Projetonave

Ênio César Projetonave

Com uma série de convidados especial barra pesadíssimas, em um verdadeiro “who is who” do rap brasileiro atual, o Projetonave faz três apresentações do projeto Mixtape, no Sesc Vila Mariana, nesta quinta (4), sexta e sábado. Entre os convidados estão nomes como OgiDon LRico Dalasam, GogCurumim, Edi Rock, SínteseMarechal e Raphão Alaafin.

Com instrumentais atuais e clássicos de rap nacional, o material da série Mixtape vem sendo lançado em cassete e vinil. A banda, que estreou no clube Sarajevo, em São Paulo, e desde 2010 é “residente” do programa Manos e Minas, da TV Cultura, vem se destacando na produção de instrumentais e acompanhando rappers e cantores, tendo participado de registros de nomes como Emicida, Marku Ribas, Flora Matos, Hyldon, Gerson King Combo e Dexter.

Nós trocamos uma ideia com Akilez (voz, MPV, escaleta e programações). Além de Akilez, o Projetonave é formado também por Alex Dias (baixo acústico e elétrico), Marcopablo (guitarra), Flávio Lazzarin (bateria), Willian Aleixo (teclados) e DJ B8 (toca-discos e samplers).

O que tá acontecendo de mais novo na música brasileira hoje?
Akilez – No meu ponto de vista, tem muita coisa nova aos olhos da mídia que são antigas em suas atividades, no Brasil sempre tem um delay muito grande na comunicação de massa com as coisas realmente frescas e inovadoras. Sendo assim para acompanhar o que é realmente novo tem que estar nos lugares certos vivenciando seu nascimento. No ABC mesmo temos coisas muito boas, que estão aparecendo agora mais que já estão em atividade faz um tempo, são tantas as bandas e grupos em atividade com novas propostas no Brasil que não caberia aqui nessa resposta.

Quais foram os maiores ganhos e perdas da atual geração do hip hop em relação a anterior?
Akilez – Eu entendo a coisa como um processo, o país mudou muito, o mundo mudou muito. A geração dos anos 80, 90 foi a linha de frente, que apanhou da polícia, carregou caixas, fez shows sem nenhuma estrutura e sofreu todo tipo de preconceito. Graças a essa geração a cultura no país resistiu e essa resistência refletia nas músicas e ainda reflete, dependendo de qual parte da cidade ela vem. Hoje temos a internet e outras classes sociais apropriando-se da cultura, o que ao meu ver, faz parte porque cultura de rua não tem dono. Mas tem representantes de certas linhas de pensamento e a história esclarecerá qual visão fará sentido para a cultura e o indivíduo.

O rap surgiu como forma de protesto, representando pessoas que não eram ouvidas, e assim se espalhou. Hoje, novos temas são colocados em pauta e outros tipos de realidade são expostos. Creio que no topo da pirâmide entre tese e antítese, a síntese mostrará quais pontos foram úteis. Precisamos de mais tempo para avaliar. Mas de imediato, considero algumas vertentes como desserviço. Comerciais de bebidas e drogas já temos aos montes, na televisão inclusive.

Simpatizo mais com MCs que transmitem conhecimento para que os jovens saibam o que fazer com essa realidade. Alguns MCs já fazem a união dessas duas pontas, como o Neto (Síntese), que é fruto da nova era e dialoga com a diversidade, resgatando o compromisso da fase inicial do rap, que é informação e conscientização. Essas duas forças aliadas podem tornar-se um grande veículo de transformação social. Acho que o hip hop como movimento que abrange outro braços além da música construiu-se sobre a valorização coletiva e não com a disseminação da vaidade e o foco em cada um. Então, o que vejo de ganho nas duas gerações são o compromisso e resistência da primeira somados ao poder de disseminação da informação da segunda.

 

A ideia de que o rap nacional é musicalmente menos elaborado que o produzido nos Estados Unidos é ultrapassada?
Akilez – Sim, esta ideia é ultrapassada. Conheci muitos MCs e DJs criativos que acharam saídas geniais para a precariedade, como o loop em fita K7 que eu fazia em 92 e que depois descobri que várias pessoas faziam em pontos diferentes da cidade, sem se conhecerem. O que sempre percebi é a diferença de estrutura e mercado. Enquanto nos anos 90 os americanos já tinham estrutura técnica e um mercado estabelecido, aqui no Brasil, a cultura era discriminada e os que encaravam a situação dificilmente tinham chances de ter os equipamentos que temos hoje.

