Los Amantes Pasajeros, de Pedro Almodóvar


Créditos: efe

Intitulado Os Amantes Passageiros, o próximo filme de Pedro Almodóvar marca o retorno do mestre ao espírito hedonista, exagerado e sexy que marcou seu cinema nos anos 80, um grito de liberdade que volta a lhe parecer necessário: “O melhor que posso fazer agora pelo povo espanhol é diverti-lo”, afirmou.

“Acho graça que, como se tratasse de um habitual cliente em um comércio onde se compra algo, os meus clientes-espectadores me pediam uma comédia pelas ruas”, declarou Almodóvar à Agência Efe. No entanto, ele mesmo, depois do intenso Abraços Partidos (2009) e, sobretudo, de A Pele que Habito (2011), necessitava “dar uma arejada” com este filme, que chegará aos cinemas brasileiros em setembro.

“Arejar-se”, neste caso, não poderia ser mais literal. Isso porque Almodóvar cria um voo “à beira de um ataque de nervos” por conta da possibilidade de uma catástrofe aérea, com comissários e passageiros interpretados por Javier Cámara, Lola Dueñas, Cecilia Roth, Hugo Silva, Raúl Arévalo e “outros meninos” dispostos embarcar nessa celebração.

“É uma comédia oral porque se fala muitíssimo; moral porque é uma viagem que muda ligeiramente a vida dos personagens, ou pelo menos de um modo definitivo, e irreal porque, deliberadamente, quis que a comédia transcorresse em uma espécie de limbo, onde este avião dá voltas sobre si mesmo sem ir a nenhum lugar”, apontou Almodóvar.

Já eram muitos anos sem se entregar à desordem, mas Almodóvar garante estar em plena forma. “É muito bom ver que um tom que não estava exercitando ultimamente segue dentro de mim. Apesar das dores de cabeça, dos anos, essa minha capacidade não desapareceu de mim”.

“Um drama também dá muito prazer em assisti-lo. Mas, me alegra muito saber que no ano 2013, um ano que se apresenta difícil para todos, o espectador que assistir esse filme sairá do cinema mais animado do que quando entrou”, declarou o cineasta, que ressaltou que o espírito de seu novo filme “se aproxima daqueles que vão a uma festa para fugir das catástrofes”.

“Não tem como evitar o fato do filme ser atual e pessoal. Eu mudei também. Não é que não seja a mesma pessoa, mas se passaram 30 anos desde que comecei. Embora eu tivesse a pretensão de fazer um filme exatamente como os dos anos 80, eu poderia não ter conseguido. Não estou nesse lugar, e a sociedade espanhola também não está”, afirmou o cineasta.

“Felizmente, as pessoas estão muito mais conscientes do que nunca. Essa será a grande arma para que as coisas possam mudar, embora não seja fácil. Eu, como indivíduo e cidadão, posso me queixar da situação. Agora, como milhares de espanhóis que saem às ruas, eu acho que há muitos elementos que é preciso mudar. Elementos que têm relação com o sistema”, explicou.

Desta forma, entre esses Amantes Passageiros não falta um aeroporto sem especulação, um “ladrão de luva branca” que se chama Mas e que foge de um caso de corrupção, ou uma “madame” sadomasoquista e “chantagista profissional” com conexões na Opus Dei e na Casa Real.

Almodóvar queria se abstrair da atualidade, mas confessa: “Vendo o filme agora e contemplando o que há em nosso redor, vejo que há uma presença de realidade muito maior do que eu pensava e que eu deliberadamente pus. O mesmo filme que rodamos há quase um ano se enriqueceu muitíssimo com a realidade espanhola”.

Ao voltar ao espírito desinibido dos anos 80, o premiado cineasta espanhol também se reencontra com a irreverência, embora desde as polêmicas de 2004, quando estreou Má Educação em plena reviravolta eleitoral socialista, o mesmo tenha abandonado a prudência.

Almodóvar, em Os Amantes Passageiros, viaja sem o medo de perder a pesada mala do prestígio, que adquiriu ao aflorar de sua parte mais grave, e também não tem a pretensão de concorrer em nenhum festival.

“Não me preocupa tanto a sensação de que existe gente esperando meu fracasso com essa pressão de que você tem sempre que acertar e de que o caminho sempre tem que ser ascendente. Em todos os caminhos há remansos, há vales e, por isso, é preciso descer um pouco para subir”, exaltou Almodóvar.

A última vez em que o cineasta se deixou levar pelas mãos do delírio, em Kika (1993), ele recebeu as piores críticas de sua carreira. Como reconheceu recentemente, essa foi sua experiência mais próxima ao fracasso.

“Em todos os meus filmes há coisas que me agradam e que não agradam em diferentes níveis. Apesar de que é um afago o fato de se tornar um adjetivo, já que isso amplia enormemente sua própria existência e seu nome. Isso me pesa. Eu queria fazer cinema, nunca quis me tornar algo que se possa qualificar com meu nome”, completa.

“Para atuar com toda liberdade não quero ter compromissos com nada, nem comigo mesmo e, é claro, que com a realidade também não. Os retratos que fiz, se fiz algum, estão filtrados por um montão de elementos artificiais porque esse é o cinema que me interessa fazer. Eu me represento, e as pessoas interessadas se sentem refletidas”, finalizou o cineasta espanhol.


int(1)

'O melhor a se fazer pelo povo é diverti-lo', diz Almodóvar sobre novo filme