Dez coisas que talvez você não saiba sobre Arnaldo Baptista
No ano em que Lóki seu primeiro álbum solo completa 40 anos, Arnaldo Baptista continua sendo expressão da “saudade do futuro”, na sua própria definição da sua personalidade visionária. Em entrevista exclusiva ao Virgula Música, o multi-instrumentista conta que tem 14 músicas gravadas para um disco de inéditas.
O trabalho, que se chamará Esphera, será o sucessor de Let It Bed, de 2004, álbum que marcou o retorno do músico que ajudou a escrever a história do rock mundial com Os Mutantes.
Alto astral, cheio de gás e dividindo o tempo entre a música e a pintura, Arnaldo vem fazendo uma série de shows pelo Brasil com o nome de Sarau o Benedito. O próximo será no dia 3 de agosto no Cine Theatro Brasil, em Belo Horizonte (compre aqui). Por telefone de seu sítio em Juiz de Fora, ele falou sobre a carreira solo, Os Mutantes, o disco novo, extraterrestres e outros assuntos.
Você está voltando a fazer shows? Você fez um show ontem (dia 6).
Sim. E ontem foi meu aniversário.
É verdade, parabéns. Até o (Gilberto) Gil te deu parabéns no Facebook.
Ah, que maravilha. Agora vai ter outro no Cine Theatro Brasil que vai ser legal. Em BH, vai ser bom.
E como estão sendo os shows, você está mostrando músicas novas, do seu disco inédito?
Eu estou fazendo o possível, quando dá pé, eu faço uma ou outra. E tem dado no pé nos últimos shows, que a inspiração pinta e eu canto uma ou outra.
E como é seu processo de composição musical, Arnaldo?
É uma pergunta muito interessante que até eu faço pra mim, às vezes. Que às vezes eu fico inspirado por um motor de automóvel ou por uma menina linda, cada hora é uma coisa, uma flor. É difícil ter uma ideia do que me inspira.
Mas geralmente é uma espécie de motivação que tem a ver com a evolução e com o sentir-se bem.
Você trabalha primeiro a melodia e depois a letra ou não tem uma ordem?
Geralmente, eu escrevo a letra e ponho uma cifra na letra. Eu boto a harmonia e passo pro piano pra ver se encaixa.
No documentário Lóki você fala sobre uma música que consiga irmanar as pessoas, ser entendida por todo mundo…
Isso é um sonho que às vezes eu penso em várias coisas para conseguir. Não tem fim, de fazer cinema com cheiro… Não tem jeito de pegar todo mundo.
O seu disco Lóki vai fazer 40 anos, qual é a importância dele pra você dentro da sua discografia?
Foi uma espécie de, vamos fazer um paralelo, de uma semente de um tipo novo de vida que eu estava enfrentando. Então eu queria plantar, adubar bem e ver o que ia acontecer. E tá acontecendo o inesperado. Eu posso até falar “lucky”, do inglês, ou sorte. Que fizeram um filme, né? Eu não tinha ideia que ia acontecer isso. Eu tô contente.
E as suas músicas novas? Você tinha feito uma música com Fernando Catatau (I Don´t Care) e agora você está pensando em juntar tudo em um álbum?
Eu tenho uma memória esquisita, não sei quantas músicas estão gravadas. A Lucinha, minha menina, tinha me dito ontem que eram umas 14. Está mais ou menos assim. De acordo com a inspiração eu gravo mais uma época, mais outra.
Quando estou mais ligado em bateria gravo mais as que levam adiante a bateria. E assim por diante, guitarra, contrabaixo, teclado.
Var se chamar Esphera?
Vai sim.
O que é essa Esphera?
É interessante, é o tipo de coisa como Sarau o Benedito. Pode de uma “esphera” de esperar ou um globo onde eu entrei quando eu me atirei e me salvou. Eu fui salvo da queda por uma fada almofada. É um trocadilho que eu inventei.
Arnaldo você tem muitas músicas. Na sua avaliação quais são as suas preferidas, as que você acha que atingiram um nível mais profundo?
Eu vou citar várias. Uma é a música Lóki, a outra é Emergindo da Ciência, outra é Honky Tonky, onde eu dou tudo de mim no teclado. Penso que é mais ou menos isso. E a Balada do Louco também.
Você sentia falta do palco, da energia do público?
Isso me dá uma energia muito importante, eu aprendo a cada dia que passa um pouco. Em um show eu tenho um piano horrível, em outro eu tenho um piano maravilhoso, em outro eu tenho um amplificador perfeito. Então a gente evolui no sentido de tentar mostrar o bem e fazer as pessoas e entenderem porque é o bem.
Por exemplo, às vezes eu penso que eu não tenho importância, se eu tô certo ou errado. Onde eu pertenço, eu estou certo, é uma frase do John (Lennon). Por exemplo aqui em casa, todos os amplificadores são valvulados, então eu não tenho preocupação com nada nesse sentido. É onde eu pertenço.
Mas isso tem que se expandir. Eu estou pensando até em criar, não sei como vai ser, uma associação dos possuidores de amplificadores valvulados. Não tem clubes de ex-juízes, clube de tanta coisa? Pode ser que eu consiga, não sei ainda.
