Pedro Gallego Laura Wrona

Mais experimental e eletrônica que em seu EP anterior, R.H. Volcano, lançado há quatro anos, a cantora Laura Wrona faz show de lançamento do seu primeiro álbum Cosmocolmeia no dia 18, no Sesc Belenzinho.

O disco foi composto durante um período em que Laura se aproximou do universo das abelhas. Nele, Laura trafega por gêneros como o synthpop (Primeira Vez, Nuvens Anônimas), rap (Autoclave), faz dançar na versão remixada de Ocupado Tem Gente e traz faixas já conhecidas do público que a acompanha, como Pobre Pantera e Comunhão de Bens.

Cosmocolmeia foi produzido em parceria com Thiago Nassif e com participações de Edgard Scandurra, Juliana Perdigão e Guilherme Kastrup. No show, ela recebe as participações especiais de Silvia Tape e Tata Aeroplano. Leia a entrevista concedida por Laura em que ela fala sobre vários assuntos, entre eles a questão do empoderamento feminino: “Acredito na força que inclui a delicadeza, a gentileza e o afeto”.

Na sua opinião, de que maneira a estrutura social das abelhas pode ser vista como inspiração para a organização coletiva?
Laura Wrona – A colmeia sempre teve um forte simbolismo como utopia de sociedade perfeita. Mas essa comparação pode ser perigosa se levada ao pé da letra, pois não podemos esquecer que a fazemos da perspectiva da política, que não existe na organização dos insetos.

Um aspecto que me inspira é a cooperação que há entre elas dentro da noção de organismo interdependente, algo que em, tempos de intolerância como o que estamos vivendo, é essencial de se resgatar. Quando olho para as abelhas, no microcosmo dessa existência como insetos e penso na raça humana e sua multiplicação frenética, sinto que todos estamos buscando de certa forma, luz, amor alimento e conforto. Cada indivíduo na colmeia tem um papel fundamental para o benefício do grupo e isso inspira a prática da colaboração, já que nosso “piloto automático” é a competitividade, muito mais estimulada na sociedade em que vivemos.

Como se envolveu pessoalmente com a apicultura e qual foi a importância para sua música?
Laura – Meu envolvimento começou a partir de um sonho em que me vi com asas translúcidas, cercada de pessoas com as mesmas características e quando acordei me dei conta de que o ambiente do sonho remetia a uma colmeia. A partir desse momento passei a prestar mais atenção e quando tive contato com um livro do filósofo e educador austríaco Rudolph Steiner (Apicultura A Partir do Respeito Pela Vida), isso se tornou uma espécie de obsessão.

Fiquei anos com o assunto pairando em minha mente até que resolvi me aproximar de fato, na busca por compreender que atração era aquela. Fui morar um período no interior e passei a visitar apiários, pois a princípio queria me tornar uma aprendiz. No meio desse processo senti que a abordagem poderia ser mais poética e pessoal, através da criação artística e trouxe o tema para o disco que já vinha pensando em realizar desde o primeiro EP (R.H. Volcano, 2012). A importância maior foi ter trazido a paixão por um assunto e o impulso de desvendá-lo. Apaixonar-se por algo ou alguém é sempre inspirador.

Em que cidade do interior paulista morou durante o processo de composição e de que maneira esta vivência se materializou no disco?
Laura – Morei em Cunha, que fica entre São Paulo e Rio de Janeiro, mas ainda no estado de São Paulo. Lá permaneci por seis meses no total, entre idas e vindas para trabalhar em São Paulo e no Rio, onde reside o produtor Thiago Nassif. A rotina numa cidade pequena me reaproximou de um aspecto mais sutil que geralmente é atropelado na correria da metrópole e me reconectou com o tempo do fazer artístico, que é mais próximo do tempo da natureza, pois tem seu próprio ciclo. Me propus a dedicar-me ao disco e, embora viesse constantemente para São Paulo para dar aulas, consegui uma imersão no processo que dificilmente teria obtido em outro lugar.

O papel que as mulheres, de modo geral, desempenham no pop é bastante restrito a ideia da “diva”. Como uma presença da mulher mais empoderada pode ajudar a levar a questão da igualdade de gênero para a sociedade?
Laura – Há artistas que trabalham bem com as diversas personas, incluindo a “diva” mas sem restringirem-se a este aspecto único – de imediato me vem na mente a complexidade de uma artista como a Lady Gaga, por exemplo ou no âmbito nacional a Rita Lee, que faz a diva, a palhaça e a sábia com a mesma maestria. Essa liberdade de expansão criativa que transcende a forma a que somos enquadradas (ou que por vezes voluntariamente nos enquadramos) já é um empoderamento em si, pois possibilita a exploração de outros arquétipos com a mesma potência, inspirando outras mulheres, sejam elas artistas ou não.

Uma prática que acho muito importante é comunicar às mulheres quando o trabalho que apresentam nos toca, quando vemos valor no que estão fazendo, ao invés de ficar somente nos comentários sobre a aparência ou outras pequenezas. A internet é um espaço de muita crítica destrutiva e quando estimulamos com elogios, demonstramos apoio, admiração, isso já dá uma força enorme! Não falo só de “likes” mas sim de escuta, de voltar-se para a produção, de reconhecer que ali há um esforço num caminho que é cheio de desafios. Acredito nessas pequenas ações que levam a mudanças maiores, pois são atitudes cotidianas que aos poucos transformam o comportamento. O machismo vai continuar existindo, a dualidade faz parte, mas se nos fortalecermos isso nos afetará menos e poderemos manter o foco na ação transformadora. Acredito na força que inclui a delicadeza, a gentileza e o afeto.

O que está acontecendo de mais novo na música brasileira hoje, na sua opinião?
Laura – A Mãeana tem feito um trabalho visual junto ao musical que é maravilhoso, uma verdadeira imersão. A Erica Alves é uma artista que sempre paro para escutar, tanto a música quanto o que tem a dizer, pois é muito ativa nas discussões ligadas ao espaço das mulheres na música e na sociedade como um todo – além de ser produtora das próprias criações, atividade geralmente relacionada aos homens no imaginário comum. Papisa, que é projeto one-women-band da Rita Oliva também tem me inspirado bastante (a ponto de tê-la convidado a integrar a banda neste show que farei no dia 18/3) assim como a Livia Nery, que é uma artista de Salvador que acessei recentemente e tem um trabalho de voz muito bonito. Quartabê, Negro Leo, Thiago Nassif, Jonnata Doll… para citar outros que me marcaram nos últimos meses.

SERVIÇO

Show: Laura Wrona – Lançamento de Cosmocolmeia
Part. especiais: Tata Aeroplano e Silvia Tape
Data: 18 de março (sábado)
Horário: 21h
Local: Sesc Belenzinho (Teatro – 3º andar)
Endereço: Rua Padre Adelino, 1.000 – Belenzinho – São Paulo /SP
Ingressos: R$ 20 (inteira) / R$ 10 (meia-entrada) / R$ 6 (comerciário)
Capacidade: 392 lugares
Telefone: 11 2076-9700
Classificação: 18 anos


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'Acredito na força que inclui a delicadeza, a gentileza e o afeto', diz Laura Wrona

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