Drag queen Tchaka


Créditos: divulgacao

São 12 anos de profissão, muito brilho e mais de 4 mil festas e telegramas animados – de chá de bebê, formaturas a casamentos. A drag queen Tchaka – personagem do ator Valder Bastos, considerada a Rainha das Festas – é uma das várias cores da comunidade LGBT que atuam e vivem da arte. 

Recentemente, a drag virou tema do documentário Tchaka em Transe, produzido pelo Senac, selecionado para a programação oficial do Rio Festival de Cinema Gay 2012. “Eles iriam fazer com um curta sobre drags, mas gostaram tanto da minha história que fizeram só sobre ela”, revela.

Em entrevista ao Virgula LifeStyle, Tchaka revela detalhes de sua infância, vida amorosa e trabalhos. Entre outras curiosidades, ela conta que seu público é “100% hétero”. Confira o bate-papo.

Você acaba de contar a sua história em filme. Como foi ser escolhida entre tantas artistas do universo gay?

Foi maravilhoso. Ainda mais porque, a princípio, eles queriam que fosse um documentário com o tema “drags” e outras três participariam. Quando souberam um pouco mais da minha história, decidiram investir nela, esmiuçar mais um pouco. O resultado ficou bem bonito e me deixou emocionada.

Como você começou a carreira de drag?

Eu fazia a divulgação da casa noturna Nostro Mondo. Até que um dia perguntaram se eu não gostaria de me montar para ganhar mais. Durante o trabalho, me convidaram para participar de uma agência de festas. Fiz uma primeira apresentação em uma festa e o dono da agência comentou: “É isso que eu quero. Você não tem o vício da noite, não fala palavrão, é inteligente. Vou te moldar para te fazer uma estrela”.

Por que o nome Tchaka? 

A primeira vez que me montei foi para os amigos e a maquiagem foi absolutamente… Errada (risos). Fiz com pasta de dente e tinha umas 30 camadas no meu rosto. Apesar de tudo, eu estava me achando lindíssima, tipo “Sou Madonna”, sabe?. Até que um amigo chegou e falou, “Você está a cara do Tchaka”, do Elo Perdido. Eu não gostei, mas você sabe que apelido só pega quando a gente não gosta. 

Ela é o seu alter ego? 

Ela é minha anjinha da guarda, não é um alter ego. Meu alter ego é um pouco de nariz empinado, e a Tchaka não é. Ela é de abraçar todo mundo, de conversar com todo mundo. A Tchaka adora o palco, já fez festa para duas pessoas e uma delas estava grávida. Ela gosta de brincar junto, porque ninguém vai rir da cara dela e ela não vai rir de você. Todos vão rir juntos. 

Durante sua apresentação nas festas, já ocorreu algo que tenha te emocionado muito? 

Sempre tem, né? Mas uma apresentação que me marcou muito foi quando uma mãe me contratou para fazer os 20 anos de sua filha, que estava doente. Fiquei em choque no momento que ela me disse que aos 21 anos a filha ficaria cega. Contou que era irreversível e que já a havia levado para a Disney, ver os peixes em Bonito e queria que visse uma pessoa bem colorida e para cima. Ou seja, eu. Fiquei com aquilo na cabeça, respirei fundo e fiz a garota a mais feliz do mundo. Acho que mudei a história daquela pessoa para sempre e ela marcou a minha. 

Já se apresentou para algum famoso? 

Para alguns, claro. Entre eles, a Maria Rita. A princípio, falaram para eu não exagerar, que era para ser mais contida e tal. Mas meu amor, a Maria Rita ficou tão empolgada comigo, que dançamos juntas, subimos no palco, ela sentou no meu colo, tiramos várias fotos. Ela é maravilhosa. Consigo deixar o ambiente mais animado, divertido, de maneira inteligente e sem apelação. Só com bom humor e arte.

E como lida com as crianças que fazem piadinhas constrangedoras? 

