Jota Quest lança Funky Funky Boom Boom
Créditos: Divulgação/Mauricio Nahas
House Music Will Never Die, uma faixa de Glenn Underground & Cei-Bei, apregoa que a house nunca irá morrer. A máxima parece pulsar no coração de Rogério Flausino, vocalista do Jota Quest, que lançou nesta quinta-feira (14), o clipe de Mandou Bem, faixa do recém-lançado álbum Funky Funky Boom Boom (Sony Music). Disco marcado pelas músicas voltadas para a pista.
“Acho que a coisa do groove, da batida, do BPM, a velocidade da canção, ela tem que fazer dançar. Como colocar o baixo na música e tal. A coisa da repetição”, afirma ao Virgula Música.
Veja o clipe de Jota Quest, com Nile Rodgers – Mandou Bem
O clipe, dirigido por Pietro Sargentelli, foi filmado na pista de patinação Roller Jam, no bairro da Mooca, em São Paulo e, em Nova York. Sargentelli e o diretor de fotografia Mark Bloomgardem captaram imagens de Rogders cantando, tocando sua Fender “HitMaker” e patinando.
O novo trabalho do Jota retoma o espírito setentista dos primórdios do grupo. Da convivência com o principal produtor do disco, Jerry Barnes, ficaram ensinamentos em sua passagem pelo estúdio da banda, o Minério de Ferro, em Belo Horizonte. Barnes é o baixista que substituiu um dos fundadores do Chic, Bernard Edwards (1952-1996). O guitarrista Nile Rodgers, o outro fundador da lendária banda da disco music, e um dos compositores de Get Lucky, do Daft Punk, também participa do álbum do Jota.
“O que vocês estão fazendo aqui é soul music, a gente precisa encontrar o groove, enquanto a gente não encontrar o groove, a gente não vai parar”, relata Flausino sobre Barnes. Leia a seguir a entrevista, concedida por telefone.
Pouca gente sabe que você já foi DJ…
(Ri) Eu andei dando umas ciscadas aí…
O que eu queria saber como essa experiência te ajuda a compor uma música, fazer um hit?
Acho que de muitas formas, cara. Quando eu fui DJ, o que eu gostava de tocar, o que eu tinha como set para tocar em pista, era house music. Então, assim, acho que a coisa do groove, da batida, do BPM, a velocidade da canção, ela tem que fazer dançar. Como colocar o baixo na música e tal. A coisa da repetição.
O fato é que, obviamente, a gente faz música pop. Mais a base da coisa, até da house music, que começa ali atrás com a disco. Então, se esse disco que a gente está fazendo, que é muito isso, a gente usou muito essas referências que eu tinha como DJ, coisas que os meninos também tem aqui. Paulinho e PJ, já programam essa coisa de loop e de groove há muitos anos, 20 anos, quando a gente começou os meninos estavam fazendo loops para botar em baixo.
E o loop você pega de coisas que você gosta e tal para transformar e toca em cima. Então, a gente continua fazendo muito esse tipo de coisa.
E sei lá, cara, fazer outros sets assim de festa. Esse disco, a gente pensou nisso, queria fazer um CD que daria para gente botar numa festa e deixar ele rolar, saca? Como se a gente estivesse colocando as músicas. E, obviamente, não pode ficar o tempo inteiro com o mesmo tipo de música, você tem que dar uma oscilada, mas sem sair do espírito da coisa. Erros talvez cometidos em outros álbuns.
Isso que ele tem quase uma hora de disco, são 58 minutos e ele passa por várias ondas, mas sem deixar de ser agradável. Ele vai provocando mudanças, a cada virada de música, ele tem uma onda, ele vai subindo, depois ele dá uma abaixadinha, depois ele sobe de novo, dá uma abaixadinha.
Se tiver que colocar ele no repeat, quando chega na 15ª música e vai para primeira de novo, ele tem uma onda também. Eu pensei muito nisso, pus as músicas na ordem, fiquei dias mexendo nisso para fazer uma coisa que fosse agradável, que uma música ajudasse a outra a ser mais legal. Isso também pode ser influência de um DJ para você montar um CD de música pop, que é o Funk Funk…?
