Se você pensa que ser roadie é uma maneira de curtir shows de graça e ficar perto dos seus ídolos, a coisa não é tão simples. “Geralmente, é só ralo mesmo, mas há algumas exceções”, diz Graciliano Neto, que pelo segundo ano consecutivo trabalhou como assistente técnico no Palco Perry, dedicado à música eletrônica.
Sobre a profissão de roadie, que exerce, ele fala: “A dica para você que quer se aventurar nesse ramo, é saber, primeiramente, que esse trampo não é festa, queridão. Aqui o bicho pega e as responsas são enormes. E também ter disposição e humildade para aprender todo dia algo novo”, afirma.
Anotem aí, meninos e meninas, não se esqueçam que Lemmy Kilmister foi roadie de Jimi Hendrix (1942-1970): “Ser proativo do começo ao fim de qualquer trampo. Admitir seus erros sempre que eles aparecerem, mentira tem perna curta e com a verdade e sinceridade se vai longe. Ser ligeiro, entender tudo o que acontece ao seu redor, mesmo que não profundamente. E, o principal, ter muito amor pelo que faz, pois não é fácil essa vida. Só os loucos sobrevivem”, conclui.
Neto explica ainda que o roadie deve estar pronto para atender ao artista em tudo que ele possa precisar, nem que seja a encher balões de aniversário e ficar preso em uma “parede de borracha”. “No Lolla do ano passado, rolou uma parada engraçada, ficamos eu Flavio Flório, Carlão e Patrick dentro de contêiner enchendo bixigas gigantes para um DJ. Enchemos cerca de cem e, quando tentamos sair do contêiner ficamos presos no meio das bixigas. Quase tivemos que furá-las para conseguir sair”, lembra.
Ele também tem um “causo” de quando começou a trabalhar. “No começo do meu trampo, fui fazer um show no Sesc Vila Mariana com o Pedra Branca, estava aprendendo tudo ainda nem sabia direito nomes, cabos e nada. Nesse dia fui trampar até de chinelo (risos). Estava eu guardando os bags e joguei uma parte da cortina em cima de um case, que eu não sabia, mas esse não era um case, mas sim o rack de potência do PA e monitores. Depois de uns dez minutos o som parou é o técnico do Sesc desceu desesperado, quando foi ver eu tinha tapado com o tecido as potências superaquecendo e desligando todas as caixas”, diz o roadie, que hoje trabalha com Palavra Cantada, banda Mirim, Guilherme Kastrup, Ceumar e DLC.
Neto, que também é MC, prepara o primeiro single do seu projeto C.H.E.F.E. (Cantando Histórias Eliminando Fronteiras Estabelecidas). Com seu característico cabelo black power, no entanto, já houve quem se incomodasse com seu visual no estilo “negro é lindo”. “Já, sim, tem gente sem noção, mas quando isso acontece, mostro no trampo que sou melhor do qualquer otário preconceituoso. Mas isso ocorreu isoladamente em muitos poucos momentos de minha vida profissional e fora do Brasil, aqui a galera respeita muito o indivíduo, independente de estilo, sabe?”, argumenta.
A treta foi em Portugal. Logo no país que promoveu o sequestro e a escravização dos negros da África. Prova de que, pelo menos na mentalidade de alguns ignorantes, são muito mais que 12 anos de escravidão, passam de 500. Assim como a profissão de roadie, o racismo também não é uma festa.