As crianças são o reflexo da criação e os preconceitos dos pais. Existem crianças que tiram sarro, mas eu tento levar e dar a mensagem da melhor maneira possível. E existem aquelas que falam: “Mamãe, a boneca ganhou vida?”. Existe uma criança que falou durante uma festa: “mamãe, eu posso levar a boneca para casa? Lá em casa, as minhas bonecas não se mexem como ela”. Eu achei isso tão simbólico, tão fofo e tão verdadeiro.

O que diz para quem quer te contratar, mas fala que a família é mais tradicional? 

Meu público é 100% hétero. Quando me ligam “A gente é festeiro, a gente gosta de brincadeira, mas você sabe que temos senhorinhas”, ali mesmo já rebato. Falo: “Vocês estão no lugar certo, sou uma das maiores agência de entretenimento de São Paulo, sou a Rainha das Festas por saber exatamente o que vocês querem. É claro que a Tchaka teve que se adaptar ao sistema, é claro que eu não falo nenhuma gíria gay, até porque eles não vão entender.

Muita gente diz que ninguém se descobre gay, nasce gay. Você sempre teve essa consciência?

Não, não. Até porque sou de uma família de cinco irmãos, todos homens. Lá no nordeste – morei em diversos lugares porque meu pai era mecânico de montadora de hidroelétrica – cheguei a ser prometido a uma garota. Mas um dia falei instintivamente: “Ruth, a gente está noivo, só temos 15 anos e eu quero estudar. Vou ao Rio de Janeiro para a casa de um irmão, um beijo no seu coração, tchau”.

Quando foi a primeira vez que você chorou por amor?

Ai, que delícia! Foi em 1987, justamente quando eu deixei o primeiro homem que eu beijei. Eu o amava, foi o primeiro homem da minha vida e tive que deixar, mudando de cidade. Pensei: “Se eu não posso ser quem eu sou, eu não vou ser mais nada”. Me tornei assexuado, totalmente. Fiquei dois anos sem beijar, sem transar, sem olhar para outro homem com desejo. Me bloqueei totalmente.

Como é a vida amorosa de uma drag queen?

Hoje, eu sou casado há 12 anos com o Carlos. Quando contei que sou bacharel em direito e que também me montava, ele teve uma pressão familiar em cima dele. Mas disse: “Que se dane, estou apaixonado”. Digo que ele deu a liberdade para eu ser feliz. Carlos foi uma dignidade tão grande, uma delicadeza tão grande [suspira]. É ele que me coloca gás, que levanta a minha poeira…

Nunca teve um namorado que não aceitasse o seu lado feminino?

Já tive um namorado com um pouco de limitação mental. Toda vez que eu dava pinta, ele me batia. Teve um dia que a gente estava com os amigos em casa, com todos os amigos, e falei “você acredita” [imita o gesto] e ele jogou um copo de whisky no meu rosto. Fez aquele “pá” na parede e pensei: “Hum, acho que isso não é amor”. Se pegasse no meu rosto, ficaria todo retalhado. Deixei aquele relacionamento logo.   

Você se formou em direito. Chegou a atuar como advogado?

Nunca atuei. A arte apareceu na minha vida quando uma professora interrompeu um júri simulado em que eu estava participando. Falei “Gentchy, para falar a verdadchy”, e professora parou tudo e me deu um conselho. “Muda o curso, parte para as artes” (risos). Na hora, eu não gostei, achei um insulto, fiquei bravo, mas hoje vejo que ela estava certa. Ela entendeu tudo. 

Qual é o seu maior sonho?

Ser feliz com humor. Dizer para as pessoas “façam exatamente o que vieram fazer aqui: ‘Se divirtam’”.

Teaser – Tchaka em Transe from Submarinah on Vimeo.




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Drag queen Tchaka ganha documentário sobre sua vida e revela: "Meu público é 100% hétero"