O diretor brasileiro Walter Salles prepara um novo projeto com o ator mexicano Gael García Bernal, com o qual trabalhou em Diários de Motocicleta, para realizar um filme no qual já trabalham há anos.
“Temos um projeto em desenvolvimento há vários anos e que está quase pronto para começar. É uma história original. Espero que em breve possamos colocá-lo em andamento”, afirmou Salles, que se declarou fã de Gael.
Em entrevista em Cannes, onde concorre à Palma de Ouro com Na Estrada, Salles lembrou que conheceu Bernal na filmagem de Diários de Motocicleta, um filme que definiu como decisivo em sua carreira de diretor.
“Nos transformamos em uma família”, explicou Salles. O brasileiro disse que mantém contato com todos, especialmente com o ator mexicano que, de acordo com ele, se transformou em um de seus amigos mais próximos. “Eu admiro sua inteligência e sensibilidade. É uma das pessoas mais afetuosas que conheci”, destacou.
Sobre Diários de Motocicleta, Salles disse que o filme foi apresentado a ele depois de outros cinco ou seis diretores rejeitarem rodá-lo. No entanto, destacou que da mesma forma já ofereceram filmes que ele rejeitou. “Foram feitos por outros diretores, provavelmente de uma forma muito diferente da qual eu teria feito, e, na maioria dos casos, melhor do que eu, porque se não os fiz é porque não me sentia a pessoa adequada”.
Mas, o diretor brasileiro sentiu que podia adaptar o livro de Jack Kerouac, Na Estrada, para o cinema. O filme, apresentado na última quarta-feira na competição oficial de Cannes, conta a história de uma viagem.
Salles destacou que não é por acaso que muitos de seus filmes são sobre viagens na estrada. “Quando posso, evito avião e trem, e dirijo carros ou motos”, disse. O brasileiro ressaltou que gosta de se afastar o máximo possível de seu ponto de partida, porque, “quanto mais longe está de onde você vem, melhor é para entender quem é e quem se quer ser”.
O amor pelas estradas também vem do cinema, das grandes filmes de viagens de Michelangelo Antonioni, Wim Wenders ou do brasileiro Carlos Diegues.
De acordo com o diretor, no Brasil há uma grande tradição de filmes de viagens que permitem ver como o país muda entre suas regiões e com o passar do tempo. “Você vai a algum lugar e dois anos depois tudo está diferente”, disse.
É sobre essa passagem de tempo e como ela afeta as pessoas que Salles gosta de refletir em seus filmes, um pouco no estilo documentarista, mas se baseando nas suas próprias experiências.
“Você pode sentar em um sofá e ver um documentário sobre a Patagônia, mas não vai sentir a solidão absoluta de quando está ali”. Em sua opinião, a única forma de desenvolver uma consciência crítica é através da experimentação. “Viver sua própria experiência, e não através da tela”, disse.
O diretor ainda comparou tal ideia aos acontecimentos atuais do mundo. “Na primavera árabe, a ocupação de Nova York, os indignados na Espanha, as pessoas estão usando instrumentos de redes sociais, mas não para ficar em casa, mas para estar ali, fisicamente”.
Uma revolução diferente, mas ao mesmo tempo, parecida com a narrada por Kerouac em seu livro, uma obra que Salles leu quando tinha 18 anos e que lhe impressionou.
“Por causa da liberação dos personagens, liberdade sexual, de expandir sua consciência usando drogas, de pegar uma estrada para saber de onde vinha e aonde vai”.
Mas, sobretudo, acrescentou, pela liberdade de escrever. “É preciso perceber que li o livro em 1978, durante o regime militar no Brasil, quando havia censura na imprensa, em todo tipo de arte, mas, sobretudo, censura das mentes”.