O RPM está de volta – de novo. Famoso na década de 80 por clássicos como Loiras Geladas, Olhar 43 e Rádio Pirata, o grupo formado por Paulo Ricardo (voz e baixo), Luiz Schiavon (teclados), Fernando Deluqui (guitarra) e P.A. (bateria) promete voltar aos holofotes com o novo álbum Elektra, lançado em 20 de novembro.
“Não fazia música há dois anos e estava com medo de passar por um certo bloqueio”, explicou Paulo Ricardo, rasgando seda para o parceiro de composições Luiz Schiavon. “É lindo e inexplicável o que tenho com ele. Escrevemos umas 4 ou 5 letras na mesma noite. Foi uma burrice a gente ter parado”, lamentou o vocalista.
O RPM já passou por cinco reuniões anteriormente – em 1993, 1994, 2001,2003 e 2008 – mas somente agora que o grupo retorna com material novo, após 23 anos sem lançar músicas inéditas com a formação clássica. O grupo começou a ensaiar uma volta definitiva em 2002 quando gravou CD e DVD ao vivo pela MTV, mas logo se separaram novamente. De acordo com o vocalista, o requisito principal para esta nova volta era um trabalho ímpar.
“A escolha do repertório partiu do zero. A prioridade era realizar um trabalho com músicas novas. Para isso, começamos o processo de composição em dezembro de 2010”, explicou Schiavon. Em seguida, o grupo iniciou uma turnê em maio de 2011, no Credicard Hall, em São Paulo. Após cerca de 60 shows que pretendiam fazer jus às megaproduções características do grupo durante os anos 80 (contando com tela transparente em frente ao palco e projeções de luz), o RPM veio com um disco um pouco mais dançante, com forte presença de elementos eletrônicos. Parte dessa nova fase também se reflete no álbum contar com um CD extra, contendo 7 remixes.
“Não estamos numa seara nova, estamos explorando com mais recursos coisas que já tínhamos, usando elementos eletrônicos com outras tecnologias”, ressaltou Schiavon. Paulo Ricardo explicou que os remixes são “mais voltados para as pistas de dança e rádio”.
Em entrevista ao Virgula Música, o grupo contou mais detalhes sobre o novo disco, como está correndo esta nova volta do RPM, entre outros assuntos. Leia abaixo.
Virgula Música – O RPM já parou e voltou algumas vezes. O que vocês acham que está diferente neste novo retorno?
Schiavon – O relacionamento pessoal, o respeito recíproco, a tolerância, a alegria de tocar junto, o amadurecimento, a evolução pessoal. Não só do plano espiritual, mas também como músicos. Isso tudo dá uma segurança, pegamos a estrada de maneira alegre. Hoje subimos no palco para nos divertir. E isso contagia o público. E não é porque estamos no começo da turnê, porque já fizemos uns sessenta shows…
Virgula Música – E já chegou em um nível que vocês não se sentiam mais animados em fazer isso? Quando foi o ápice disso?
Deluqui – Quando demos as paradas anteriores. Em alguns momentos os interesses já não eram os mesmos, e isso é o que geralmente acontece com as bandas e os casamentos. Os casamentos acabam porque as pessoas já não têm os mesmos objetivos. Quando isso aconteceu com a gente, também paramos. Isso aconteceu com os Beatles, os Stones, várias bandas.
Schiavon – Pois é isso, das últimas vezes fomos até onde deu e paramos. Tivemos várias razões, mas no geral era sempre ligado à conceituação musical: o que fazer, para onde ir, como tocar a banda para a frente. Talvez tenhamos parado por não ter uma pessoa que nos indicasse o valor que temos juntos, de como é difícil tocar e fazer sucesso como fizemos um dia. Hoje vemos que paramos com a banda por bobagem, coisa que não faríamos hoje em dia.