Como que o equipamento se relaciona com a transmissão da música. Se você olhar assim, ele é só uma máquina, mas você acha que elas são capazes de passar um sentimento também?
Ah é. Eu chamo equipamento valvulado de equipamente. Que é num sentido de pesquisa, eu vou me interessando por cada amplificador. Cada marca tem uma especificação diferente, um tem mais grave outro tem mais médio, outro tem mais “punch”, que alcança. Então a profundidade do meu som é algo complexo, difícil, mas eu espero fazer com o que me agrada, alcance o público também. Por enquanto, eu ainda tô fazendo show com piano e voz, que aí não aparece tanto o amplificar valvulado. Mas eu vou fazer isso no futuro com um P.A. (caixas de som que ficam voltadas para o público) valvulado. As coisas vão acontecendo.
Quando você gravou o Lóki, você optou por um trio sem guitarra?
Exato.
Você pretende voltar a essa formação?
Não. Eu naquela época e durante toda a minha vida eu, curti muito Zimbo Trio, Oscar Peterson, Jimmy Smith, então nesse sentido no Lóki o piano tem um alcance maior que a guitarra, que não tem tanto grave, maior que o baixo, que não tem tanto agudo. Eu botei num sentido de teclado, a maior parte. Mas de agora em diante eu vou fazer comigo tocando guitarra. Naquela época eu queria provar também que eu não precisava de guitarrista.
Muita gente vê a maior revolução dos Mutantes, o fato de você terem feito um rock brasileiro. Qual foi o segredo para que vocês conseguissem fazer uma coisa que fosse além de ficar imitando as caras de fora?
É uma coisa bem profunda. Envolve o fato de que meus pais eram músicos, minha mãe concertista tocou em Viena, com orquestra, papai escreveu quatro livros, era poeta, além de cantor. Então, no sentido de aprender, a nossa música possuía um conteúdo profundo no sentido de harmonia, de literatura. Essa coisa que fez o nosso tocar ir além do rock and roll, como os Jet Blacks faziam, e muita coisa assim, que não eram totalmente profundas.
E além disso a gente se envolveu com pessoas como Caetano, Gil, Ronnie Von. Então a gente fazia isso, ia surgindo, acontecendo.
Você acha que poderia surgir uma nova banda como Os Mutantes hoje no Brasil?
Ah, isso é muito difícil de prever, né? Por exemplo, eu li em algum lugar que o The Mamas and The Papas, se encontraram fazendo um show de improviso lá em San Francisco, eles se encontraram no palco e deu certo. Ninguém pode prever como se forma um conjunto. No Woodstock, o Crosby, Stills & Nash falou que era a segunda ou terceira vez que eles estacam tocando.
Mas vamos ver o que acontece.
Como é que sua pintura e sua música se relacionam?
Isso me perguntam muitas vezes e eu fico meio sem saber o que falar. Eu respondo geralmente assim, que as artes plásticas vêm desde a época da pedra lascada. Então tem milhares de anos de memórias genéticas que a gente tem pra pintar. Agora a música vem lá de Bach, de mais ou menos uns 400 anos atrás.
Mas sempre tem uma coisa que une as duas, que é o quanto a gente consegue ser bom.
O que você espera que as pessoas sintam quando ouvem a sua música, quando vão no seu show?
Elevação.
No sentido de transformação?
Uma coisa parecida, mas elevação pode ser de vários tipos, tipo mística, tipo psicodélica, de som. É interessante isso.
Como que é pra você ver que o que você plantou lá atrás e que fez com que você fosse taxado de louco hoje é entendido e você é chamado de gênio.
É uma coisa que eu chamo de saudade do futuro. Mas num sentido assim de realização. Eu já vi um disco voador, né? Uma vez só, faz um ano mais ou menos. A minha mãe tinha visto um disco voador, há uns 40 anos mais ou menos, me contou e eu não acreditei. Por isso que eu não falo muito a respeito. Mas em função de evolução, já pensou o que essas pessoas possuem, em matéria de misticismo, religião, medicina, tecnologia? E eles estão lá ultrapassando a luz, talvez.
Nesse sentido, eu fico imaginando o que a gente pode alcançar ainda. E é isso que eu ponho na música, às vezes.
E você acha que os caras, os extraterrestres, eles aparecem só para quem está em um nível mais elevado?
Tem gente que diz que nós somos em relação aos ETs como formigas. Então, eu me pergunto, você já tentou conversar com uma formiga? É por isso que eles não entram aqui. Talvez seja isso.
Você vive em um lugar paradisíco em Juiz de Fora que tem um monte de verde, de bichos O que você acha que ganhou com essa vida mais em contato com a natureza?
É uma coisa que envolve inspiração, motivação. Além do fato de que quando eu estava em São Paulo, eu morava em um apartamentozinho lá em Pinheiros. Não era tão pequeno, mas se eu punha um amplificador de 40 watts alto, o porteiro telefonava: “Tá muito alto”, berrando. Então aqui em casa posso por mil, dez mil, ninguém liga, né? Então isso é muito bom.