Vocês já trabalharam com Hyldon…
Sim, a nossa primeira música que a gente lançou na vida foi a versão de As Dores do Mundo.
Isso traz uma perspectiva para a música negra brasileira, que nem sempre tem a sua devida valorização? Como você acha que o que está rolando com Nile Rogers, com o Chic, com o Earth Wind and Fire, poderia chegar também a Cassiano, Hyldon, Tim Maia, e outros nomes do funk e soul brasileiro?
Ué, cara, na verdade, no caso do Tim Maia, especificamente, eu acho que Tim Maia é uma presença constante na vida da gente. Vira e mexe o Tim volta com tudo. E no caso do Jota sempre fez parte, a gente tocou muito as coisas do Tim, já gravamos em disco. Inclusive, bicho, vou te falar uma coisa, ficou de fora desse disco uma regravação de uma música do Tim Maia, que está pronta. A gente não pôs no disco, não sei nem por que, cara, agora você falou eu lembrei. Talvez por que o disco não tem nenhuma regravação. A gente tinha acabado de lançar uma regravação do Lulu e talvez a gente, por isso, tenha optado por não colocar.
Mas, enfim, o Tim Maia, está sempre presente…
Que música que é?
(Silêncio) Ah, não vou falar, não posso falar, não posso falar. Eu vou guardar, qualquer hora dessa a gente vai lançar essa música. Não é uma música conhecida do Tim, tipo hit, não. É um B-side dele interessantíssimo.
Quando a gente lançou o primeiro CD, assim como a regravação do Hyldon, a gente chamou Tony Tornado para cantar no disco, na época na canção A Quanto Tempo e foi muito interessante e tudo mais.
E eu acho que sim, todos essas grandes cantores, a história da música black do Brasil, que passa pela carreira do Tim, do Jorge Benjor, do Hyldon e do Cassiano, que são o pessoal mais da soul music mesmo. O (Cláudio) Zoli que é um cara mais novo, mas que sempre cultivou isso.
Se a gente for ficar viajando, você consegue achar traços disso no trabalho de muita gente. A Sandra de Sá não pode ficar de fora dessa lista nem fodendo, a Sandra sempre foi uma black woman da pesada. Eu acho que, estou tentando lembrar mais nomes, a banda Black Rio, Azymuth, tem muita gente que foi muito importante.
E como diz no livro da Claudia (Assef, Todo DJ Já Sambou, Conrad), os bailes de black music dos anos 70, que foram os que trouxeram essas coisas para cá, ainda de ter a disco gerou muita coisa que hoje a gente tem aí. O início do funk do Rio de Janeiro, do batidão.
O rap também aqui em São Paulo, Chic Show, Zimbabwe, Kaskatas…
Também, Thaíde & DJ Hum…. É o embrião todo, de todo esse movimento, que se realimentando dessa história musical riquíssima que o Brasil tem. O lance do samba ser muito forte no Brasil, é uma coisa muito nossa, e o forró também, e o Tim Maia misturava isso muito bem. Tim Maia misturava forró com funk, cara, era muito animal, tipo Festa do Santos Reis. Tudo isso tem valor histórico inenarrável. A gente tem que ficar muito atento a isso.
O samba-funk do Jorge Ben. Isso aí é foda demais.
E o que você acha que esses caras das antigas, tipo o Nile Rogers, trazem para música de hoje?
Olha, cara, eu acho que é essa forma de reciclar, o que você pode fazer. É como uma enciclopédia mesmo. “Vem cá, como é que se faz essa parada?”. Não tinha programação eletrônica, técnicas de gravação eram antiquíssimas, e no final dos anos 70, quando não o processo não tinha se modernizado, como é que os caras tiravam esse som, cara?
Como que o bumbo ficava assim, como que o som do baixo ficava assim? Que equipamento que esses caras usavam? Aí você vai ver, era a simplicidade e o jeito de tocar os instrumentos que geravam aquela sonoridade. Que fazia a diferença na pista. Good Times (do Chic), (cantarola), bateria simples, tum-tá-tum-tá, o baixo (tum-tum-tum-tum-tum-tum-tum-tum-tum). Piano, trim. Se você quer programar isso, você fica horas. Mas se você ouvir, olha a simplicidade dessa parada. É aí que está a alma do negócio.
