Um dos maiores intérpretes da história da música brasileira, Cauby Peixoto gostava de Luan Santana e, na intimidade, falava pouco e baixo. Ao lado do ídolo que morreu no domingo (15) aos 85 anos, o tecladista e arranjador Jair Garcia Sanches via o “chefe” como uma espécie de guru.
“Como pessoa, além de um grande cantor, é um grande amigo, sabe? É uma escola da vida, o Cauby é uma escola da vida. Tudo que você falar para ele sobre qualquer coisa da vida ele tem uma resposta. E fala baixinho…”, disse ao Virgula no Bar Brahma, em 2014. A temporada de Cauby completou 13 anos em 2016.
Sobre os ensinamentos de Cauby, ele não conseguia identificar o maior. “Rapaz, é muita coisa. Convivendo com ele você vai aprendendo a ficar calmo. Se alguém te atacar, você não fica nervoso, você aprende a manter sua personalidade”, avaliou.
Musicalmente, Sanches revelou que o improviso do jazz foi totalmente assimilado pela personalidade musical de Cauby. “Ele valoriza muito as notas quando vai cantar, com ele fica tudo diferente”, defende. “Se ele cantar a mesma música cem vezes, vai sair cem vezes diferente. É tudo improvisado. Ele é muito criativo, muito musical”, constatou.
Já o saxonista e flautista Marcelo Monteiro lembrou do “professor”. “Ele era uma pessoa super carinhosa, simpática com todos, principalmente com seus fãs, e ele sempre ressaltava isso, tratar bem os fãs. Ele costumava chamar os músicos de professor e às vezes os músicos também o chamavam de professor. Ele gostava muito de cantar e o palco era seu lugar preferido”, afirmou.
O músico destacou também a vontade que Cauby tinha de cantar. “Às vezes, nos ensaios, o ensaio já tinha acabado e ele queria continuar cantando. Um verdadeiro artista”, resumiu.
Marcelo, que lidera seu próprio grupo de música instrumental, esteve com em suas últimas apresentações de Cauby, no Theatro Municipal do Rio, nos dias 2 e 3 de maio, ao lado de Angela Maria. “Foram dois shows lotados”, lembrou.
Acostumado a protegê-lo, o segurança Valdenir José de Lima, contou que uma de suas missões mais difíceis foi um tanto prosaica, quando o cantor pediu sua ajuda parar dar um nó na sua gravata: “A gente fica meio assim, pelo mito que ele é, fui dar o nó e suava”, disse, em 2014.
Cauby Peixoto
Créditos: Gabriel Quintão
Quase um monge, Cauby sabia que não havia mais para onde subir, ecoando a Conceição da famosa música e cantava para permanecer mito. “Manter, manter o nome, manter o cantor, para não deixar o público esquecê-lo. Então, eu canto para isso mesmo”, resumiu ela na ocasião, sobre o que o motivava a cantar em idade avançada.
Para ele, que gostava do sertanejo pop Luan talvez por se identificar com a própria juventude, quando começou a cantar aos 16 anos escondido atrás de pilastras em boates no Rio, magro e tímido, um artista popular deve saber ouvir a voz das ruas. “Deve estar de acordo com o gosto do público, o público pede as canções desse cantor e quando ele canta sai tudo bem”, avalia, antes de completar. “Precisa ter voz, precisa ter um bom repertório, cantar sucessos, como eu faço e tal.”
Ele sabia também ser uma espécie de último dos moicanos. “Olha, seguidor assim, de estilo, não. Porque nós cantamos coisa assim, antigas, coisas de voz, românticas, tem aí cantores de samba e tal, músicas de momento. Mas o meu estilo é difícil, é difícil. Eu estou cantando estilo de Orlando Silva, Sílvio Caldas, Nelson Gonçalves, entendeu?”, listou.
Quando a reportagem perguntou se essas são suas influências, ele sorriu. “São, exato. Ciro Monteiro, Gilberto Alves, cantores maravilhosos da minha época”, disse.
“Voz é voz. São poucas vozes bonitas, bem colocadas e tal”, completou. Poucos, no mundo, tiveram a voz de Cauby.