Uma estátua religiosa na cidade de Davidson, na Carolina do Norte (EUA), é diferente de tudo que você possa ver em uma igreja. A escultura retrata Jesus Cristo como um morador de rua dormindo em um banco de praça. A Igreja Episcopal de St. Alban instalou a obra em sua propriedade no meio de um bairro nobre repleto de sobrados bem conservados.
Jesus está encolhido debaixo de um cobertor com o rosto e as mãos escondidos. Apenas as feridas da crucificação nos pés descobertos denunciam a sua identidade. A reação foi imediata. Alguns adoraram a intervenção, outros ficaram apavorados.
“Uma mulher da vizinhança chamou a polícia quando o viu, pensando ser um morador de rua real”, assinala David Boraks, editor do site DavidsonNews.net. “Isso mesmo: alguém chamou a polícia para prender Jesus!”, exclama o jornalista. Um outro vizinho, que vive a duas casas da igreja, escreveu para a redação pedindo que levassem o indigente para longe do bairro.
A estátua de bronze foi comprada por cerca de 50 mil reais por uma paroquiana, Kate McIntyre, que aprecia a arte em locais públicos. Mesmo assim, alguns vizinhos sentiram que era uma representação insultosa do líder religioso, por parecer mais com um vagabundo enrolado em um cobertor do que com um ícone.
O reverendo David Buck, de 65 anos, se mostra um pouco avesso à polêmica. “Isso dá autenticidade à nossa igreja”, assinala. “Esta é uma instituição relativamente influente e precisamos lembrar que a nossa fé se expressa na preocupação ativa com os marginalizados da sociedade”, reitera.
A escultura é concebida como uma tradução visual da passagem no Livro de Mateus, em que Jesus diz aos seus discípulos: “como você fez isso a um de meus irmãos, você fez isso para mim”. “Além disso, é uma boa lição da Bíblia para aqueles acostumados a verem Jesus representado na arte religiosa tradicional como o Cristo de glória, entronizado em elegância”, lembra o reverendo. “Acreditamos que esse é o tipo de vida que Jesus tinha. Ele era, em essência, um morador de rua”, completa.
Apesar das críticas, o reverendo informa que a estátua ganhou mais admiradores do que detratores. “É comum ver as pessoas sentarem no banco e rezarem, com as mãos sobre os pés de Cristo”, aponta.
Esta cidade é a primeira a ter em exibição a obra “Jesus Homeless”. Católicos de Chicago planejam instalar também sua estátua, assim como a Arquidiocese de Washington, na capital federal do país. Timothy Schmalz, criador da obra, é um canadense que também é um católico muito devoto. De seu estúdio, em Ontário, Schmalz admite que entende que seu Jesus é provocativo. “Isso é essencialmente o que a escultura tem de fazer, desafiar as pessoas”, reforça.
Ele aponta que ofereceu os primeiros moldes para a Catedral de St. Michael, em Toronto, e para a Catedral de St. Patrick, em Nova York. Ambas não tiveram interesse. Um porta-voz da igreja canadense indica que a apreciação da estátua “não foi unânime”. Além disso, a igreja estava sendo restaurada e uma nova obra de arte estava fora de questão. Já o porta-voz da igreja de Nova York diz que gostou do Jesus sem-teto, mas a sua catedral também estava sendo reformada e eles não puderam arcar com a despesa.
A próxima instalação do Jesus de bronze em um banco de parque pode ser na Via della Conziliazione, a avenida que conduz à Basílica de São Pedro – se o Vaticano aprovar. Schmalz viajou para lá em novembro passado para apresentar uma miniatura para o próprio Papa Francisco. “Ele caminhou até a obra e foi simplesmente arrepiante quando ele tocou o joelho da escultura, fechou os olhos e orou”, lembra. “Isso é o que o papa está fazendo em todo o mundo: chegar aos marginalizados”, diz o artista.