Para alguns é um espetáculo, para outros um esporte nacional, muitos brincam que trata-se quase de um teatro, mas não importa o que seja, é certo que a luta livre segue enchendo as arenas há oito décadas no México, após chegar ao país e se transformar em parte de sua cultura popular.

“Na luta livre você vem, escolhe seu favorito, seja limpo ou rude, grita e desafoga todos os problemas que tem em casa, no trabalho e na vida”, disse à Agência Efe Salvador Lutteroth Camou, filho daquele que é considerado pai da luta livre mexicana, Salvador Luttheroth González.

Este é, na opinião de alguém que dedicou toda sua vida a esta mistura de esporte e espetáculo, o segredo da sobrevivência: ir para a luta livre é se desafogar do mundo e todos gostam de liberar adrenalina e gritar insultos.

“Esse é o sucesso da luta livre, o bem contra o mal, ter um favorito e vir apoiá-lo e gritar a seu favor, ou gritar contra o adversário”, acrescentou este quase nonagenário que começou a trabalhar aos 18 anos nas arenas mexicanas ajudando seu pai.

Em 21 de setembro se completarão 80 anos desde que seu pai, um militar do Estado-Maior na época do presidente Álvaro Obregón (década dos 20), fundasse em 1933 a Empresa Mexicana de Luta Livre, hoje conhecida como Conselho Mundial de Luta Livre.

Após deixar o exército e cansado de não obter sucesso nos negócios em uma época complicada para a economia mexicana, Luttheroth González lembrou uma viagem a Santo Antonio, no Texas (EUA), quando foi levado para assistir um espetáculo de luta livre.

“Meu pai se lembrava que para entrar no espetáculo era preciso pagar e disse: ‘vamos fazer um teste para trazer a luta livre para cá e saberei na primeira noite se ganharei ou perderei dinheiro”, contou seu filho.

No local que é hoje o estacionamento da emblemática Arena México foi construído um ginásio pequeno e de madeira, que foi ampliado e melhorado em 1956. Em 1968, por ocasião dos Jogos Olímpicos, o local ficou como está na atualidade, com capacidade para cerca de 18.000 pessoas.

Segundo Lutteroth Camou, no princípio quase todos eram lutadores americanos, mas seu pai se empenhou muito para formar atletas locais e pouco a pouco os mexicanos se transformaram em maioria, foram adotando roupas coloridas e acrescentando à luta seus próprios elementos.

Apesar da luta ter evoluído muito e agora ser “muito mais um espetáculo”, em parte pelas transmissões televisivas, o básico se manteve.

De um lado “lutadores limpos, técnicos”, e de outro os rudes e trapaceiros, que “que tinham menos conhecimentos e que em certo momento tinham que recorrer a algum método ilegal que provoca a raiva do público”.

A luta do bem contra o mal, isso é o especial na luta livre mexicana, na opinião de Lutteroth Camou, briga na qual nem sempre os bons vencem.

“O fenômeno atual da luta livre é que se torce mais pelos rudes do que pelos técnicos, é parte da evolução, apoiar mais os maus do que os que representam o lado bom”, explicou à Efe Salvador Lutteroth Lomelí, representante legal da Arena México e filho de Lutteroth Camou.

Sua experiência demonstrou que o segredo da continuidade é não ter se estagnado, mas evoluir, já que a luta livre não compete só com os esportes, mas com todo tipo de entretenimento.

“Inicialmente se exigia um rigor técnico dos lutadores, mas foi evoluindo para uma luta dinâmica, aérea. As capas foram deixadas para trás e se transformaram em roupas de personagens fantásticos que levam penas, vestes pré-hispânicas, máscaras de épocas galácticas e heróis mitológicos”, relatou.

As máscaras são seus elementos identificativos, eixo do visual de cada lutador, símbolo de sua honra e o bem mais valioso que podem apostar em uma briga, que se acaso perdem precisam retirar e revelar sua identidade.

Mais luzes, mais som, mais espetáculo, até o ponto que muitas pessoas que vão às lutas observam incrédulos os golpes barulhentos e excessivos e acham que tudo não passa de puro teatro.

“É uma crítica que já não importa, o que os que não são apaixonados acreditam ou não. É uma mistura de esporte e espetáculo, em que porcentagem é difícil dizer”, explicou Lutteroth Lomeli, para quem a preparação física dos lutadores se assemelha a de qualquer atleta.

“Os torcedores reais da luta livre não se questionam se há realidade ou não. O que se vê em cima de um ringue e o que se desenvolve pelos lutadores é mais que patente que é real”, acrescentou.

Uma dura preparação na qual se transformam em “grandes improvisadores” que conhecem chaves, saltos, sabem como finalizar um rival e “conhecendo esta técnica não há necessidade de um final arranjado”.

Buscando dar força a este argumento, seu pai conta uma lembrança que aconteceu após as olimpíadas de 68, nas quais trabalhou na organização.

“Conheci vários rapazes que praticavam luta e quando terminou a competição os convidei a fazerem luta livre conosco. Não aguentaram nem um mês”, sentenciou.


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Luta livre completa oito décadas no México como parte de sua cultura popular