São muitos os encontros que se formam hoje em torno dos pais. Alguns, porém, custaram mais tempo e dedicação. Quem deseja tornar-se pai por adoção precisa enfrentar um processo na Justiça bastante criterioso e que não tem a velocidade da sua vontade. No caso de pais gays a espera é ainda mais complicada. A lei não discrimina gays para adoção, mas as decisões de alguns juízes são, às vezes, atrapalhadas e conservadoras o bastante para impedirem que uma criança ou adolescente encontre os pais que o amem. Muitas das justificativas negativas desses juízes (e da sociedade) aparecem apoiadas em critérios que, dizem, são baseados na psicologia. Contudo, a falta de clareza a respeito do assunto faz confusões e fabrica mentiras. O Virgula conversou com Ciça Azevedo, psicóloga formada  no começo dos anos 80, para jogar luz em algumas dessas questões. Ela é autora de sete livros, dois deles já publicados: Um Caminho Suave e São Tantas As Luas. Ciça formou-se em Gestalt, uma escola “mais existencialista” da Psicologia, ela explica.

É essencial que uma criança seja criada por uma figura feminina e masculina para se desenvolver bem?

Isso é uma coisa idealizada, não tem nada ver. Quantas crianças que são órfãs, criadas pela mãe e pela irmã, pelas tias ou só pelo avô e pelo tio? Isso não quer dizer nada. É uma construção moral, não tem nada a ver psiquicamente, espiritualmente, nada.

E a criação do adolescente por pais gays não o tornará gay também?

Isso é um absurdo absoluto. Não dá!  Porque senão pais héteros dariam sempre filhos héteros ou pais alcoólatras dariam filhos alcoólatras necessariamente. Isso não funciona assim.

Mas os pais gays não recebem pressão para não contarem a seus filhos sobre sua orientação sexual?

Eu acho que até um determinado tempo da história da humanidade não se falava nunca para ninguém, nem para os filhos. Com o tempo foi mudando. As coisas deviam ser mais naturais. Você pode ver em documentários, entrevistas, depoimento de pessoas que são criadas por pais gays: eu nunca vi ninguém estribuchar por causa disso, nunca vi. Já vi estribuchar, sim, por preconceito. Tem muito preconceito, moral, projeção…

Como é projeção?

 Projeção é assim: “Eu no lugar dele… Eu se tivesse sido criado por um casal de gays”. Mas de fato quem é? Tem que ver quem, de fato, foi criado. Eu não conheço nenhuma história de criança criada por pais gays com queixas nesse campo.

Como a criança ou adolescente criado por pais gays lida com a questão de contar ou não aos outros sobre sua família?

Isso é uma questão pessoal. Não é diferente de ela ter outro tipo de segredo, tem pessoas que são mais recolhidas… tem os travados. É muito reducionista você falar que por ter pais gays acontece isso ou aquilo.

De volta à primeira questão. O que se diz sobre referência feminina na criação adotiva também pode ser a presença de uma professora, por exemplo?

A figura pode ser outra pessoa tranquilamente, uma empregada até. É uma questão de afeto, o que vai desenvolver em você a questão de referência é como o afeto se dá. Essa coisa do modelo por um lado é muito simples. Não tem nenhuma regra, entendeu. Qualquer pessoa que estabelece uma relação fechada é por preconceito, por alguma moral, falta de reflexão. Não tem nada que defina isso, não. A não ser a própria natureza de cada um.


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Dia dos pais gays? Psicóloga Ciça Azevedo esclarece mitos sobre adoção