Flavia Flores, 36 anos, aproveitou uma troca de silicone para remover um pequeno caroço que os médicos acreditavam não ser nada, mas a história foi outra. Em outubro de 2012 foi diagnosticada com câncer de mama e após ficar dias chorando, resolveu dar a volta por cima. A forma que encontrou para superar foi criando a página “Quimioterapia e Beleza” para desmistificar a doença e compartilhar suas experiências com amigos, familiares e milhares de seguidoras. Na internet ela dá dicas de moda e beleza para mulheres que estão fazendo quimioterapia e alerta para importância do autoexame para o diagnóstico precoce da doença.
Confira sua história!
Sou de Florianópolis, tive um filho ainda adolescente e atualmente ele tem 20 anos. Trabalho com moda desde os 13 anos de idade e apesar de gostar da área, sempre me questionei o motivo de me dedicar a algo que considerava tão fútil e superficial.
Tentei até mesmo ser piloto de avião, mas acabei me formando em administração de empresas. Mesmo assim minha carreira sempre seguiu atrelada à moda apesar das inúmeras tentativas de mudar meu seguimento profissional.
Eu estava em uma fase da minha vida em que desejava me encontrar espiritualmente. Morava em São Paulo e trabalhava com algo que não me completava. Fiz um pedido a Deus para que minha vida mudasse completamente e em seguida fui diagnosticada com a doença. Era outubro de 2012 e eu pensava: “Poxa, Deus! Poderia ter me mandado outra coisa! Quem sabe uma viagem ao exterior e não um câncer”.
Por cerca de dez dias após o diagnóstico fiquei deprimida e chorando deitada em uma cama. Eu sentia vergonha apenas de me imaginar nas ruas sem cabelo. Tudo o que eu conseguia associar à palavra câncer era: gente doente, gente na cama, gente ficando inchada por causa do tratamento, gente sem cabelo, gente sem cor, gente sem forma e o pior, gente sem alegria.
Eu namorava há cinco meses quando soube da doença e com a notícia ele simplesmente desapareceu. Até nas redes sociais ele me bloqueou e nunca mais atendeu minhas ligações. O irônico é que antes de tudo acontecer, nós já tínhamos planos para morar juntos. Hoje em dia eu sei de muitas mulheres que passaram pela mesma situação quando se viram diante dessa doença. Seus companheiros e até famílias tomaram chá de sumiço. Por sorte tenho uma família incrível que está sempre ao meu lado: meus três irmãos, meus pais e minha avó, com quem moro atualmente, pois voltei a Florianópolis.
Resolvi reagir e decidi que para mim o câncer não seria algo inatingível, eu lidaria com ele da melhor maneira possível. Passado o baque inicial notei que meus amigos haviam sumido. Liguei para cada um para saber o que estava acontecendo e eles pareceram constrangidos. Então me dei conta sobre o quanto era difícil para as pessoas lidarem com essa nova realidade. Eles ficavam cheios de dedos para lidar com uma pessoa doente.
Foi então que um mês após o diagnóstico veio a ideia de criar uma página no Facebook, a “Quimioterapia e Beleza”, para que todos vissem que eu não estava à beira da morte e que poderia, na medida do possível, levar uma vida normal. Comecei a compartilhar minha rotina e ao desmistificar o câncer e quebrar o gelo sobre a doença, todos retornaram.
Em novembro fiz mastectomia dupla seguida do implante de próteses, em dezembro iniciei a quimioterapia e meu cabelo começou a cair no dia 21 de dezembro de 2012, exatamente no dia em que estava marcado o tão falado “dia do fim do mundo”. Naquele dia só o meu mundo acabou.
Apesar do choque pela perda dos cabelos, eu estava preparada para aquele momento. Os cortei bem cuidadosamente para fazer uma peruca com os fios depois, mas jamais cheguei a fazer isso. Meus cabelos foram destinados a serem de outra pessoa. Os dei de presente a uma das seguidoras que acompanha a minha página que não tinha dinheiro para uma peruca e que estava completamente deprimida por conta da perda de seus cabelos. Eu nunca a vi pessoalmente, mas me senti imensamente feliz por tê-la ajudado.
Hoje em dia entendo porque meu destino sempre acabava me levando de volta ao mundo da moda e da beleza. Tudo o que aprendi em anos de trabalho na área me ajudaram a fazer com que eu continuasse me sentindo bonita e isso manteve minha autoestima apesar de todas as adversidades. O câncer não precisa ter cara de infelicidade. Quem disse que uma mulher com câncer não pode se arrumar, se maquiar e disfarçar os efeitos que essa doença traz?
Com isso em mente comecei a compartilhar tudo o que vivencio em minha página no Facebook. Se aprendo uma nova maneira de amarrar o lenço na cabeça, eu mostro, se tenho uma nova dica em relação a perucas, eu escrevo. Muitas pessoas passaram a me procurar perguntando dicas específicas sobre como se arrumar, sobre o tratamento e sobre muitas coisas relacionadas ao câncer.
Não só pacientes de câncer escrevem comentários e perguntas no “Quimioterapia e Beleza”, mas familiares e amigos de pessoas que estão enfrentando a doença também. São comuns mensagens comoventes falando sobre como ter se inspirado em minha alegria de viver fez diferença em suas vidas. No entanto, a maior diferença aconteceu realmente em mim.
Através dessas pessoas encontrei uma razão, uma sensação de estar fazendo algo realmente importante mostrando que é possível viver e sobreviver a esta doença sem se vitimar e encarando tudo de frente.
Aos olhos de alguns poucos que já comentaram em minha página, eu não deveria me preocupar com vaidade num momento tão terrível, mas discordo. Sem autoestima você se entrega, definha. Muito melhor do que ter a sensação de alguém te olhar sentindo pena é sentir que te olham por você estar emanando felicidade e segurança por se sentir bonita.
No final das contas, cílios postiços, maquiagens, lenços e perucas foram apenas a maneira que encontrei para tirar o câncer do patamar de ‘doença-monstro’ a qual ninguém sequer pode mencionar.
O câncer não define o que eu somos, somos o que quisermos ser.