Paulo Ricardo – É engraçado, porque antes eu estava passando por um período sem compor, cerca de uns dois anos sem escrever nada. Daí de repente quando nos juntamos, surgiram umas 4 ou 5 letras em uma só noite. Tocar e compor com o RPM é um privilégio, foi muita burrice nossa ter parado com tudo isso por tanto tempo.
Virgula Música – O novo disco tem características bem fortes de toques eletrônicos. Como surgiu esse direcionamento?
Paulo Ricardo – Não é exatamente algo que nunca fizemos antes. Surgimos em uma época na qual o eletrônico começou a tomar conta da cena, com grupos como Kraftwerk e New Order. Além disso, fomos pioneiros no remix no Brasil, com uma versão para Loiras Geladas.
Schiavon – Não estamos numa seara nova, estamos explorando com mais recursos coisas que já tínhamos, usando elementos eletrônicos com outras tecnologias. Acho que temos influências muito semelhantes em relação ao que está rolando por aí hoje. O DJ atualmente é um artista que cumpre o seu papel como atração principal. O David Guetta, por exemplo, é um show completo, o cara é um rockstar. Neste trabalho misturamos a facilidade dançante do eletrônico sem descaracterizar o som da banda.
Paulo Ricardo – Isso, os remixes são mais voltados para as pistas de dança e rádio. Mas o nosso rock característico ainda está ali.
Virgula Música – Vocês já comentaram várias vezes que tiveram grande influência de rock progressivo no início. Mas quais são as influências de agora?
Deluqui – Hoje temos bem menos a coisa do progressivo. Eu praticamente não tenho escutado música de outros artistas. Pra você ter uma ideia, no meu Ipod eu tenho umas 600 músicas, e acho isso muito pouco, sou muito seletivo. Eu prefiro o silêncio. Eu escuto o Muse, mas não sou um pesquisador de música. O que eu acho super bacana do RPM é que não copiamos as bandas de fora. Fazemos o que gostamos, nos reunimos, tocamos e sai legal.
Schiavon – Especificamente sobre o progressivo, tínhamos mais influência no início da carreira. Nos distanciamos disso ao longo do tempo e hoje temos muito claro que música está muito ligada a celebração. Não é aquela coisa contemplativa como era na década de 70, como era no auge do progressivo. Nosso show é uma festa, o pessoal dança e pula. Mas isso não impede que a música tenha conteúdo; pode ser uma música boa de dançar, ter um bom arranjo, uma boa letra, ser bem construída e bem tocada. Acho que estamos bem para esse lado e assimilamos um pouco de motown, de dance, música eletrônica atual. Acho que estamos mais influenciados por isso.
Virgula Música – Uma estrofe da música ‘Muito Tudo’ diz “é muita informação e pouco conteúdo”. Parece uma crítica, mas sobre o que isso se refere, exatamente?
Paulo Ricardo – É uma comparação aos tempos de quando começamos com o que temos agora, com a internet. Quando começamos, a informação era muito escassa. Não tínhamos internet e nem MTV, então para ouvirmos coisas novas tínhamos um verdadeiro contrabando de informações: era revista, troca de cartas. Hoje em dia, isso mudou muito, está tudo à disposição na internet. Pra gente, é uma ferramenta útil. Colocamos as faixas novas no site e as pessoas já podem ouvir. Mas nós não achamos que essa revolução tecnológica representou necessariamente um upgrade para a música na questão da criatividade. Prova disso são as bandas dos anos 80 que são consideradas clássicos (tanto nacionais quanto internacionais) e a internet facilita o acesso para a garotada. Hoje em dia com programas como o Garage Band é fácil gravar um disco em casa, mas isso não quer dizer que a qualidade tenha aumentado. Existe um pouco de uma cobrança, principalmente em cima de mim, para que tenhamos letras políticas. Já fizemos coisas assim antes, porque tínhamos recém saído de uma ditadura e aquilo na época era pertinente. Hoje em dia o foco é outro, acho muito delicado criticar um governo que já teve mais de 80% de aprovação. Hoje os questionamentos são mais internos, questões éticas de cada um. Só porque se tem muita informação não significa que tem muito conteúdo. É muita coisa, você não tem tempo de filtrar o que tem mais profundidade. Não tem condição um cara sair da faculdade e não saber escrever direito. Vocês jornalistas devem estar presenciando este triste e trágico evento; houve demissão do pessoal de mais tempo de carreira e que tinham salários mais caros para contratação de uma garotada com linguagem de internet. Então essa música toca também nesse tipo de assunto. Eu não tenho mais saco pra política, mas eu tenho que dizer que o mundo tem que ter qualidade e foco.
