niLL mistura sonoridades em álbum que explora relações sociais pós-pandemia (Foto: Divulgação)

Como reaprender a se relacionar com as pessoas depois da pandemia? No álbum “O Resgate do Maestro”, o MC e produtor niLL conta essa história a partir da visão de um robô que chega à Terra para explorar as emoções de seus habitantes, misturando a música com um mundo fantasioso. A saga, lançada hoje nas plataformas digitais, começa dentro de uma favela, pois segundo o músico “não existe lugar nenhum no mundo que tenha os sentimentos tão aflorados quanto uma quebrada. Na favela você vê o amor e o ódio bem perto, tá ligado? Um do lado do outro, dentre milhões de sentimentos a mais”.

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A concepção do robô Maestro como personagem, que representa todo o projeto do álbum, desde a identidade visual até a sonoridade, como responsável pelo resgate cultural da música através dos alto-falantes que o caracterizam, é o início de uma ideia de niLL que pode ser trabalhada em série. A ideia é que Maestro se desenvolva em novas missões e vivencie mais histórias em novos ambientes. “Procurei algum símbolo, algo que pudesse representar esse lance de a gente estar saindo agora de novo, da sociedade existindo junto de novo”, conta.

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Em um trabalho que integra música e arte gráfica, a identidade visual explora ferramentas de modelagem 3D misturadas a cenários do mundo real. Para o artista, esse trabalho é ainda um incentivo às novas gerações: “Quero mostrar pra galera das quebradas que a gente consegue trabalhar esse lado da cultura nerd mesmo morando na favela. Tem potenciais aqui de criação, mesmo estando num lugar tão precário”.

O Resgate do Maestro é um marco da evolução sonora de niLL, que, habituado a lançar um álbum por ano, deu uma pausa maior após BLU, lançado em 2021, para estudar e se redescobrir artisticamente. Uma novidade é o uso mais orgânico de instrumentos, com menos samples e mais estudo musical, além das parcerias e colaborações, que diferem do processo mais solitário de produção dos álbuns anteriores.

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Mixado e masterizado por CESRV, produtor e criador do Brime, o álbum teve ainda participação da dupla Deekapz na produção. Nas 12 faixas, niLL retrata a busca por sentimentos e conexões humanas, descrevendo cenários em beats de artistas convidados como Lossio, Bonbap, Pedro Gabriel, MC Luanna, e Duda Raupp, mesclados a linhas de baixo tocadas por ele mesmo, reunindo o máximo de elementos da música brasileira. A intenção é homenagear todos aqueles que contribuíram para a especificidade da sonoridade nacional e que o influenciaram na criação das músicas.

Abrindo o álbum, em parceria com Amiri e produção de Duda Raupp, 3.0 dá o tom da saga de Maestro, falando de sua missão e da reconstrução, de forma intimista. Passando pra Sony, aposta de niLL para agradar seu público usual, o sample único com a introdução do PlayStation 1 é não simplesmente um protesto ao materialismo da sociedade, mas também um incentivo à busca pelas conquistas: “Muitos falavam em dinheiro, o que importa é poder tê-lo”.

O que seria de nós? vem junto com Deekapz e remete de forma esperançosa e leve ao fim da pandemia. Manga & Maçã tem o toque do beatmaker Lossio e retoma o tom de esperança e trata do otimismo de se estar junto, casa cheia, leveza das companhias de pessoas amadas. Reflexiva e motivadora, 18 Horas de Luz relembra o período em que estivemos em lockdown, ao falar da saudade de outros tempos e lugares, de distâncias e conexões a serem construídas. Fechando a primeira parte da jornada do robô, Maestro prepara o ambiente para a segunda parte do álbum.

Com beat charmoso, que reúne baixo pulsante e sax estrelado, Ominipotence fala sobre amor próprio e a importância de amar o que faz, o que já conquistou. Em parceria com MC Luanna, Meia Milha é uma afirmação de protesto diante da amarga realidade enquanto homem preto, que mesmo tendo condições financeiras e ascensão social, ainda é alvo do racismo.

O interlúdio ambientalizador Zero Zero 7 é um house. niLL vem resgatando o gênero que nasceu negro e foi perdendo a identificação até os dias atuais. Ele é um ponto importante do álbum e entra como passagem para Sol, uma parceria com Bonbap, que traz forte sonoridade nordestina, com direito a rabeca e triângulo, em ritmo de baião, fazendo uma crítica aparentemente sutil, porém potente, ao governo durante a pandemia, recordando a fome, o descaso e a subversão de valores da humanidade durante o período.

Com Jota Ghetto e Jamés Ventura, City Hunters aborda mazelas sociais bem tradicionais do rap, como a vida no gueto, violência urbana e policial, drogas e miséria. Simples tem uma pegada clubber, falando de amor, intimidade e desafios cotidianos das relações. É um encerramento em tom sensual e intimista da primeira saga do robô Maestro na Terra.

Fundador da Sound Food Gang, niLL lançou seu primeiro single, “Camurça”, em 2015. De lá pra cá, o MC e produtor nascido em Jundiaí conquistou o reconhecimento da cena nacional do rap com trabalhos que se tornaram clássicos do gênero, como o álbum Regina, das faixas “Nego Drama Pt. II”, “Minha Mulher Acha Que Eu Sou o Brad Pitt” e “Wifi”, e o albúm Lógos, lançado dois anos depois, eternizado pela faixa “Regras da Loja”, que soma mais de 15 milhões de streamings nas plataformas digitais. Em 2021, ano de lançamento do álbum BLU, o artista foi host do podcast “Rap, falando”, com 50 episódios dedicados ao fortalecimento e divulgação da cultura hip-hop, em conversas com artistas como Djonga, Kyan, Tasha e Tracie e Don L.


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niLL mistura sonoridades em álbum que explora relações sociais pós-pandemia