Jogos musicais sempre existiram. De karaokês como SingStar aos árcades de Dance Dance Revolution, a parceria entre games e os consoles sempre soou, com o perdão do trocadilho, como música aos ouvidos de gamers, desenvolvedores, lojistas e produtores.

Mas nada foi comparado ao que aconteceu em 2005, quando uma certa empresa chamada RedOctane, cujo maior título de sucesso tinha sido um jogo de dança chamado In The Groove, lançou em parceria com a Harmonix Music Systems um novo game musical que mudaria a indústria do videogame como um todo: Guitar Hero.

Uma guitarra de plástico, com botões coloridos na base e visual semelhante à Gibson SG empunhada por Angus Young foi uma verdadeira revolução. De vida curta, é verdade: nesta semana, a Activision Blizzard, que já havia fechado a RedOctane em 2006, anunciou o fim da produção da série, que nos últimos anos foi ofuscada por Rock Band e outros games musicais do Wii e, agora, do Kinnect.

Mas antes de entender o porquê de Guitar Hero não ter dado certo, é preciso entender como ele chegou ao topo rapidamente e teve uma queda de velocidade similar. Para se ter uma ideia, com 25 milhões de cópias vendidas mundialmente a série só perde em popularidade para Super Mario e o jogo de futebol americano Madden NFL.

Escola do rock

O Guitar Hero surgiu em um período em que a indústria fonográfica perdia de vez a luta contra o MP3 e o download ilegal. O MySpace estava no ar, o cenário independente virou mainstream graças à internet e o iTunes apontava um norte interessante para os artistas faturarem um trocado.

O que o Guitar Hero proporcionou foi uma nova maneira de se consumir e conhecer música. Como se fosse a verdadeira escola do rock, a RedOctane estimulou jovens do mundo inteiro a tocarem um instrumento ou a serem fãs de alguma banda até então desconhecida graças às músicas presentes nos jogos, que fizeram a empresa ser comprada pela Activision em 2006 por US$ 99,9 milhões em dinheiro vivo

Nos dois primeiros games o que se existia eram covers, pois os músicos e as gravadoras não liberavam a máster de uma música, que permitisse o estúdio separar o canal da guitarra do resto dos instrumentos por exemplo. O jeito então era regravar cada faixa, para que o fã tivesse a sensação de realmente “tocar” aquela canção.

Isso mudou no Guitar Hero 3: Legends of Rock, que começou a mostrar o enorme potencial que os artistas podiam encontrar naquele jogo. De repente podia tocar guitarra com os avatares de Tom Morello e Slash. Podia-se tocar agora, aliás, as músicas originais, já cedidas pelas gravadoras.

Daí para as bandas começarem a pensar em trabalhar com material exclusivo para a plataforma foi um pulo. Em 2007, o Aerosmith foi pioneiro ao ter um game em que o jogador poderia se divertir com diversas faixas deles.

O ápice mesmo aconteceu quando o Metallica, sempre tão ignorante em se tratando de música e novas mídias (lembra do processo contra a Napster), lançou para Guitar Hero 3 o álbum inteiro Death Magnetic para ser baixado na internet e jogado no game. Dois anos depois o grupo lançava um Guitar Hero para chamar de seu.

Até então o jogo estava no seu auge, com várias bandas relançando álbuns e singles para serem jogados ali. Como o download sempre era pago, tornou-se uma bela iniciativa lucrativa.

O fantasma Rock Band

A casa começou a cair para o Guitar Hero quando a mesma Harmonix, agora com o apoio do braço de games da MTV, lançou Rock Band em 2007. Era um Guitar Hero muito mais legal: além de brincar de ser guitarrista, também dava para pagar de baixista, baterista e vocalista. Cria-se um novo conceito de banda de garagem.

Para correr atrás do prejuízo, a Activision lançou uma cópia, Guitar Hero: World Tour, no ano seguinte. A resposta foi pesada: além de poder jogar com Jimmy Hendrix e Ozzy, ainda dava para criar uma música!

A partir daí a série chutou para todos os lados. Versão para celular? Sim. E para iPod? Também. Até o Nintendo DS ganhou um adaptador. O problema é que Guitar Hero não era mais tão divertido como antes e Rock Band, por outro lado, trazia a cada edição mais músicas e faixas para download exclusivas.

O cúmulo do desespero veio com Guitar Hero 5, que colocava Kurt Cobain cantando Bon Jovi (Courtney Love processou, é claro), e Band Hero, versão apenas com artistas pop como Taylor Swift. A morte foi rápida e dolorosa para a empresa.

Criar um jogo musical é muito caro, desde os custos de licenciamento das canções até a fabricação de hardwares especiais – os joysticks em forma de instrumentos musicais, no caso. Isso somado à nova concorrência de engenhosos games musicais desenvolvidos para o Playstation Move ou para o Kinnect, da Microsoft, fizeram a Activision Blizzard reparar que não teria lucro em 2011.

O jeito foi fechar as portas e demitir 500 de seus 7 mil funcionários no mundo todo.  Agora, a empresa vai se dedicar a série Call of Duty, que quebra recordes de venda a cada edição.

Independente do fracasso atual, Guitar Hero sempre será lembrado por quem gosta de música e videogame. A série foi responsável por mudar um mercado em crise e ainda deu um belo gás para o rock’n’roll. Se o seu espírito hoje está mais vivo do que nunca, aquela guitarrinha de plástico tem muito crédito por isso.


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Guitar Hero, seis anos de história, seis anos de revolução musical