Deena Love já fez história. A drag/transformista encarnada pelo ator e cantor Pedro Figueiredo foi um grande destaque da atual edição do reality musical global The Voice. Depois de roubar a cena nas etapas das quais participou (emocionando e levando às lágrimas até o habitualmente contido apresentador Thiago Leifert), Deena foi eliminada do programa na última quinta (27).

Deena Love em ação no ‘The Voice’

Mas o estrelato da artista apenas começou. A saída de Deena do programa não vai provocar seu sumiço, muito pelo contrário. Na entrevista exclusiva a seguir, ela conta por que.

Como, onde e quando surgiu Deena Love?
Deena surgiu em minha infância. Quando criança, tive a oportunidade de conhecer filmes e fotos de Carmem Miranda, através de minha avó, e foi paixão à primeira vista. Carmem para mim era uma boneca viva em technicolor, ou seja, uma drag queen! Além disso nos anos 80 e 90, décadas da minha infância e adolescência, a televisão era repleta de programas com shows de transformistas como o programa do Sílvio Santos, do Chacrinha, do Bolinha, etc. Sem contar os filmes estrangeiros que abordavam o tema como Priscilla e Para Wong Foo Obrigada por Tudo. Todo esse universo transgênero foi a base para que anos mais tarde, mais precisamente 2009 em um navio de cruzeiro onde eu atuava como crooner, eu decidisse atuar como cantor e transformista. Dessa primeira transformação, a ideia se aprimorou e Deena Love veio à tona.

Como rolou de fazer o The Voice?
Mandei um vídeo vestido de Deena Love para a página do programa, e quando o período de inscrição terminou, a produção me chamou.

Deena cativou a plateia do ‘The Voice’

Comente essa questão de você manter suas ideias, escolher suas músicas e talvez por isso ter sido eliminada.
Creio que uma trajetória artística deve ser guiada pela verdade de seu intérprete. Embora o formato do programa seja voltado para o estilo pop, eu não poderia trocar toda a minha essência musical apenas para tentar ganhar o prêmio, seria uma traição comigo mesmo e com o público que se indentificou com Deena Love, justamente por oferecer algo de diferente do que se vê e se ouve em realities musicais.

Qual o saldo de ter participado do The Voice?
Absolutamente positivo. O maior patrimônio que se pode levar de um programa divulgado no horário nobre da emissora mais influente do país é o reconhecimento de seu nome artístico em âmbito nacional . E isso a Globo me deu de maneira elegante e muito respeitosa!

E agora, quais os planos para o futuro?
Tenho até o fim de dezembro alguns shows e festas marcadas. Farei o repertório das divas da era do rádio nos dias 07/12 no teatro Itália em São Paulo e 27/12 no teatro Rival no Rio. Para o ano que vem, tenho projetos novos, com músicas próprias. Estou com uma assessoria maravilhosa, faremos coisas bem diversificadas.

Afinal, Deena é drag ou transformista? Como se define? Ou não se define?
Deena passeia entre as duas vertentes. Ela não é uma drag multicolorida, e também não tenta representar o corpo e a feição feminina com perfeição. Ela é uma homenagem sincera a todas as cantoras que embalaram a minha vida: de Amália Rodrigues a Judy Garland.

Você subverteu o clichê de drags que só dublam. Como se vê nesta questão? Se sente pioneira?
Sou pioneira em realities musicais brasileiros. Mas temos na história nacional ícones maravilhosos que cantavam e cantam até hoje: Rogéria, Valéria, Jane di Castro… divas encantadoras que certamente são influência e escola para todos os transformistas!

O que acha de outras que ousaram cantar, como Conchita, Divine?
Acho maravilhoso que o mundo se abra para outras formas de expressão artística. O que não dá para entender é que o transformismo ainda seja tabu em 2014! O caso de Conchita Wurst (drag barbuda que venceu o concurso musical Eurovision em maio deste ano) é singular, pois ela se apresentou como um ser híbrido, meio homem e meio mulher. Mas se nós olharmos para o passado, em 1972 os Dzi Croquettes já faziam isso e com muito mais atitude do que nós temos hoje. Estamos falando da era de chumbo, do (então presidente do BrasilGarrastazu Médici. Não era moleza ser Lennie Dale (coreógrafo e integrante dos Dzi Croquettes), ser Rogéria naquela época. E hoje, por incrível que pareça, estamos vivendo uma caretização moral da sociedade. E é apenas em funçao dessa neo caretice que eu, Conchita e as demais podemos nos considerar quebradoras de tabu, porque botando os pingos nos is, os tabus já foram quebrados há 40 anos!

Você pensa em trabalhar desmontada, como ator/cantor, ou pretende seguir sempre como Deena? Faria trabalhos como Pedro?
Não teria nenhum problema em atuar como Pedro, mas nesse momento quero elevar a Deena à máxima potência! Quero dar de presente a mim e ao público uma cantora a moda antiga!

O que acha da militância e da luta pelos direitos LGBT? Se envolve, se envolveria? Acredita que seu trabalho possa contribuir para derrubar preconceitos?
Eu sou absolutamente a favor de tudo o que tange os direitos de igualdade social LGBT. Mas para me envolver em um projeto desse certame, tudo deverá ser fomentado com inteligência e coerência. Sinceramente, não tenho vontade de entrar em guerra com setores religiosos. Essa guerra política tem que acabar antes que as pessoas comecem a se digladiar nos templos religiosos ou nas paradas gay! E se não há bom senso do lado de lá da trincheira, nós temos que juntar pessoas de bom senso entre os nossos. Não podemos classificar TODOS os evangélicos ou TODOS os católicos de radicais. Existem pessoas maravilhosas que são evangélicas como a Heloísa Perissé e o Kaká, que além de terem dado muitas alegrias à nação com certeza não são preconceituosos. Meu tio é evangélico e me ama muito e nunca fez uma crítica ao meu respeito, ao contrário, chorou de emoção ao me ver na TV! O que deve ser combatido é o radicalismo, qualquer radical, seja ele hétero, homo, ateu ou cristão, é ignorante e perigoso. Adoraria que surgisse no Brasil um grupo híbrido que lutasse não só por um setor da sociedade, mas pela igualdade entre todos os setores. O dia em que surgir um grupo assim, juro por Deus que eu me filiarei!


int(1)

"Não entendo que o transformismo ainda seja tabu em 2014!", desabafa Deena Love, drag eliminada do 'The Voice'

Sair da versão mobile