O Brasil está no topo do ranking de países que mais consomem crack no mundo. A nação representa 20% do uso da droga em todo o mundo, com ao menos 2 milhões de pessoas já tendo, em algum momento, ingerido a substância, uma das mais fortes existentes. Os dados são de uma pesquisa do Lenad (Levantamento Nacional de Álcool e Drogas), realizada em 2012 pela Unifesp.
Recentemente, o tema voltou a entrar em pauta após uma ação do prefeito de São Paulo, João Dória, junto ao governador do Estado, Geraldo Alckmin, ambos do PSDB, em que cerca de 976 policiais expulsaram viciados e prenderam ao menos 38 traficantes na região da Cracolândia, famosa área no centro da capital onde o consumo de crack acontece a céu aberto.
Os usuários expulsos se espalharam por outros 23 pontos próximos da região, onde seguem consumindo a droga. Dória, então, pediu nesta semana ao Ministério Público permissão para internar estes viciados à força em clínicas públicas, algo que o órgão rejeitou, acusando o político de promover uma “caçada humana”.
Para o médico psiquiatra, doutor em Medicina pela Universidade de Würzburg, Alemanha, e Membro Filiado do Instituto de Psicanálise da Sociedade Brasileira de Psicanálise de São Paulo, Prof. Dr. Mario Louzã, a medida é arriscada e ineficaz e só serve como saída em casos de maior conhecimento da pessoa em questão.
“É sabido que internações compulsórias para o tratamento de dependentes de drogas têm pouco resultado. Tão logo o paciente sai de alta, tende a recair. No entanto, dada a gravidade da dependência de crack, muitas vezes a internação compulsória é necessária devido ao risco de vida que o dependente tem. A internação compulsória permite que a pessoa passe pelo período de abstinência sob cuidado médico, em uma situação protegida. Estando “limpa”, é possível tentar trabalhar os motivos que levaram à dependência, e eventualmente oferecer a oportunidade de reabilitação e reintegração social do dependente”, disse ele, em entrevista ao Virgula.
Mario também defende uma ação conjunta entre as diversas forças sociais envolvidas no problema, algo que não aconteceu no domingo (21). “A política de combate ao uso de drogas depende de alguns fatores: ela precisa ser contínua (ações pontuais têm efeito passageiro), multiprofissional (envolvendo profissionais da área médica, psicossocial, jurídica, policial e outras), enérgica (evitando o “mais ou menos” na atuação e nas decisões) e integrada (os diferentes profissionais precisam agir de modo a que suas atuações sejam sinérgicas), opinou.
O vício em crack é poderoso e bastante veloz. Segundo estudos feitos nos últimos anos, a pedra causa uma dependência quase sem volta se for usada em até seis vezes apenas. O psiquiatra explica a razão disso acontecer: “o crack é uma droga que vicia rapidamente, com grande facilidade, devido ao fato de que é fumada. Ao ser aspirada, é rapidamente absorvida em grande quantidade pelos pulmões, caindo na circulação em poucos minutos. Esta característica torna o crack intensamente prazeroso e isto atrai as pessoas, pelo menos no início do uso. Em pouco tempo, a pessoa não consegue deixar de usar o crack, pois apresenta os sintomas de abstinência (fadiga, apatia, depressão entre outros) e sente a necessidade (“fissura”) de usar novamente”, disse.
Por fim, Mario crê no esforço do poder público em resolver o problema da Cracolândia, que existe desde 2000, pelo menos, e é um dos maiores obstáculos para a popularidade de um prefeito em São Paulo, mas indica que o problema é a falta de organização. “Há um esforço para tentar resolver o problema, mas ainda de modo desorganizado, sem um planejamento de longo prazo. O resultado tem sido de modo geral ineficaz. É necessária uma visão multidimensional para que se compreenda o problema em toda sua complexidade e possam ser buscadas soluções de longo prazo”, garantiu.
Fotos mostram antes e depois de viciados em drogas
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