brasil: qual o panorama atual para quem baixa música na web?

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