Quem viu Bastardos Inglórios, filme de 2009 de Quentin Tarantino, deve ter tido orgasmos ao presenciar a catarse planejada pelo cineasta: a heroína Shosanna bota fogo numa sala de cinema repleta de figurões nazistas, incluindo o chefe maior de todos eles – Adolf Hitler em pessoa.

Sutilmente inspirado no longa de Taranta, o cineasta brasileiro Ivan Ribeiro está lançando o curta-metragem As Bodas do Diabo, que elege como alvo certos políticos brasileiros conhecidos por suas posturas homofóbicas.

12118729_784210095023448_5994822873881450389_n

O curta de Ivan se passa no Brasil num futuro beeem próximo (2020), e mostra o país tomado por um governo religioso fundamentalista. Para destronar esse poder sinistro, entra em ação um trio de personagens poderosos: as guerrilheiras Shoshanna (vivida pelo ator Silvero Pereira, do coletivo As Travestidas e da peça BR Trans) e Veronika Stronger (interpretada por Bill Santos, militante das causas LGBT em São Paulo) e um padre (encarnado por Valder Bastos, que é o intérprete da famosa Tchaka Drag Queen).

Trailer oficial – As Bodas do Diabo

Mas essa trama mostrada por Ivan Ribeiro no filme não é uma novidade em sua carreira. Ele dirigiu outros curtas, onde já esboçava uma ideia semelhante – combatendo explicitamente a homofobia e a transfobia.

A própria personagem Shoshanna, vivida agora por Silvero Pereira, já foi encarnada pelo próprio Ivan em um curta anterior (Shoshanna, que venceu o Show do Gongo do Festival Mix Brasil em 2014).

11255738_776044575840000_7212534489376656957_o

Conversamos com o cineasta, que falou sobre seu trabalho, as expectativas para a repercussão do curta e as possibilidades de ser processado pelos tais políticos (todo mundo sabe quem são, certo?) As Bodas do Diabo será exibido em festivais e mostras a partir de novembro – mês em que estará na programação do Festival Mix Brasil da Diversidade Sexual.

Fale sobre seus curtas anteriores, até chegar em As Bodas do Diabo
Já fiz seis curtas e cinco deles dentro da temática LGBT, é sobre o que eu quero falar. Todos eles nasceram de inquietações sobre o próprio meio ou após algum caso de agressão homofóbica (como Novembro Paralelo, sobre o ataque com lâmpada fluorescente na Avenida Paulista), ou após os avanços das pautas dos fundamentalistas religiosos. Desde 2012 pra cá tenho dado mais atenção à temática T. Os LGB no Brasil já têm uma aceitação e são de fato parte da sociedade, mas homens e principalmente mulheres trans e travestis continuam sendo verdadeiros tabus humanos e são as maiores vítimas da marginalização e da ignorância.

11350580_735116689932789_3107171371506845083_n
Percebo uma linha que permeia seus filmes, trazendo essa questão da revolta contra os homofóbicos. Você planejava essa trajetória com os filmes Novembro Paralelo, Shoshanna e agora As Bodas do Diabo, ou foi uma evolução natural?
Todos eles estão bem posicionados no contexto de cada ano de produção, são muito atuais se levarmos em conta a época em que foram feitos e o que acontecia no Brasil naquele momento específico e isso não tem como planejar, cada ano que passa avançamos um passo e retrocedemos dez no que diz respeito a direitos e principalmente ao que deveria estar sendo feito pelo governo para barrar o avanço da ignorância, que é o que gera as fobias.

11109175_738912519553206_488629146246244997_o

As pessoas pedem um longa-metragem a partir de As Bodas do Diabo. Você pensa em fazer?
Penso sim, mas só será feito com dinheiro, verei quais são as opções disponíveis para que um longa seja financiado, caso contrário ficará apenas na vontade. Os editais de longa estão cada vez mais escassos e crowdfunding seria uma opção, acho difícil conseguirmos através de crowdfunding mas estudaremos a possibilidade quando tivermos um roteiro.

Quais foram suas referências estéticas para criar o visual do filme?
Tudo muito subconsciente, não pensei em nenhum diretor ou filme específico, mas acho que tem sua cota de V de Vingança, principamente no contraste e cores. Acho que um tanto de Mad Max, Laranja Mecânica e Blade Runner. Óbvio que não há comparações mas tem as auras dos futuros distópicos desses filmes, principalmente nas cores e algumas composições. Tem gente que acha tarantinesco, sou um grande fã de Tarantino mas acho que tirando o nome Shoshanna, que no Bastardos Inglórios é Shosanna, não tem tanta referência estética dos filmes dele, talvez o roteiro tenha um pouco do tempero dele.

11794552_752473678197090_3829756253075627877_o

Como tem sido a repercussão ao filme? Você acredita que alguns políticos “vestirão a carapuça” e processarão você e o filme?
Até agora tem sido ótimo, a militância LGBT adorou a ideia. Até agora pouco mais de 250 pessoas viram o filme e adoraram. Olha, não tem o que processar mas se quiserem tentar, fiquem à vontade. Nós adoramos publicidade gratuita e quem sabe um processo não ajuda a tirar um longa do papel?

Você acredita que seu filme possa contribuir para diminuir preconceitos e para deter a onda conservadora-homofóbica-religiosa?
Não acho, o filme não tem essa missão. O filme foi pensado como algo divertido e com uma mensagem política mais voltada para o público LGBT e apoiadores. Quero que trans e travestis percebam que podem se unir, que são parte de um grupo que busca os mesmos objetivos que é a plenitude de direitos. Devemos colocar um basta em quem tem a vida pautada em ódio e discriminação, o Brasil hoje é campeão em assassinatos de travestis e isso é inadmissível. Sem LGBTs unidos de fato não avançaremos.

11882250_764458563665268_3401587465659156647_o

Quem você quer que assista ao filme?
Isso não depende de mim, eu acho que fiz um filme legitimamente LGBT, que acredito, é melhor lido por LGBTs e quem se identifica com movimentos sociais, mas quem tiver interesse em assistir pode ficar à vontade, não vejo o filme sendo compreendido e aceito por uma elite branca de direita, mas posso estar errado. E o filme também não é para conscientizar fascistas, o único recado que o filme passa para essa gente é: Cuidado! Estamos quietos, mas até quando?..

Para saber mais, entre na página do filme no Facebook

Dez documentários que vão mudar sua visão de mundo

De Tatiana Issa e Raphael Alvarez, é um precioso retrato do grupo performático brasileiro que sacudiu a década de 70 com o desbunde e a sexualidade livre de seus integrantes. Uma obra-prima de registro histórico
De Tatiana Issa e Raphael Alvarez, é um precioso retrato do grupo performático brasileiro que sacudiu a década de 70 com o desbunde e a sexualidade livre de seus integrantes. Uma obra-prima de registro histórico
Créditos: Reprodução / Divulgação

int(1)

Já viu "As Bodas do Diabo", curta gay que quer vingança contra os políticos homofóbicos?