Vencedora, pelo segundo ano consecutivo, da etapa brasileira do Red Bull Thre3style,Cinara Martins conquistou seu espaço em um meio dominado por homens, como tantos outros.
Após ter carimbado sua participação em umas das principais competições de DJs do mundo, a paulistana conversou com a gente sobre diversos assuntos, entre eles a batalha contra o machismo. “Demorei para conquistar meu espaço e fazer com que as pessoas me reconhecessem por realmente tocar e não por ser uma DJ mulher”.
No Thre3style, os competidores têm de tocar três estilos diferentes. Após passar por Baku, no Azerbaijão, em 2014, este ano as finais serão em Tóquio.
Em que momento da vida soube que seria DJ profissional?
Cinara Martins – Que eu realmente seria, soube quando recebi o meu primeiro cachê em uma balada chamada Mood em 2005. Mas tive certeza que era com isso que gostaria de trabalhar quando encostei pela primeira vez nos toca discos, lembro que estava o disco da Mary J – Family Affair de um lado e Pharrel- Frontin do outro e de eu ter ficado indignada ao saber que o BPM da Frontin era maior, porque me parecia uma musica mais lenta que Family Affair e fiquei dias com isso na cabeça tentando entender.
Sente que a pressão sobre uma mulher é maior? O meio dos DJs é machista?
Cinara – É um pouco relativo porque em partes ajuda e em partes dificulta o lance de ser mulher. Acaba sendo um diferencial por terem poucas verdadeiras DJs, mas, por isso, demorei para conquistar meu espaço e fazer com que as pessoas me reconhecessem por realmente tocar e não por ser uma DJ mulher.
Ano passado, recebi algumas críticas machistas quando ganhei o campeonato, totalmente sem argumentos, algumas pessoas que não concordaram com a minha vitória somente pelo fato de ser mulher. A impressão que tive foi que nem se deram ao trabalho de ouvir meu set porque não explicavam exatamente porque eram contra.
Uma coisa que me incomoda muito é que hoje em dia existem muitas “fakes” (falsas DJs que usam a imagem para se promover) e isso dificulta o trabalho que as verdadeiras tem para ganhar respeito, então sempre que posso faço questão de mostrar a diferença.
De que maneira considera que seu trabalho e de outras mulheres possa contribuir para que surjam outras mulheres e de que isso seja um ponto de apoio na luta pela igualdade de gênero?
Cinara – Hoje em dia existe uma confusão sobre o que é ser um DJ, pessoas acordam de um dia para o outro e resolvem se autonomear um(a). Acho importante mostrar que não é uma coisa tão simples, fico feliz com quem sente vontade de se tornar um(a) DJ, mas admiro quem corre atrás para aprender, pesquisar e treinar.
Se alguém próximo diz que tem vontade de aprender, faço questão de passar horas falando sobre e ensinando o que puder, mas isso se eu realmente sentir que existe o interesse. Muitas vezes percebo que esse interesse não passa de status e curtição de balada, nesse caso procuro explicar que ser DJ não se resume a isso.
Falsos profissionais existem e infelizmente sinto que entre as DJs mulheres esse numero é maior. Acho que o mais importante de inicio é mostrar o que um DJ faz e a partir daí fico feliz em ajudar para que as mulheres percebam que sim, a gente também pode chegar lá com talento, sem precisar usar imagem para chamar atenção, modelo é uma coisa, DJ é outra.
Antes das finais no Azerbaijão, no ano passado, circulou uma notícia que você só tocaria músicas de mulheres, por que mudou de ideia?
Cinara – Eu gostaria muito mesmo de poder fazer isso! Mas por mais que não pareça (por ser um set de apenas 15 minutos) é MUITO trabalhoso e exige tempo. Preciso de meses para bolar um set no estilo Thre3style e precisaria do dobro de tempo se eu me limitasse a usar somente musicas de mulheres… por isso infelizmente por enquanto fica como uma vontade guardada, mas uma hora ainda faço um!
Como será sua preparação para a final e quais foram os maiores ensinamentos que trouxe na bagagem de Baku?
Cinara – Esse ano quero levar dois sets diferentes, ano passado finalizei o meu super em cima da data da viagem e quando ganhei a eliminatória la e fui para a final, precisei me prender no quarto uns dois dias para desmontar o set e criar coisas novas no meio para que não ficasse repetido e isso foi ruim porque além de ter perdido os passeios e não ter acompanhado as noites da competição, tive muito pouco tempo para treinar o que havia mudado, então quero ir mais preparada esse ano.
Os jurados e DJs convidados do evento faziam palestras sobre vários assuntos, inclusive sobre o campeonato e diziam o que eles procuram, com certeza vou lembrar dessas informações na hora de criar meus sets para o Japão.
O Japão é o país do colecionismo e dos discos raros, acha que a atmosfera do país irá favorecer à música brasileira?
Cinara – Estou na fase de pesquisa sobre a cultura musical, pergunto para amigos que moram ou já moraram por lá o que costumam ouvir nas baladas. Até agora pelo que sei, existe uma apreciação grande por hip hop e por ser o estilo que eu mais gosto acaba se destacando nos meus sets, então fiquei feliz com a notícia. A música brasileira sempre é bem aceita por ter um suingue especial, e eu acho legal quando o DJ mostra um pouco de como é a musica do seu país, por isso com certeza no meu set usarei elementos daqui.
Quais são as (os) DJs que mais gosta na atualidade e indica?
Cinara – Sempre tive como maior referencia DJs daqui por serem os que acompanhava pessoalmente. Curtia muito o Jason Salles porque ele sempre sabia conduzir vários tipos de público e usei bastante o trabalho dele como referência no inicio.
Atualmente, tenho curtido muito o set do Pedrinho Dubstrong, Nedu Lopes, Zegon, KL Jay, tive oportunidade de ouvir ao vivo alguns Djs que admirava de longe como o Q-Bert, Skatch Bastid, Jazzy Jeff, entre outros. Entre os DJs que estão se destacando, que tenho acompanhado e indicaria facilmente, está DJ Mass, de SP, e D.Jaka, de BH.
Quais são as top 5 tracks que você têm mais tocado?
Cinara – Tropkillaz – Baby; Karol Conka – Tombei; Silento – Whatch me; Familia Madá – Cristal e Omulu – Bate Bola.
Em casa, você ouve os mesmos sons que toca na pista, mande seu top 5 pra ouvir em casa no momento?
Cinara – Normalmente, não. Acabo ouvindo o que toco porque estou sempre selecionando e atualizando minhas músicas, algumas estão na minha playlist pessoal, mas pra relaxar mesmo ouço músicas mais calmas, sou fã de R&B, gosto dos 90’s, neo soul e atuais alternativos. As top 5 (na ordem) que tenho ouvido são: Goapele – Closer (para o momento que estou vivendo, risos); Majid Jordan – Her; Drake – Energy; The Internet – Dontcha e Kingdom – Bank Head ft Kelela.
Que disco raro gostaria de encontrar no Japão?
Cinara – Por motivos pessoais (mudanças de casa), minha coleção de discos atualmente esta pequena. Quando me estabilizar novamente em um lugar quero voltar a comprar mais. Não resistiria se encontrasse um do Alton McClain & Destiny – It Must Be Love, que não chega a ser raro, mas nas buscas que fiz por aqui não achei.
Essa música me lembra quando ouvia uma coletânea de funk da minha mãe e eu sempre ia direto nessa faixa. Aliás, se um dia achasse essa coletânea novamente seria lindo! Me lembro perfeitamente da capa mas não do nome =/
E também qualquer um da Alliyah que encontrar, com certeza volta comigo na mala.