Artista e comunicólogo Paulo Azevedo fala com o Vírgula sobre a estreia mundial de novo filme e celebra conquistas em 2024 (Foto: Luiza Sigulem/Divulgação)

O artista e comunicólogo Paulo Azevedo tem muito a comemorar em 2024. Nesta semana, embarca para Lisboa para acompanhar a estreia mundial do 3º longa metragem em parceria com o diretor e roteirista português José Barahona. “Sobreviventes”, escrito por Barahona com o escritor angolano José Eduardo Agualusa, tem sessão no próximo dia 24 de maio no 21º IndieLisboa Festival Internacional de Cinema. 

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Antes, já fizeram juntos “Alma Clandestina” (2018) e “Estive em Lisboa e Lembrei de Você” (2015), que circulou por vários festivais internacionais, além de conquistar os prêmios CinEuphoria Portugal 2017 de Melhor Roteiro Adaptado, Melhor Música e o Prêmio do Público de Melhor Ator (Paulo Azevedo).

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“Sobreviventes” se passa em meados do século XIX, na qual um grupo de sobreviventes do naufrágio de um navio negreiro, brancos e negros, vão parar na costa de uma ilha deserta no Oceano Atlântico. A luta pela sobrevivência e pelo poder vai inverter os valores morais e sociais da época. 

“Sobreviventes foi filmado há 2 anos, durante cerca de 5 semanas, em belíssimas locações do litoral do extremo sul português. Foi desafiador retratar esta história sobre como senhores e escravizados podem ou não conviver numa situação extrema de isolamento e revelar as contradições humanas ainda presentes no nosso cotidiano. Conviver com uma equipe com artistas de diversas nacionalidades e abordar temas tão importantes e atuais foi uma experiência muito rica. Cinema é realmente a arte do coletivo”, relembra Azevedo. 

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Além de Azevedo, o elenco ainda traz Roberto Bomtempo, Allex Miranda, Miguel Damião, Anabela Moreira, Ângelo Torres, Hugo Narciso, Zia Soares e Kim Ostrowskij. A música original é assinada por Philippe Seabra (vocalista e guitarrista da Plebe Rude) e conta com a voz de Milton Nascimento. A produção é da David & Golias (Portugal) e coproduzida pela Refinaria Filmes (Brasil). O filme é distribuído no Brasil pela Pandora Filmes e ainda não tem data de estreia confirmada.

Com dezenas de trabalhos como ator entre cinema, TV e teatro, Paulo Azevedo celebra conquistas em outras frentes de atuação. Neste ano, comemora os 10 anos de criação da Suacompanhia, coletivo que reúne artistas de várias áreas, realizando os espetáculos “Heróis” e “Passe-partout”, ambos escritos e dirigidos por Azevedo; e os 5 anos do podcast almasculina, que traz em mais de 70 episódios conversas com personalidades diversas sobre temas da atualidade, como sexualidade, autoconhecimento e comportamento, disponível em diversas plataformas.

Azevedo ainda celebra os 15 anos da Comcultura, sua consultoria voltada para pessoas no ambiente corporativo, que atendeu 55 empresas, em mais de 200 ações para cerca de 12 mil pessoas.

“São muitos anos dedicados a vários projetos simultâneos, que trazem pontos em comum: a arte, a cultura e a comunicação em várias plataformas, com a inquietação e o desejo de gerar ideias e reflexões para provocar mudanças, mínimas que sejam”, conta Azevedo. “E nada disso seria possível sem colaboração de parceiros e parceiras incríveis que, de alguma forma, tornam os projetos seus e imprimem suas identidades com talento e um olhar original sobre o mundo em que vivemos. Estes encontros são os verdadeiros motivos de celebração”.

Confira abaixo a entrevista completa com o artista e comunicólogo Paulo Azevedo.

Virgula: Você já atuou em dezenas de filmes, entre longas e curta metragens, além de participações em séries e novela. O que “Sobreviventes” trouxe de novo desafio para você?

