A febre dos documentários musicais definitivamente chegou ao Brasil. Depois do lançamento de filmes como Cartola Música Para Os Olhos, Cazuza O Tempo Não Para e Vinicius (sobre Vinícius de Moraes), que foram lançados nos últimos anos, uma nova leva de filmes sobre bandas ou personalidades da música chegou ao cinemas em 2009.
Simonal Ninguém Sabe o Duro Que Dei, Titãs – A Vida Até Parece Uma Festa, Loki (sobre o ex-Mutantes Arnaldo Baptista), Guidable A Verdadeira História do Ratos de Porão e Garage Fuzz ao Vivo 2009 são alguns dos filmes que já chegaram ou estão prestes a serem lançados. Na mesma onda, os cinemas de São Paulo estão recebendo a primeira edição do In-Edit, festival internacional de documentários musicais nascido há sete anos na Espanha (para ver a programação, clique aqui para entrar no site do evento).
Sucesso de bilheteria
Simonal – Ninguém Sabe O Duro Que Dei vendeu cerca de 16 mil ingressos em sua primeira semana de exibição. Em cartaz há sete semanas (até o momento), o documentário dirigido por Cláudio Manoel, Calvito Leal e Micael Langer trouxe de volta para as rodas de conversa a figura de Wilson Simonal, que fez um sucesso estrondoso nos anos 60 e caiu no ostracismo após ser acusado de dedo-duro da ditadura militar.
Segundo Leal, a equipe enfrentou diversas dificuldades na hora de fazer a pesquisa sobre o cantor. No início, encontramos barreiras por parte dos investidores, que não queriam associar sua marca à imagem do Simonal. Além disso, os entrevistados temiam a repercussão que poderia causar mexer nessa história, que já estava esquecida, conta ele.
Outra dificuldade , afirmou o diretor, foi reunir material de arquivo com as apresentações de Simonal. Ele diz que tudo estava esquecido ou em estado ruim de preservação. Fomos a todas as emissoras de televisão, bancos de imagens e museus com acervos de vídeo que poderiam ter algum material dele. O material estava depositado em caixas de papelão que já tiveram dias melhores, sem nenhum tipo de categorização, o que tornou a pesquisa um processo lento e trabalhoso, afirma Leal.
Também diretor, Langer garante que a principal preocupação da equipe era não fazer um documentário que apenas compilasse informações sobre o cantor. Queríamos criar algo diversificado, palatável. Deu certo em razão do poder do boca-a-boca. O documentário é bem pop, comercial, o que é ótimo. E todo o encanto do filme é responsabilidade do Simonal, que era incrível, finalizou.
Histórias de bandas
Quem gosta de rock nacional do início dos anos 90 com certeza se lembra do Garage Fuzz, que tem 18 anos de estrada e vários fãs acumulados ao longo de sua trajetória na cena underground brasileira. Para registrar sua carreira, a banda decidiu lançar em agosto de 2009 o DVD Garage Fuzz Ao Vivo 2009, que será dividido em duas partes: um show completo da banda, editado e dirigido por Kennedy Lui, e o documentário propriamente dito, feito por Lucas Valente.
Segundo Valente, o documentário é baseado no arquivo pessoal do vocalista da banda, Alexandre Cruz. Foi ele quem teve o trabalho de guardar e ir atrás de todo material, como fitas VHS de shows, fotos e um monte de material de apoio, conta. Ele afirma que o filme tem muito material sobre outras bandas da época. Tem imagens de bandas pré-Garage Fuzz, como o Psychic Possessor, o Dead Crab e o OVEC. Tivemos sorte que o vocalista é um maníaco e guardou durante anos absolutamente tudo que tinha algo a ver com a banda, brinca.
Outra banda famosa do circuito underground nacional que vai ganhar um registro é o Ratos de Porão. Guidable A Verdadeira História do Ratos de Porão, dirigido por Marcelo Appezzato e Fernando Rick, traz diversos episódios inéditos do grupo pioneiro da cena punk nacional.
O João Gordo (vocalista da banda e produtor do documentário) documentava tudo, então tínhamos bastante material para usar. Eles deram carta branca. Pudemos fuçar em tudo, conta Appezzato.
Segundo ele, nada da história pesada da banda, que envolve brigas e uso de drogas, foi atenuado no documentário. A edição final foi nossa. Não amenizamos nada. Colocamos todos os podres que os caras da banda não queriam mostrar para os filhos, ri o diretor.
Aumento do interesse?
Qual o motivo por que tantos filmes sobre bandas e artistas nacionais tenham sido lançados quase ao mesmo tempo? Na opinião de Lucas Valente, a explicação está no aumento do interesse do público por documentários musicais. O fã quer ver um tipo de material ao qual não está acostumado a ver.
Quem não gosta de ver um vídeo da banda que gosta tocando, ver o que
seus integrantes pensam, sua história? Hoje em
dia, isso com certeza repercute mais do que um CD, assegura.
Kennedy Lui, por sua vez, afirma que esse modismo é uma resposta
à internet e ao MP3, que contribui para que as pessoas consumam música de forma
superficial. Essas coisas disponibilizam ao público um acervo quase infinito de informação, o que torna o contato
com a música quase superficial. O documentário acaba sendo uma forma de
aprofundar o contato com o artista, explica.
Diretor da película sobre Wilson Simonal, Langer tem uma opinião bem
contrária. Essa onda não é nova, pois fica bem mais simples você pegar
carona no talento dos outros para fazer algo legal. Foi o que fizemos
no nosso documentário: se ele causa interesse, é exatamente pelo brilho
próprio do Simonal, que era um gênio, explica.
Leal aponta outro motivo para a recente febre de documentários musicais produzidos no Brasil: a burocracia nas leis nacionais de imagem, que restringe o acesso a imagens de arquivo. É inviável conceber aqui um documentário investigativo. Vale citar o caso de Send a Bullet, de Jason Kohn,
que trata da corrupção no Brasil e teve sua exibição proibida por
aqui. Essa burocracia restringe a seleção de temas, critica.