Virgula Música – O que vocês acham que vale a pena na música nacional agora?
Schiavon – Eu vou ser bem sincero: eu acho que esse boom tecnológico todo abriu a porteira para um monte de lixo também. Mas o mercado se auto-ajusta. De repente você vê uma surpresa como o da Maria Gadu, que é difícil, complexo, não tem nada a ver com sertanejo. É extremamente bem-elaborado e um sucesso de público. Isso me indica essa visão, me dá a sensação de que temos muita bobagem, mas que quando aparece alguma coisa de qualidade, acaba se sobressaindo e tendo um destaque natural. Acho que isso também aconteceu com o Diogo Nogueira, que não é realmente novo, mas é um grande cantor. No meio dessa bagunça da ebulição da internet, o que é ruim esfria. Mas não podemos ser preconceituosos e considerar que só música de elite é boa. Dentro do universo sertanejo tem muita coisa de qualidade também. Sem falar da música e do gênero, mas acho o Luan Santana um tremendo performer. Já vi um show dele uns três anos atrás e ele tem um domínio de palco de gente experiente. E tudo isso de uma maneira bem instintiva: ele canta com absoluta perfeição, corre pelo palco inteiro e não se cansa. Não é porque não gostamos do gênero que vamos jogar pedras.
Virgula Música – Falando em ‘jogar pedras’, a polêmica da vez é o Lobão versus Lollapalooza Brasil. Vocês já foram convidados pra tocar em um festival com atrações internacionais e passaram por essa situação de tocar em horários considerados desprivilegiados?
Schiavon – Esse caso do Lobão eu não tenho completa noção de como ocorreu. Mas nos grandes festivais lá da década de 60, como Ilha de Wright, Woodstock, teve gente que começou à tocar às 9 da manhã. O Jimi Hendrix tocou às 11h! Qual o problema? Tudo bem, o Lobão não quer tocar às 10 da manhã porque dorme tarde e não quer acordar cedo. Será que é isso mesmo? É difícil saber o real motivo. Talvez ele não tivesse concordado com a atração que tocaria depois dele, algo assim. Fazer um julgamento agora sobre isso seria uma coisa leviana. O Lobão é um cara inteligente pra cacete, é meu amigo, e imagino que ele tenha os motivos dele pra recusar. Mas acredito que aqui no Brasil o pessoal é muito preconceituoso com essa história da sequência das apresentações. Na época da morte do Freddie Mercury, em homenagem ao Queen, fizeram um show especial e o Rod Stewart entrou no palco às 15h. E quem foi tocar às 21h nem era tão conhecido. Acho que quem faz estes eventos está mais preocupado com a sequência de produtos, de eventos, do que se o artista merece tocar naquele horário ou não.
Virgula Música – Com o RPM então não teria problema tocar no mesmo horário proposto ao Lobão, por exemplo?
Schiavon – Pelo horário não. Pelo contrato, talvez.
Deluqui – Nos adaptaríamos. Mas se houvesse condições injustas, também não daria.
Schiavon – Pra mim tá muito mais relacionado às condições do que pode ser feito do que pelo horário. Não vejo problema em tocar às 10h, eu costumo acordar às 7h (risos)!