Morrissey se apresenta na Fundição Progresso, no Rio de Janeiro - 09/03/2012
Créditos: Felipe Monteiro
Morrissey é adorado como um Deus, e sabe disso. Dono de uma das vozes mais características da história do rock, o ex-vocalista do The Smiths seguiu a turnê brasileira nessa sexta-feira (9) no Rio de Janeiro e, num calor digno do verão carioca, mostrou porque ainda é ídolo de tantos, mesmo aos 52 anos.
Se os Beatles popularizaram a estrutura da atual música pop nos anos 60, os Smiths abriram caminho para a revolução do rock alternativo e do britpop nos anos 90. Não é exagero dizer que se Morrissey nunca tivesse se juntado ao guitarrista Johnny Marr, bandas como Pulp, Blur, The Stone Roses, Oasis ou Radiohead não existiriam, ou se existissem, certamente não seriam as mesmas. E foi assim, com esse espírito de Messias, que Morrissey foi recebido no Rio de Janeiro.
A exemplo do que aconteceu em Belo Horizonte na última quarta-feira (7), o show de abertura de Kristeen Young não empolgou. Ela tentou, se entregou, se balançou, e os cariocas até aplaudiram, mas a estrela maior da noite ofuscou a inglesa, deixou o palco da Fundição Progresso timidamente.
Após uma ótima seleção de vídeos montada pelo próprio Morrissey – que ia de Shocking Blue a Françoise Hardy, passando por Nico e The Sparks – o cantor entrou no palco acompanhando pela banda de apoio, quase toda vestindo apenas uma sunga amarela (a única exceção foi o guitarrista Boz Boorer, de peruca comprida e um vestido azul com paetês).
“E aí, galera?”, cumprimentou o inglês em um português desajeitado, antes dos primeiros acordes de First Of The Gang To Die, que abriu a apresentação. De unhas amarelas e camisa vermelha, Morrissey cumprimentava os fãs mais exaltados na grade, mas em momento algum esboçou um sorriso sequer.
Na sequência vieram You Have Killed Me e a dupla Black Cloud e When Last I Spoke To Carol – do ótimo Years Of Refusal (2009), o álbum mais recente do cantor – que surpreendentemente levantaram o público.
A bela Alma Matters gerou o primeiro grande coro da noite, mas foi com Still Ill, a primeira versão de The Smiths do show, que a plateia se entregou de vez a Morrissey. Com a camisa ensopada de suor, o vocalista se retorcia em movimentos elegantes e gentis, imitados incessantemente pelos seguidores que lotaram o lugar, derretidos pelo refrão de Everyday Is Like Sunday.
À sua maneira, Morrissey elogiou a cidade maravilhosa – “Decidi fazer uma caminhada pelo Rio, e todos são muito bonitos. Todos os três sexos” – e alertou para a presença do Príncipe Harry no país. “Ele veio pegar o dinheiro de vocês. Por favor, não dêem”, pediu.
A densa Meat Is Murder, também do The Smiths, encerrou a primeira metade do show, e deixou boa parte da plateia em choque. Com as fortes luzes vermelhas e as explícitas cenas de animais torturados em abatedouros no telão, pouca gente aplaudiu a primeira saída do cantor do palco.
Morrissey voltou de camisa branca em Ouija Board, Ouija Board, mas a tirou – para delírio dos presentes – em Let Me Kiss You. Atirada para a plateia, a blusa foi motivo de confusão na beira do palco, e até os seguranças do local evitaram se envolver na briga insandecida pela roupa do ídolo.
Daí para frente, o jogo estava ganho. Com uma sequência arrebatadora de sucessos do The Smiths, Morrissey não deixou uma única alma de boca fechada, apesar de se mostrar bem menos interessado pelos sucessos de sua ex-banda do que pelas composições de sua carreira solo.
Destaques para o coro do público em There Is a Light That Never Goes Out, para o arranjo simplista e delicado de Please, Please, Please Let Me Get What I Want e para a potente versão de How Soon Is Now?. Entre elas, apenas as intrusas I’m Throwing My Arms Around Paris e One Day Goodbye Will Be Farewell, que fechou a noite.
Se Morrissey não supreendeu no setlist, o mesmo do show de Belo Horizonte, também não desagradou. Por volta das duas da manhã, quem saía da Fundição Progresso tinha a certeza de que, sem Morrissey, o rock seria bem menos inteligente, e definitivamente menos interessante.
A turnê do cantor pelo país se encerra em São Paulo, no próximo domingo (11). Todos os ingressos estão esgotados.