Paulo Azevedo: Todo novo personagem é um começar do zero. Você acumula bagagem, mas a insegurança e a curiosidade de adentrar o universo que uma nova história traz é sempre o mesmo. Com o Padre Angelim, meu personagem no “Sobreviventes”, o desafio de dar humanidade a um homem que se esconde por trás da sua religiosidade talvez tenha sido o maior. Ele é paradoxal e, por isso, extremamente humano. Ele é covarde, racista em oposição ao amor e o respeito ao próximo pregado pelo cristianismo; “carnal”, embora viva no celibato, entre outros aspectos de sua personalidade. Além disso, tive que compor um sotaque de alguém que nasceu em Portugal, mas mudou-se para o Brasil há décadas. Um homem que já não pertence há lugar algum, sem raízes e fruto do misto de culturas, que eclodem neste contexto de isolamento e luta pela sobrevivência.

Virgula: Quais lembranças você guarda das filmagens?

Paulo Azevedo: São inúmeras. Pra mim, o mais incrível é a capacidade do cinema de formar uma “comunidade” temporária, com todos os prazeres e conflitos que a convivência traz. Todos estão ali pelo mesmo objetivo: contar aquela história, cada um com sua expertise. Conviver com pessoas de várias nacionalidades e bagagens, além de reencontrar o amigo e diretor José Barahona, é incrível. Trago até hoje novas amizades que surgiram no set. Conviver tantos dias com um elenco de apoio muito dedicado também foi uma alegria. Filmar 100% em locações foi uma aventura. Lidar com o sol, as marés, subir e descer até a costa litorânea em roupas de época era praticamente o nosso aquecimento para a cena! Me lembro de uma cena improvisada na qual Angelim está no mar. E a equipe estava tão focada em fazer bem aquele único take, que as águas me levaram. Só me dei conta quando bati a cabeça nas pedras. Nada grave e espero que a cena tenha valido a pena!

Virgula: O filme aborda traz uma pergunta central: “Isolados, será possível encontrar uma forma de viver em harmonia?”

Paulo Azevedo: Sim, este ponto de partida traz vários temas que ainda hoje são presentes. A escravidão e o sequestro de homens e mulheres negros, um dos maiores genocídios da história da humanidade, trazem cicatrizes inegáveis que afetam milhares de pessoas. O racismo estrutura a forma como nos organizamos em sociedade. Isso inconcebível num país com mais de 56% de pessoas pardas e pretas como o nosso. A xenofobia está presente em várias partes do mundo. “Não, não pode”, como afirmam os portugueses hoje. É inaceitável. Como nos lembra Angela Davis: “Numa sociedade racista, não basta não ser racista, é necessário ser antirracista”. Enquanto não tomarmos consciência, individual e coletiva, não há avanço, direitos humanos, não há convívio em paz possível. Acredito que os espectadores vão assistir o filme e muitas vezes se perguntar: O que eu faria se estivesse nesta situação limite? Se isso acontecer e gerar boas ideias e conversas ao final das exibições, já valeu bastante o nosso trabalho.

Virgula: E pra encerrar, você atua em várias frentes e projetos, que estão sendo celebrados em 2024. O que eles trazem em comum?

Paulo Azevedo: A fonte de tudo isso é a vontade de estar em coletivo e poder contribuir de alguma forma para pensar as questões do nosso tempo. O teatro sempre foi a minha base. E pensar e refletir sobre o humano e seus paradoxos é seu princípio, pelo riso ou pelo choro. E a partir dessa experiência, veio meu encontro com a comunicação, em especial a TV e a cultura, que me deu uma bagagem uma visão mais ampla sobre as artes e o humano. Depois de atuar e formar vários grupos teatrais, a Suacompanhia surgiu naturalmente como um lugar de encontro de parcerias antigas, que se encontram quando querem pensar juntas algum projeto. O podcast almasculina, inclusive, surgiu da minha necessidade de pesquisar masculinidades e outros assuntos relacionados para a criação do 3º episódio da “Trilogia Solo”, que começou com “Heróis” e “Passe-partout”. Já na Comcultura faço a ponte com toda essa expertise dentro do ambiente empresarial, por meio de consultorias e palestras, auxiliando times com um olhar e ferramentas diferenciadas que tornam meu trabalho único. Todos estes projetos são diferentes palcos para a mesma vontade: provocar ideias e reflexões para encontros mais viáveis para todo mundo. É um desejo genuíno em um mundo tão pautado pelo individualismo exacerbado em que os encontros verdadeiros se tornam cada vez mais caros e necessários.


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Paulo Azevedo fala sobre estreia mundial de novo filme e celebra conquistas