Se você é daqueles que acham que a música brasileira já foi melhor, talvez esteja procurando no lugar errado. Com apenas 22 anos, Ayrton Montarroyos é uma alma velha que escuta Dalva de Oliveira desde tenra idade. O recifense é também um astro pronto para explodir.
Ayrton ficou conhecido em 2015 na quarta edição do The Voice Brasil, quando chegou à final e perdeu, em um paralelo futebolístico, como aquela seleção brasileira de 82. Oswald de Andrade falava em fabricar biscoito fino para as massas, nem sempre é um caminho fácil.
Antes mesmo do The Voice, ele já tinha uma indicação ao Grammy Latino por sua participação no disco Herivelto Martins – 100 Anos. Seu primeiro disco solo, que saiu em 2017, tem arranjos de craques como Arthur Verocai, Diogo Strauz, Yuri Queiroga, Vitor Araújo, Zé Manoel e Rovilson Pascoal.
Atualmente, Ayrton está fazendo uma série de shows com a grande dama Claudette Soares, figura icônica, e o monstro pernambucano Vitor Araújo, pianista e arranjador.
Que artistas novos mais gosta e indica?
Ayrton Montarroyos – Xênia França, Zé Manoel, Isadora Melo, Ylana Queiroga, Gisele de Santi e Felipe S.
Crê que exista algo na sua música que seja específico do seu lugar de origem?
Ayrton – Não conseguiria definir isso com precisão. Talvez seja inevitável que algo “recifense” venha junto com o que faço, mas não sei identificar onde especificamente. Guardo as minhas lembranças comigo para usá-las quando preciso. Vivi grande parte da minha vida e nasci em Recife e isso já diz muito sobre mim e sobre o que faço.
Você tem se apresentado com Claudette Soares e Vitor Araújo, fale um pouco desse encontro de gerações?
Ayrton – Claudette foi uma das primeiras cantoras que ouvi na vida. Aprendi com ela aquele canto “sussurrado”, baixinho… jamais pensei que pudesse um dia dividir momentos da minha vida com ela. Cada dia com a sua surpresa. Ao mesmo tempo somos um só no palco. Cantamos as coisas que gostamos. Ela e eu temos uma sintonia muito grande e nos divertimos muito fazendo os shows da turnê. Aprendo diariamente com a Claudette; com a sua postura, sua elegância e sua classe e afinação ao cantar, além de todo aquele sentimento. Tenho a sorte de dividir o palco com dois gênios.
Com quantos anos você está? Se sente parte de alguma cena? Que características crê que defina a sua geração?
Ayrton – Tenho 22 anos e não me sinto participante de “cena” nenhuma. Na verdade nem sei se elas existem. A minha geração pode ser definida pela ansiedade e pelo culto à imagem, além da grande ignorância, em sua maioria, infelizmente.
O que aproveitou mais da experiência com o The Voice?
Ayrton – Costumo dizer que passo pela vida e presto atenção, esta é uma frase da minha tia Cirleide, com quem aprendo tanto e a quem dedico o meu primeiro álbum. No The Voice não foi diferente. Aproveitei todo o tempo que tive ali para aprender, aprender e aprender. Meu negócio ali era cantar e melhorar a cada dia.
Uma vez me passou na cabeça a possibilidade de ganhar os R$ 500 mil (prêmio oferecido ao primeiro colocado no programa), mas logo passou. Isso me ajudou bastante, pois tive que me submeter à essência do que faço: canto porque amo.
É possível levar arte refinada para o mainstream, como dizia Oswald de Andrade, dar biscoito fino para as massas?
Ayrton – Infelizmente, vivemos numa época de ditadura. A reflexão não é mais apreciada. O método de ensino oferecido ao povo é medíocre. O plano de controle das massas se deu de forma muito bem sucedida, para o nosso azar. Hoje a opinião do ator de “Malhação” sobre a fase econômica do país se torna pertinente através dos veículos de “validação da opinião vulgar”.
As pessoas não são macacas. Mas é dificílimo se ter uma experiência real com a arte se você não tem acesso a esta. Eu mesmo faço tudo errado: leio demais, não assisto TV, assisto a filmes interessantes, só canto o que quero e procuro não abrir a boca quando não sei o que dizer. Possivelmente, jamais farei sucesso.
Quem são suas heroínas e heróis musicais?
Ayrton – Não tenho heróis na música. Por mais que o contexto em que os artistas se encontram possa parecer politizado ou desbravador, sempre se faz arte por um motivo egoísta. Fazemos por nós mesmos, depois por tudo o que vemos lá fora, ao nosso redor (e ainda assim é por nós).
Talvez Elza Soares tenha sido uma heroína na vida por ter suportado a própria vida com a cabeça erguida e suportando às flutuações do mercado e da vontade da sociedade. Talvez minha tia seja outra heroína por criar quatro filhos sozinha, depois tantas outras crianças (inclusive a mim). Tem uma catadora de lixo que formou o filho em medicina e depois mataram o rapaz. Essa mulher é uma heroína e nem preciso dizer o porquê.