Paul McCartney no Rio de Janeiro - maio de 2011
Créditos: Marcus Hermes
Rio, Rio, Rio, Rio! E o pior é que era perfeitamente crível o entusiasmo daquele senhorzinho com a cidade que voltava a acolher seu show, 21 anos após um histórico recorde de público no Maracanã. Uma conjunção de fatores fez com que a primeira noite do Paul In Rio 2011, ontem, no Engenhão, fosse algo de memorável.
Um domingo ameno, típico do outono carioca. Uma arena tinindo de nova, bonita em seu estilo hi-tech. Uma população que se deslocou ordeiramente, feliz, graças a um esquema bem montado de metrô e trens. Um equipamento de som e luz de irrepreensível qualidade. E o show do beatle mais capaz de entreter grandes platéias, como as 45 mil pessoas que acorreram ao estádio para a primeira noite da temporada carioca da Up and Coming Tour (hoje tem mais Paul no Engenhão, a partir das 21h30).
Os ingressos para aquele domingo haviam esgotado num piscar de olhos – e a noite era cercada de mil expectativas, ainda mais porque, no ano passado, Paul só havia tocado em São Paulo e Porto Alegre. Estavam lá no estádio carioca aqueles senhores que, ainda jovens, conheceram os Beatles em fotos de revistas e capas de discos. E estavam lá os garotos que os conheceram agora, do videogame Rock Band. Para nenhum deles Paul McCartney decepcionou – por mais previsível que possa ser o seu espetáculo, bem rodado em palcos mundo afora e bem conhecido em DVDs.
A promessa era de uma sequência (que muda minimamente ao longo da turnê) de pouco mais de 30 músicas (foram 33). Um bem montado roteiro, basicamente. Mas a objetividade desmontou aos primeiros acordes de Hello Goodbye, que soaram no horário nada britânico de 21h44.
Apesar do blazer azul que, à distância, poderia confundi-lo com Roberto Carlos, quem estava lá era o velho Paul, com seu velho baixo Hofner, cantando aquela velha canção dos Beatles, acompanhado pelos guitarristas Rusty Anderson e Brian Ray, o baterista Abe Laboriel Junior e o tecladista PaulWix Wickens (todos, por sinal, também ótimos vocalistas). Naquela hora, para todos os efeitos, eram os Beatles. Ou melhor: o mais próximo que se chegará deles em 2011.
E aí, ao longo de duas horas contadas (até que parasse para o primeiro bis), Paul dominou a cena. Seja tocando Beatles como os Beatles (All My Loving, Drive My Car, And I Love Her, Paperback Writer), seja brincando de falar português carioca com o público como se fosse o tio enturmadão, seja inserindo o seus comentários políticos light (como ao dizer que fez Blackbird em prol dos negros americanos que sofriam opressão nos anos 60 ou ao estampar o rosto de Barack Obama no vídeo enquanto executava Sing The Changes, do projeto The Fireman). Aquele Paul hiperativo, de 68 anos, adulando sensacionalmente o público, parecia o garoto Paul que, aos 15, tentava agradar o arisco John Lennon, que acabara de conhecer, cantando Twenty Flight Rock, de Eddie Cochran (em cena já clássica do filme O Garoto de Liverpool).
John, por sinal, ganhou a sua homenagem no show, quando Paul cantou Here Today. E o outro finado beatle, George Harrison, teve a sua, na forma de “Something”. E não faltaram na noite ainda os sucessos de McCartney com os sua banda dos anos 70, os Wings (Jet, Band On The Run, Let’em In e Live and Let Die, que eclodiu em fogos em momento de grande emoção).
Baladeiro dos mais conceituados, o homem das “silly Love songs” deixou porém para o final da primeira parte do show a sua munição pesada: Let It Be e Hey Jude, esta a responsável pela grande cena tocante da noite: balões voam enquanto o público entoava o coro e, ao mesmo tempo, brandia cartazes que dizem: Na Na Na Na Na. É um desses momentos em que o rock fica entre o mais ridículo e o mais sublime. E ninguém acaba resistindo.
Na volta ao palco, perfeitamente programada, Paul engatou uma seleção respeitável: só Beatles, com Day Tripper, Lady Madonna, Get Back, a indispensável Yesterday, uma arrepiante Helter Skelter e o gran finale de Sgt. Pepper’s Lonely Heart Club Band. Nessa hora, tudo mais foi relevado: o paletó azul, os suspensórios, o excesso de gracinhas, o telão de videoquê de The Long and Winding Road, o teclado de churrascaria fazendo a vez das cordas em Yesterday… Em duas horas e meia de show, o dinheiro pelo bilhete estava totalmente justificado. E, num domingo de outono do Rio, Paul McCartney provou que é programa para toda a família.