(Por Camilo Rocha) Surfe e poesia tem tudo a ver. Como assim? À primeira vista, não é o que parece. Um tem tudo a ver com espaços abertos, adrenalina e esforço físico. O outro remete à introspecção, sutileza e atividade cerebral.

Pois existe um cara que prova por A+B que surfe e poesia tem tudo a ver, já que estas duas atividades são as grandes paixões de sua vida. Ele se chama Pedro Cezar, nasceu em Recife e mora no Rio. Nos anos 80, ganhou uma porção de campeonatos de surfe no Brasil e lá fora. Depois começou a fazer filmes e escrever poesia. Já escreveu dois livros com seus versos, “Puizia” e “Concepção de Frases em Ninhos de Água”

Fábio Fabuloso

Cezar começou a ficar bem conhecido uns quatro anos atrás com um original e divertido documentário chamado “Fábio Fabuloso”, sobre o top surfer Fábio Gouveia. “Fábio…” agradou, e muito: ganhou os prêmios Bravo de Cultura Prime e do júri popular no Festival de Cinema do Rio e na Mostra de Cinema de SP.

Agora ele mostra o outro lado de sua moeda com “Só Dez Por Cento é Mentira”, onde retrata a vida do poeta mato-grossense Manoel de Barros, tido como o maior do Brasil hoje. O filme estréia na Mostra de Cinema de São Paulo neste sábado, 18/10.

Poesia para leigos

Como “Fábio Fabuloso” conseguiu apresentar a biografia de um surfista e uma olhada no universo das pranchas de uma maneira que prendeu na cadeira até quem não é ligado no assunto, cabe a pergunta: ele procurou fazer o mesmo com a história de um poeta? Afinal, não é exatamente um tema com apelo de novela das 8.

“Tentei muito, por isso fiquei tanto tempo na edição”, diz Cezar pelo telefone. “Não quis fazer uma coisa que fosse só pro leitor do Manoel de Barros. Não quis fazer algo cabeçudo, segmentado. Estou levando muita fé que muita gente vai gostar.”

Voando fora da asa

“As coisas do Manoel de Barros são muito loucas”, resume Cezar sobre o poeta para quem poesia "é voar fora da asa”. E ele voa mesmo. Em sua obra se acham máximas como “A criança erra na gramática e acerta na poesia”, “Do lugar onde estou já fui embora”, “Poesia é a virtude do inútil” e “O que não sei fazer desmancho em frases” e frases-imagens como “Esticador de horizontes”, “Luar com freio automático” e “Alicate cremoso”.

“Ele cria, inventa um mundo a partir de imagens absurdas”, comenta Cezar sobre Barros, que hoje tem 90 anos e vive em Campo Grande, Mato Grosso do Sul, sem muito contato com o resto do mundo. Tanto é que ele passou décadas sem ter imagens suas gravadas e odeia câmeras. Cezar conta que foi longo o trabalho para convencer o velho poeta a aparecer no filme.

E afinal de contas o que é que poesia tem a ver com surfe?

“Eu costumo brincar dizendo que a poesia é olhar a vida do ponto de vista do horizonte, e o mesmo pode ser dito sobre o surfe. Quando você está em cima de uma onda, está vendo a vida, o mundo, desse ponto de vista,” explica Cezar. “A poesia e o surfe te permitem olhar as coisas através de um outro lado, de ver o mundo diferente. E os dois te dão essa experiência que é a contemplação de imagens de um jeito diferente do normal.”

Só Dez Por Cento é Mentira

Sábado, 18/10 – 21:00 – Espaço Unibanco Augusta 3
Segunda, 20/10 – 16:30 – Unibanco Arteplex 3
Domingo, 26/10 – 15:20 – Unibanco Arteplex 2


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Mostra SP - Quando o surfista encontra o poeta