Há algo de novo nos Detonautas. Os garotos tatuados que apareceram com o hit Quando o Sol Se For estão mais maduros, e talvez, isso não seja o efeito de alguns anos na estrada, e sim, o efeito da realidade.
Retorno de Saturno é o primeiro disco gravado pela banda depois da morte do guitarrista Rodrigo Neto, morto numa tentativa de assalto no Rio de Janeiro, em junho de 2006.
A primeira faixa, que dá nome ao disco, já mostra que a banda amadureceu melodicamente. Com um riff contagiante, a música tem tudo pra ser hit.
Na sequência, Nada é sempre igual, uma música que fala de amor, e Verdades do Mundo, faixa na qual Tico dialoga com o amigo perdido na guerra urbana do Rio, começando a música com o verso “Te encontro nas ruas, até de olhos fechados (…)”.
O amor é o tema principal do disco, sendo discutido em todas as faixas. É da música Só Pelo Bem Querer um dos melhores, senão o melhor, verso do disco. “O amor é o desejo de encontrar alguém que viva sinceramente a liberdade de amar alguém só pelo bem querer”.
Lógica é outra canção com cara de hit, que traz sintetizadores contagiantes no refrão e uma letra que questiona a lógica dos caminhos que cada um de nós seguimos mundo afora.
Tanto Faz e Soldado de Chumbo são duas das melhores músicas do álbum, esta última com um final divertido, apesar do último verso “eu não tenho mais vontade de te amar”, seguido de aplausos.
O amor dá espaço ao ativismo político e social do grupo em duas faixas: “Enquanto houver, uma canção leve, com versos como “meu amor/ enquanto isso no Congresso/ eles roubam o país” ou “eles não querem o futuro da nação”, e Eu Vou Vomitar em Você, na qual a base – e o refrão – da música Aa Uu Licença poética ou vontade de fazer a sua Aa Uu? Vai saber.
Apesar de mais sérios, a banda continua fazendo uma música facilmente abraçada pelo mercado, mas aposta também em canções mais difíceis, como é o caso de Ensaio Sobre a Cegueira – sim, nome do livro de José Saramago. A música tem aproximadamente oito minutos de duração e abre espaço para o poeta Edu Planchêz recitar uma de suas poesias, “Filhos da Morte Burra”.
O time do Detonautas continua o mesmo: Fábio Brasil (bateria), Tchello (baixo) DJ Cleston (percussão, scratches e efeitos), Renato Rocha (violão e guitarras) e Tico Santa Cruz (violão e vocais). Mas definitivamente, há algo diferente no ar.
Apesar das composições de Tico Santa Cruz terem ganhando uma nova cara de uns tempos pra cá – as letras estão cada vez mais abstratas e sérias, chegando a ser levemente pessistas em alguns momentos – é um pouco pretensioso comparar seu atual trabalho com o de Renato Russo, como sugere o texto de apresentação do disco.
O clima de Retorno de Saturno é de melancolia e angústia, seja pelo que já aconteceu, pelo que não vai ser diferente, ou pelo que ainda vai acontecer. Algumas bandas descobrem o seu melhor depois de experiências trágicas. Pode-se dizer, que esse é o caso do Detonautas Roque Clube, que subiu dois degraus, de uma longa escadaria.