Se você procura o novo na música brasileira, inevitavelmente chegará em Tássia Reis. Recentemente, ela surpreendeu ao lançar XIU!, que não apenas dá nome a uma música, mas também a uma marca de roupas.
Produzida por Slim Rimografia, a faixa tem mix e master de Luis Lopes e foi gravado no estúdio Flapc4, em São Paulo. O clipe gravado no Estúdio Lâmina com a cantora vestindo peças da sua grife. “Ela nasce com oito looks, a princípio, que unem o conforto e liberdade, sem abrir mão da lacração e do close”, afirma texto de divulgação.
“A ideia é um sonho antigo e veio em 2012, juntamente com sua amiga Talita Freitas. Aos 20 anos, quando saiu de Jacareí, interior de São Paulo, para cursar design de moda na capital, Tássia Reis nem podia imaginar como seria sua vida cinco anos depois”, completa.
Beyoncé, Rihanna, Kanye e agora você, né? Fale um pouco sobre a relação da música e da moda?
Tássia Reis – (risos) Esses nomes são referência com certeza. A música, assim como a moda, é um retrato de nosso comportamento. É sobre como nos sentimos e também sobre como queremos nos expressar para o mundo. Acredito que uma coisa acompanha a outra, que podem até existir separadamente, mas ganham uma potência enorme quando juntas, imagina juntas! (risos)
Como é ver o negro ser cool e fashion de um lado e de outro sofrer imensamente com racismo e violência, como provam as estatísticas?
Tássia – Não sei ainda onde ser negro é ser cool, pois continuamos morrendo de várias maneiras. Até quando nos tornamos exceção e ascendemos socialmente, as doenças que o racismo causa, por várias vezes, nos mata também. Clamamos por representatividade na tentativa de possibilitar uma nova existência, a autoestima de querer transgredir o lugar imposto para a pessoa negra no Brasil. O que vejo não é nada novo e nem confortável de se conversar. Percebo a cultura negra sendo usada, em sua maioria, sem a participação dos artistas, intelectuais, criadores negros. Ou o esvaziamento de nossa colaboração, nos reduzindo a uma persona cool. Quando, por exemplo, ninguém diz que ser branco é cool, apesar de sabermos que o indivíduo branco tem a melhor posição na pirâmide social. Porque a normatividade é estabelecida com tal.
No momento que dizemos que ser negro é ser cool (parem!), isso soa como se fosse uma profissão ou uma moda. Isso só evidencia como a pessoa negra é tratada na sociedade, como um artigo, uma coisa exótica (apenas parem!) quando, na verdade, ser negro é uma condição. Ser negro é ser negro – e se você não for negro, nunca saberá como é. No entanto, é possível respeitar mesmo sem você ser essa pessoa. É possível ter empatia. Agora, se o que produzimos é cool, maneiro, bacana, nada mais justo do que colhermos os resultados de nossas produções, não é mesmo?
Por que é importante que os brancos discutam racismo e como eles podem ser brancos melhores, na sua opinião?
Tássia – Acredito que as pessoas podem opinar menos e pesquisar mais. Se existe uma real vontade de se desconstruir é importante entender que somos todos diferentes e que cada pessoa é um indivíduo, carregando com ela sua bagagem histórica, ancestral e enfrentando barreiras diferentes na vida.
Tendo um olhar mais realista é importante entender que o racismo é uma estrutura na sociedade e não uma questão de gosto. Sugiro que saiam da bolha e percebam o mundo ao redor. Olhem em shoppings, restaurantes, empresas e entendam a ausência e presença das pessoas negras e em quais circunstâncias.
Sugiro que pesquisem, façam leituras, frequentem palestras, sejam ouvintes e nunca pensem que estão isentos de serem racistas. Como disse anteriormente, é uma estrutura na sociedade estabelecida há séculos e não é um livro que vai fazer você interromper seus costumes racistas de uma vez por todas. Outra coisa importante é: conversem entre vocês. Na família, no trabalho… não trate uma pessoa negra como um dicionário negro ou Wikipédia, porque na internet tem tudo, gente!
Em junho, as revistas Elle, L’Officiel e Vogue estamparam modelos negros nas capas. Na Vogue, das últimas sete capas, quatro foram protagonizadas por negros. Crê que o empoderamento e a autoestima dos negros esteja associada à sua presença não apenas na moda, mas na cultura, negócios e política?
Tássia – Se a gente for contar a quantidade de capas que já existiram, com a quantidade de pessoas negras estampando suas capas, ainda vai ser muito baixa. Mas também entendo que estamos começando um novo momento, onde ocupar esses outros espaços tem sido fundamental para que nossa participação não se resuma a algo superficial. De fato, precisamos estar nas editoras, sendo roteiristas, escrevendo livros, sendo cientistas, empresárias, jornalistas. Acredito que nossa história precisa ser contada e reescrita por nós mesmos. Inclusive, quero ser capa da Elle!
O que tá rolando de mais novo na música, na moda e nas duas juntas hoje, na sua opinião?
Tássia – A música borbulha, né? Sempre tem algo novo rolando ou é tão bom que se torna atemporal, tipo a Missy Elliot, rainha afrofuturista, ela ta sempre à frente! Gosto muito da SZA também, vejo nela uma persona real, ela é aquilo: jovem, descontraída e ao mesmo tempo closeyraaa. Me identifico bastante. A Karol Conka também é ícone. A besha tem uma personalidade incrível e brilha muito no mundo. Vou puxar a sardinha pro coletivo que faço parte, Rimas & Melodias: nós causamos real nos looks! E de boy tem o Anderson Paak que me cativou com sua identidade visual dos clipes, instagram e a capa do disco “Malibu”, ele vem forte na colagem e eu sou apaixonada por isso, fora o som que é muito foda. O Tyler the creator conquistou o meu coração com a Golf Wang e a identidade visual do novo disco, e também com a campanha da Converse, da qual ele entrou como diretor criativo. E também tem a Solange, que dividiu o mundo da música com 1 disco e 2 clipes. Tive a oportunidade de ver o seu espetáculo no Afropunk em NYC e ela consegue estender o conceito estético ao palco. É de uma profundidade e de uma perfeição que parece até fácil fazer aquilo. Ela reina muito!