Na última terça-feira (03) foi comemorado o 15º Dia do Skate na cidade de São Paulo. Mas essa debutante data deve ter sido ofuscada por eventos muito mais globalizados, como o Dia Mundial do Skate – 20/07, que nesse ano contou com o evento Wild in the Streets (Selvagem nas Ruas) – e o X-Games, o campeonato mais importante de esportes radicais – e que coroou o brasileiro Pedro Barros, de coincidentes 15 anos, como campeão da modalidade Skate Park.

A falta de um merecido rebuliço pelo dia municipal do skate me levou até o centro da cidade, que já abrigou rolês de várias gerações. A 100 metros da Praça Roosevelt, a poucas remadas do estacionamento onde eu dei minha primeira volta de skate (com 4 anos, sentado, empurrado por um punk de moicano em pé), fica o espaço Matilha Cultural (Rua Rego Freitas, 542).

Lá, conversei com o curador independente Lucas Ribeiro, 31 anos, responsável pela exposição Destroy and Create que está sendo montada no Matilha. Esqueça a imagem de curadores que a TV deixou na sua cabeça. Nem um engomadinho rico e modernoso, nem um malucão sujo de tinta. Boné trucker, barba grande, camisetão, sneakers, e uma mão que não sabe se cumprimenta ou se bate em um toque informal. Esse é Pexão, o curador e idealizador da exposição, que abre suas portas nessa sexta-feira (06) e vai até o dia 3 de setembro.

Item fundamental na cultura do skate, os shapes – como são chamadas as pranchas de madeira onde os skatistas se (des)equilibram – se tornaram uma plataforma importante para a arte contemporânea, atraindo atenção de artistas plásticos e galerias.

CICLO COMPLETO

Para mostrar o ciclo completo da arte de um shape, desde sua pintura até sua aposentadoria, depois de voar entre o asfalto e os pés do skatista, 11 pranchas foram distribuídas entre artistas plásticos e depois entregues a skatistas para que fossem detonadas.

“Normalmente a arte em shapes quebra o ciclo do skate”, comentou Pexão sobre artistas e galerias que utilizam as pranchas apenas como tela de pintura, tirando-as de seu habitat natural: em cima de quatro rodas . Para ele, as intervenções que o skatista aplica à prancha, raspando o carrinho contra paredes, asfalto, degraus e corrimãos são parte da estética do skate. Ele explica que essa “é uma estética paralela ao punk e ao design dos anos 90, que apresentava logotipos desgastados. Uma estética bem disseminada”.

Junto a essa lógica estética, há a relação entre skatista e seu shape usado. Mesmo depois de destruído, os shapes continuam sua trajetória nas mãos do skatista. Pexão explica que essa relação próxima e sentimental existe porque “algumas das marcas que ficam no skate tem histórias, são como cicatrizes”. É comum que as pranchas sejam guardadas como troféus, mesmo (e principalmente) depois de inutilizáveis.

TRÊS TEMPOS

Pexão divide a exposição em três tempos. No primeiro, estão as fotos das obras-pranchas recém-pintadas pelos artistas convidados. Sesper, Trampo, Billy Argel, Walter Nomura “Tinho”, Mateus Grimm, MZK, Carlos Dias, Fabio Bitão, Bruno 9li, Barnero e Silvana Mello puderam customizar, da forma que bem entendessem, um shape cada.

No segundo tempo estão as fotografias e vídeos experimentais registrados durante três sessões de skate na Avenida Paulista. Três fotógrafos (Flavio Samelo, Fabiano Lokinho, Alex Brandão) e dois video-makers ( Gabriel Sândalo e Alexandre Cotinz) tiveram carta-branca para fugir do simples registro das manobras radicais e produzir seu trabalho artístico.

Quatro skatistas participaram das sessions, um convidado (Fabio Schumacher) e três membros da equipe Adidas (Akira Shiroma, Daniel Marques e Klaus Bohms)  – marca que tem uma abordagem mais voltada à atitude do skate do que ao esporte/performance. Sem a pressão de uma competição, onde avalia-se o grau de dificuldade de manobras”, eles puderam curtir a Avenida Paulista com amigos, de uma forma natural”. O cartão postal da cidade foi escolhido pela interação do skate coma arquitetura característica da avenida, além de ser um ponto de encontro tradicional dos skatistas paulistanos.

O resultado final dos shapes é a terceira parte da exposição. Com o ciclo completo, os 11 shapes usados, raspados e destruídos serão exibidos nas paredes da galeria. O ponto de encontro do ateliê com a cultura real do skate é finalizado.

Shape pintado por Billy Argel. À esquerda o desenho completo, e à direita levemente raspado pelo atrito com calçadas e borda, mostrando que o desgaste da peça é parte da arte

ESCULTURA

Criada pelo Coletivo Noh, a obra Venus – duas chapas de metal em formato que lembra o de um barco – é uma escultura “skatável” que também fará parte da exposição. Assim como os shapes, Venus não é estática. Em um primeiro momento ela vai ficar dentro galeria para que skatistas convidados possam interagir com a obra do alto dos seus carrinhos.

Depois de um mês, ela sai da Matilha Cultural e passa por outra transformação na qual as duas chapas de metal são cimentadas. Aí ela vira uma presente à cidade, liberada para manobras de quem quiser se arriscar.

Venus, a escultura “skatável” que depois será desmontada e cimentada

MATILHA CULTURAL
Rua Rego Freitas, 542 – São Paulo
Tel.: (11) 3256-2636
Horários de funcionamento: terça-feira a sábado, das 12h às 20h
Wi-fi grátis
Cartões: VISA (débito/crédito)
Entrada livre e gratuita, inclusive para cães

http://destroyandcreate2010.tumblr.com/
http://www.twitter.com/destroy_create
http://www.facebook.com/destroyandcreate


int(1)

Exposição apresenta skates como platafoma artística do começo ao fim

Sair da versão mobile