Mais de um século depois do fim da escravidão no Brasil, os quilombos enfrentam o presente através da implantação de negócios sustentáveis, como o cultivo de ostras, enquanto continuam evocando o passado com tradições.

Situado a 250 quilômetros do interior de São Paulo e protegido pela Mata Atlântica, está o quilombo Mandira, um santuário de liberdade no qual há 146 anos vivem nove gerações afrodescendentes da mesma família.

Dedicado tradicionalmente ao cultivo de arroz, palmito e madeira, a comunidade, fundada no século XIX pelo filho bastardo de um fazendeiro e sua escrava, se viu obrigada décadas atrás a buscar novas fontes de sobrevivência devido à perda progressiva de suas terras.

Fonte inesgotável de recursos, os moradores de Mandira se dedicam há três décadas ao cultivo de ostras como forma de sustento da comunidade: um árduo e minucioso trabalho que aliam ao turismo ecológico e aos trabalhos de costura.

No meio da floresta, o trabalho se centra na captura e cultivo de ostras nos mangues localizados entre a foz do Rio Ribeira de Iguapé e o oceano Atlântico, cuja maré, a 10 quilômetros de distância, marca o dia dos coletores.

Quando o nível do mangue baixa, os moradores de Mandira saem com seus barcos, a maioria sem remo, para coletar as ostras; as mulheres costuram em uma pequena sala e outras preparam a comida, na maioria de dias baseada em arroz, feijão e peixe.

As atuais temperaturas da região, próximas dos 35 graus, combinadas à umidade quase total que emana do mangue, põe aos coletores de ostras frente a dias de trabalho de alta exigência física.

Depois de recolhidas, as ostras são enviadas à Cooperativa Cooperostra, formada por 20 associados membros da comunidade, encarregados de limpar e distribuir pessoalmente o marisco aos bares e restaurantes das principais cidades do estado.

“A ostra é nossa principal fonte de renda, embora também estejamos centrados no turismo sustentável. Pegamos as ostras, deixamos nos viveiros para engordar e depois comercializamos”, explicou à Agência Efe Chico Mandira, sobrinho do líder da comunidade, Federico Mandira, impulsor da atividade na região.

Os quilombolas conseguem um lucro entre R$ 3 e R$ 5 pela venda de 12 ostras, enquanto seu preço para venda ao cliente nos restaurantes varia entre R$ 30 e R$ 150.

Além do cultivo das ostras, os Mandira também trabalham pela preservação da memória histórica dos antepassados e por manter viva a contribuição da população negra.

“Nos meus documentos, sou classificado como mulato, mas me considero negro, e é isso que eu passo para a minha família”, disse Chico, pai de sete filhos, cinco dos quais vivem na aldeia e se dedicam ao cultivo de ostras.

O estado de São Paulo conta com 28 quilombos reconhecidos, nos quais vivem cerca de 1.300 famílias.

“Os Mandira podem se casar com brancos, índios ou japoneses. Mas a verdade é que se alguém quer viver aqui tem que se casar com alguma pessoa da comunidade”, explicou Chico.


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Mandira: o quilombo sustentável das ostras