Você tentar enxergar como é que se fazia. E você começa a encontrar caminhos legais. Eu acho que são referências muito boas. A gente ouviu muito Michael Jackson também fazendo esse disco, as coisas do Michael, aquele tipo de produção. Traz escola, né? O que traz? Traz ensinamento.
Foram sons que quando foram lançados eram de uma vanguarda absurda para a época. E a gente hoje, se você quer fazer um som nessa praia, não tem como fazer sem ir ali estudar essas coisas.
Eu fui na Jovem Pan quando vocês estiveram divulgando o disco nas rádios, até na ocasião entrevistei o Marco Túlio, e ouvi vocês comentando que estavam numa fase mais tranquila na vida. Um cara para fazer música feliz é preciso estar feliz? Ou é como um ator, outras coisas entram em jogo?
Não essencialmente, tanto de um jeito como de outro, eu acho que você pode estar triste e fazer uma música feliz para ela e ajudar a ficar feliz, em busca da felicidade, entendeu? Quanto você pode também estar feliz para caralho e escrever uma canção tão emocionante, que possa ser considerada triste em um segundo momento. Ou se não triste melancólica, digamos assim. Igual as canções do Coldplay, por exemplo, sacou? As canções do Coldplay elas são assim, elas tem uma melancolia, mas elas são lindas.
Que sensação que você espera transmitir nos seus discos e seus shows, como espera que o público saia se sentindo?
Eu quero que o cara saia do show feliz mesmo. Eu acho que uma coisa que a gente pode falar. O que dá errado muitas vezes e talvez a gente até tenha errado nesse sentido é assim, você fazer uma base muito alegre, dançante e para fazer a letra você vem com um papo meio sério na parada. Aí você perde o tiro porque o cara, peraí bicho, é pra dançar, é para pensar, é para pular? Não estou entendendo. Tem jeito de pensar dançando? Parece que são coisas que não combinam muito.
Se você está querendo levar um papo talvez a base musical pode ajudar você a levar a coisa para o lado certo. E vice-versa.
Pô, essa música me remete a o quê? Essa música me remete a alegria, festa, alto astral, diversão. Então, vamos fazer uma letra falando disso, cara. Aí você ajuda a encaminhar o negócio. Esse disco novo tem esse acerto. A gente estava fazendo um disco alto astral, com as levadas para dançar, para curtir. Então, vamos nos ater a isso, vamos procurar as canções que tenham letras certas para músicas certas e vice-versa. Por isso que eu estou curtindo esse disco, o La Plata é meio doido. É meio confuso.
Quais foram os maiores ensinamentos que vocês aprenderam com Jerry Barnes que vocês vão levar para vida toda na hora de produzir um som?
Jerry é um cara muito maneiro. Nós vamos levar muita coisa porque ele tem muita experiência, é norte-americano, trabalhou com as maiores figuras ali. Então, desde coisas técnicas, de gravação, de jeito de tocar, posicionamento de microfone, formas de como se gravar, por exemplo, backing vocals. Eu aprendi muito com ele.
Eu sempre vinha aqui gravar uma voz à direita, esquerda, aí fazia uma dobra. A primeira coisa que ele falou foi, não cara. Nós vamos fazer camadas inteiras, três, quatro, inúmeros canais. Aí, você vai ouvir os backings, fica aqueles puta backing vocals mesmo foda, entendeu? Muitas camadas. Aí na hora de mixar, o cara abre os estéreos.
Desde uma coisa artística e técnica ao mesmo tempo, até como se comportar mesmo durante as gravações. Ele botava a gente para tocar e a gente ficava tocando, tocando, tocando. Até encontrar o astral do negócio. Aí, ele falava, OK, agora foi legal, aí parava.
E a gente assim, a gente tocava, tá bom, tá bom, ia lá ouvir, “ah, tá bom”. Ele não, velho, o que vocês estão fazendo aqui é soul music, a gente precisa encontrar o groove, enquanto a gente não encontrar o groove, a gente não vai parar.