Em termos técnicos, atualmente estamos quase iguais. Em alguns aspectos criativos, vejo brasileiros à frente dos gringos em vários sentidos, só que isso não é amplificado mundialmente como acontece com a produção de lá. Um exemplo é ouvir constantemente que o Projetonave é o Badbadnotgood brasileiro. Mas nós fazemos isso há 20 anos, que é a idade média dos integrantes da banda, da qual gosto muito, aliás. Este exemplo ilustra que ainda as coisas de fora soam como referência, mesmo surgindo depois.

Vocês surgiram no Sarajevo, num esquema muito de guerrilha, existe algo daquela época que sentem falta?
Akilez – Olha, ainda somos do esquema de guerrilha, do mesmo jeito, e fazemos muito do que fazíamos lá, que era experimentar as vivências artísticas sem pudor. Podemos dizer que estamos na continuação disso. No Sarajevo, tínhamos liberdade total, era o início da transformação do Baixo Augusta. O Sarajevo ainda chamava-se Internet Point e o Lazlo, o idealizador, teve a visão de que lá se transformaria no que é hoje, muito antes disso acontecer. Ele nos deixava livres para tocar o que quiséssemos.

Cansamos de ir para lá sem saber o que tocar e quem apareceria para participar. Tivemos momentos memoráveis que foram a semente para entrarmos no Manos e Minas (TV Cultura). Nessas sessões de freestyles, apareceram Emicida, Kl Jay, Flora Matos e ali começamos a experimentar sons com os MCs, história que dura até hoje, 12 anos depois. O box de compacto 7” (vinil), que produzimos desde 2009, reúne lançamentos de compactos individuais que completarão uma caixa com 15 discos. Já lançamos sete, todos de forma independente.

Que pontos consideram que foram essenciais para a evolução da banda, ter acompanhado artistas, serem a banda residente do Manos & Minas? Como se dá essa troca?
Akilez – Bom, só no Manos e Minas tocamos com mais de 300 MCs diferentes totalizando mais de mil músicas tocadas nesses seis anos de residência. Uma grande vivência. Poucas bandas autorais têm essa possibilidade de tocar com tantos artistas diferentes e poder dividir momentos verdadeiros. Já tocamos, gravamos e compusemos com muita gente sem assinar nenhum contrato e nunca tivemos nenhum tipo de problema com ninguém. Isso não tem preço, fama ou qualquer outra coisa que compre.

Os shows da Mixtape só são possíveis graças à relação de respeito que temos com cada artista. Esse, para nós do Projetonave, é o maior legado que temos. De alguma forma, podemos contribuir para essa cultura com a nossa linguagem e vivência verdadeira, além de guardar na bagagem todas essas experiências. Neste ano, o Projetonave lança um álbum e com certeza tudo isso entrará no trabalho. Será um espelho até para nós sabermos como todas essa experiências nos afetaram. É difícil analisar as coisas no meio do furacão, mas é lá que gostamos de estar. São 19 anos sem parar.

SERVIÇO

Projetonave Mixtape
Show
Dia 4 de fevereiro, quinta-feira, às 21h
Com Síntese, Tifú, Erick Jay, Stefanie, Rodrigo Brandão, Sant, Curumim, Inquérito e Edi Rock

Dia 5 de fevereiro, sexta-feira, às 21h
Com Síntese, Rico Dalasam, Edgar, Ordem Natural, Espião, Discopédia, Don L, Inglês e Black Alien

Dia 6 de fevereiro, sábado, às 21h
Com Síntese, Marechal, Gog, Raphão Alaafin, Izzy Gordon, Dö, Ogi, Nego Max e Amiri

Local: Teatro (capacidade: 620 lugares)
Duração: 90 minutos
Classificação indicativa: 12 anos

Ingresso: R$ 25 (inteira) l R$ 12 (aposentado, pessoa com mais de 60 anos, pessoa com deficiência, estudante e servidor de escola pública com comprovante) l R$ 7,50 (trabalhador do comércio de bens, serviços e turismo matriculados no Sesc e dependentes/Credencial Plena).

Sesc Vila Mariana
Rua Pelotas, 141, São Paulo
Informações: 5080-3000
sescsp.org.br
Facebook, Twitter e Instagram: /sescvilamariana


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Projetonave promove "quem é quem" do rap nacional em shows