Foi em uma fria São Paulo, bem diferente do Rio 40 graus, que a carioca Fernanda Abreu bateu um papo com o Virgula para falar sobre seu novo álbum, Amor Geral. “Parece que estou lançando meu primeiro disco”, conta empolgada, que, para quem não sabe, ficou 12 anos sem lançar um trabalho de inéditas.
Nesse tempo afastada do show business, a cantora passou por momentos pessoais bastante difíceis; separação de um casamento de 27 anos, processo de luto de sua mãe, e ficou perdida com as mudanças do mercado musical. Mas, superado tudo isso, a ‘garota sangue bom’ encontrou inspiração novamente: “Nesse álbum eu consegui manter um equilíbrio entre a Fernanda do passado, aquela do começo da minha carreira solo, e a atual. Eu me inspirei em minha vida, e no mundo à minha volta. No final consegui um resultado que busca a minha essência, mas traz algo novo dentro da linguagem pop”.
E, esse novo tem a ver com mudança. “Sempre vamos se transformando. É importante para o artista se desafiar e mostrar algo de novo”, diz Fernanda sobre o direcionamento pop e eletrônico do disco. “Sou contemporânea. Fico muito ligada nas coisas que estão saindo. Ouço Drake, Kendrick Lamar, The Weeknd. Aqui do Brasil tem o Liniker, Rico Dalasam, Jaloo, Duda Brack, etc. E tem outra, de uns sete anos pra cá percebi uma presença do subgrave, a chegada do trap. Conheci alguns DJs e produtores (Tuto Ferraz e Sérgio Santos), e fui aos estúdios deles para ver como estavam fazendo a parada. Então comecei a pegar o que achava que tem a ver com o meu som”, explica.
Outro sim, primeiro single e primeira faixa do álbum, é um exemplo de como essas batidas e o subgrave explorados batem forte nas caixas de som. “Eu e Vladimir Gasper (nome artístico de Pedro Bernardes) produzimos a faixa, que ficou com uma pegada bem eletrônica e moderna. O rapaz é um gênio”, elogia Fernanda.
Outro mega DJ e produtor que participa do disco é o americano Afrika Bambaataa, que, segundo a cantora é o pai do funk carioca: “Encontrei com ele e falei: ‘Olha, eu tenho uma música chamada Tambor, que é uma homenagem ao batuque mais primordial e que tem a ver com o funk carioca, e queria que você participasse dela, porque você é o pai do funk carioca. A sua música Planet Rock estourou no Rio de Janeiro de uma forma estrondosa, e foi a música mãe do funk carioca. Daí ele aceitou'”, celebra a cantora, com ar de ter conseguido realizar um sonho. “Ensinei para ele palavras como ‘baile funk’ e ‘tambor’ em português. Ele foi para o estúdio, começou a costurar a música daquele jeito que só ele sabe e ficou genial”.
Fernanda Abreu retorna em um momento da música dominado praticamente por figuras femininas, como Beyoncé, Rihanna, etc, e ela mesma celebra essa posição: “O que está acontecendo com as mulheres no pop é fantástico! Cada vez mais as mulheres se colocam de maneira forte, com pulso forte, libertário e de liberdade”, e emenda: “Porque você sabe, a gente vive em uma realidade cruel de desrespeito e violência contra a mulher. Tudo isso vem unindo e fortalecendo as mulheres, e também os homens que se revoltam com essa situação, pois o mundo está totalmente ligado com a arte”.
E no que sua música ajuda a lutar contra as vozes conservadoras que vão contra os direitos das mulheres, aborto, negros e diversidade sexual? “Meu discurso é muito verdadeiro. Não quero impor nada a ninguém. Acho que é necessário discutirmos assuntos como a legalização de drogas, aborto, homofobia, racismo e direito das mulheres. São pautas que estão aí quicando no mundo e o Brasil tem que se dar conta disso também. A humanidade precisa avançar. Nesse sentido, minha música não chega a ser panfletária, mas no pano de fundo, no discurso subliminar, ela vem com essa mensagem libertária”, finaliza Fernanda.