A ditadura instalada na Argentina entre 1976 e 1983 utilizou um método idealizado pelo nazismo para o roubo de bebês e a substituição de sua identidade, disse à Agência Efe o historiador e escritor Carlos De Nápoli.
De Nápoli, que nesta quarta-feira (23) apresenta no Museu do Holocausto de Buenos Aires um documentário sobre a vida do criminoso de guerra nazista Josef Mengele na Argentina, explicou que o programa de roubo de bebês foi executado pelo Escritório Principal para a Raça e o Reassentamento (RUSHA).
LEIA TAMBÉM: Primeiro museu do holocausto do Brasil é aberto em Curitiba
Essa organização tinha, entre outros objetivos, o “de assassinar todas as minorias consideradas impuras e indesejáveis”.
Nesse sentido, o escritor antecipou que nos próximos dias pedirá aos juízes argentinos que tramitam causas sobre roubo de bebês durante a ditadura que incorporem como antecedente um julgamento realizado em Nuremberg em 1949, que tratou deste método.
Organizações humanitárias argentinas calculam que cerca de 500 bebês foram roubados pelo regime militar nos denominados “anos de chumbo”.
De Nápoli, autor de vários livros sobre o nazismo, disse que este processo judicial em Nuremberg, que é pouco conhecido, foi introduzido pelos Estados Unidos contra a RUSHA.
“Nesse julgamento vieram a conhecimento os atos criminosos desta organização e foram descobertos com riqueza de detalhes os métodos e procedimentos usados para suprimir a identidade real dos bebês, especialmente nos países do leste europeu, e substituí-la por uma nova”, explicou.
O diretor da RUSHA foi o argentino Ricardo Walther Darré, um general que “entrou para a história como ministro de Alimentação de Adolf Hitler e depois ministro da Agricultura da Prússia, mas não por essa atividade secreta”, comentou o historiador.
De Nápoli apresentará no Museu do Holocausto de Buenos Aires um documentário sobre a vida do médico e criminoso nazista Joseph Mengele na Argentina, feito com a colaboração da History Channel e Anima Films.
O filme revela detalhes inéditos da vida na Argentina do chamado “anjo da morte”, responsável por desumanos experimentos no campo de concentração de Auschwitz, que escapou da Alemanha após a Segunda Guerra Mundial (1939-1945) e encontrou refúgio no país sul-americano.
Mengele chegou à Argentina em 1949 com identidade falsa, embora anos mais tarde tenha conseguido que a Polícia Federal do país lhe expedisse um documento com o nome de José Mengele.
De Nápoli entregará ao Museu do Holocausto uma cópia do estatuto societário da Fadrofarm SRL, laboratório que Mengele fundou na Argentina e no qual figurava como “sócio oculto”.
“No estatuto figura quem eram os sócios, os gerentes, os advogados e os escrivães do laboratório, e também o seu capital inicial, que alcançava US$ 1 milhão, número enorme para a época”, disse.
“É o primeiro documento que o expõe da cabeça aos pés”, disse o escritor, que também doou uma cópia do expediente completo do segundo casamento de Mengele na cidade uruguaia de Nueva Helvecia.
“Ele se casou com sua cunhada, Marta María Hill, cujo marido, irmão de Mengele, tinha falecido anos antes. Isto provocou a ira de sua primeira esposa, Irene Schönbein, que a partir dali começou a tornar pública a atuação do criminoso em diferentes tribunais alemães”, comentou.
De Nápoli considerou uma “bobagem” as versões que indicavam que Mengele, excluído dos juízos de Nuremberg, era perseguido durante aquela época e prova disso, afirmou, é que “o dia em que se casou publicou um édito nos jornais do Uruguai em que anunciava suas segundas núpcias”.