As rimas e a visão já seriam suficientes para que ele chegasse a protagonista, mas Emicida cumpre um papel que vai além da música. Ao lado do irmão, Fióti, ele lidera o Laboratório Fantasma, selo e produtora que trouxe autonomia para dezenas de artistas e modificou a estrutura da música independente no Brasil. Nesta sexta (3), o paulistano da zona norte celebra sete anos de Laboratório ao lado de Seu Jorge, Rael, Kamau, Rico Dalasam, Coruja BC1, Drik Barbosa, Phill, Raphão Alaafim, DJ Marco (Céu), DanDan (Criolo) e Nyack (Emicida).
Fióti, que surpreendeu positivamente com o EP Gente Bonita e já pode ser considera uma das revelações do ano também ser apresenta. “Muitos amigos meus, talentosos, desistiram de fazer a música que amavam por não ver um horizonte profissional. Isso é algo que me frustra bastante até hoje, porque alguns desses talentos não irão voltar mais”, afirma em entrevista exclusiva ao Virgula.
“A cultura hip hop sempre foi libertadora”, afirma o rapper na conversa que abordou temas como cultura do estupro, racismo e a visão estereotipada disseminada sobre a África. Ele falou também sobe Madagascar, clipe lançado esta semana.
O disco mais recente de Emicida, Sobre Crianças, Quadris, Pesadelos e Lições de Casa, resultado de uma viagem do rapper pela África, acaba de ganhar edição europeia. É a primeira vez que ele ganha lançamento oficial por lá e, por isso, voltará mais uma vez para uma turnê no velho continente.
Com a palavra, o rapper nascido Leandro Roque de Oliveira, há 30 anos, e que no palco da Audio nesta sexta estará estará acompanhado por sua banda: Anna Trea (guitarra/percussão), Doni Jr. (cavaco/violão), Carlos Café e Sivuca (percussão e bateria), Samuel Bueno (baixo) e DJ Nyack.
Madagascar é uma música que oferece uma visão leve da África. Como faz para dosar politização e o lado mais suave, do amor, dessa estética jazzy do som?
Emicida – Eu faço como os fotógrafos fazem, tiram retratos e guardam momentos. Nesse caso em especial era lugar-comum demais querer colocar a África apenas como um local de mazelas apenas. Então mesmo sendo uma perspectiva de fora, tentei fazer com que a música fosse um presente que foi dado por alguém que viveu momentos incríveis naquele chão. Eu quis ser justo e não continuar reproduzindo o mesmo estereótipo cansativo que domina as pautas quando se fala sobre a África, principalmente no Brasil, estereótipo esse que deveria deixar um país que tanto se aproveitou do continente africano com vergonha.
Qual foi a ideia do clipe…
Emicida – A música nasceu lá mesmo, o refrão, estava com minha garota observando o céu de Madagascar e fiquei pirando em como as estrelas pareciam mais brilhantes ali, poucas luzes vindo de baixo faziam a luz do céu ser mil vezes mais forte. Foi foda. Aí, na hora de fazer o clipe, quis viajar um pouco nessa ideia de estar preso a uma realidade monótona, mas sonhando com os melhores momentos da sua vida, você tendo vivido eles ou não (risos). Viajamos eu e Henrique Alqualo, o diretor, em criar uma história mais simples, onde tivesse um lance de que a cada vez que você olha pra uma mina ela se torna outra, como se cada mulher fosse várias, como se a cada vez que você olha pra sua garota se apaixonasse por algo diferente nela.
Recentemente, o Criolo mudou a letra de uma música para que ela deixasse de ofender as travestis. No seu disco mais recente, Drik Barbosa faz uma participação com uma rima feminista, além do fato de ter mulheres instrumentistas incríveis na sua banda, considera que evoluiu pessoalmente e o rap em geral neste aspecto?
Emicida – Todos estamos em constante evolução, recebemos uma educação que nos aprisiona em um ciclo de opressões, vamos aprendendo e seguindo em frente tentando tornar esse mundo um lugar melhor, mas essa é uma preocupação recorrente desde sempre em todos os que você citou nessa pergunta. A cultura hip hop sempre foi libertadora, grandes mentes de homens e mulheres construíram nossa identidade. A sociedade é machista, infelizmente é difícil enxergar que você está reproduzindo um comportamento que você em outra instância combate, mas estar aberto pra aprender é um bom caminho e acho que nunca saímos dele. Me preocupa o fato de as pessoas dizerem livremente que o rap é machista ou que o funk é machista e não colocarem a sociedade em geral nessa cadeira de réu, talvez soe como boa intenção para alguns mais inocentes, mas para mim é outra coisa.
Você já disse que o racismo só diminuirá quando brancos passarem a falar do assunto, quais são os caminhos para que isso ocorra, na sua opinião?
Emicida – Em quantas entrevistas de pessoas brancas elas recebem este tipo de pergunta? Se vocês só falam de racismo quando tem algum preto, vocês ensinam o mundo que isso é um problema apenas dos pretos. Se a intenção é fazer parte da solução e não do problema, essa conversa sobre desigualdade racial e divida histórica com a população preta e indígena precisa acontecer em todos os lugares.
Como o Laboratório Fantasma se tornou referência, modelo de negócios? Como estava o mercado quando vocês entraram no jogo e como ele está hoje?
Emicida – Muitos amigos meus, talentosos, desistiram de fazer a música que amavam por não ver um horizonte profissional. Isso é algo que me frustra bastante até hoje, porque alguns desses talentos não irão voltar mais. Tinha tanta gente talentosa que em algum momento precisou se afastar da cultura por que precisava pagar as contas. Essa frustração me fez, junto com meus amigos, querer criar um panorama mais otimista nesse aspecto. Não chegamos ao ideal, é incrível visitar favelas e ver a molecada com a edição da Rolling Stone ou da Forbes em que em saí dizendo que se sentiu inspirada com aquela conquista, que aquilo os motivou a entrar em uma faculdade, voltar a estudar, a ler mais. Enfim, estávamos em um deserto e de alguma maneira conseguimos fazer um pequeno oásis, que futuramente, com trabalho, sério poderemos transformar em uma floresta e fazer com que a exceção da regra seja o deserto, não a gente.
SERVIÇO
Emicida e convidados
Onde: Audio, Av. Francisco Matarazzo, 694 – Água Branca – São Paulo – SP
Quando: Sexta (3), às 22h
Telefone: 11 3862-8279
Site: www.audiosp.com.br
Capacidade: 2000 pessoas
Censura: 18 anos
Valores: Primeiro lote: R$ 40
Ingressos antecipados: https://www.ticket360.com.br/evento/5448/emicida
Vendas por telefone: 11 2027-0777
Horário de funcionamento da bilheteria: segunda a sábado das 13h às 20h
Aceita todos os cartões de crédito e débito, exceto Hipercard
Não tem estacionamento no local
Chapelaria
Ar-condicionado
Acesso para PNE
Wi-fi grátis mediante cadastro online
Emicida na internet:
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