O Brasil pode voltar a ser denunciado às cortes internacionais de direitos humanos por causa da impunidade dos autores de crimes ocorridos durante o regime militar (1964-1985).


 


A organização não governamental (ONG) Justiça Global diz que recorrerá à Organização dos Estados Americanos (OEA) e às Nações Unidas (ONU), se for revista a terceira edição do Plano Nacional de Diretos Humanos (PNDH 3).


 


“A revisão ou a suspensão do decreto permite acionar os organismos internacionais”, afirmou a diretora executiva da ONG, Andressa Caldas.


 


Referindo-se à ameaça de demissão que teria sido feita pelo ministro da Defesa, Nelson Jobim, e pelos comandantes militares, Andressa disse que seria um “fato gravíssimo”o novo PNDH ser alterado por “chantagem”.


 


“Quando a chantagem vem de setores armados, isso coloca mais em risco a nossa democracia. Coloca a gente em um patamar muito baixo de democracia”, protestou.


 


Para ela, a reação das Forças Armadas tem sido desproporcional. “Parece ser mais um factoide do que um fato político que deva merecer seriedade maior por parte da opinião pública.”


 


O cientista político Paulo Sérgio Pinheiro, secretário de Direitos Humanos durante o governo Fernando Henrique Cardoso, ressaltou que o Estado brasileiro goza de boa reputação internacional quanto ao respeito aos direitos humanos, mas criticou a posição do ministro da Defesa e dos comandantes militares.


 


“A essa altura do campeonato, querer liquidar comissões de Verdade e Justiça é uma coisa muito fora de moda, especialmente no nosso continente, onde há experiência vastíssima e positiva de comissões de Verdade. Nós é que estamos atrasadíssimos”, afirmou Pinheiro, citando os casos da Argentina, do Uruguai e do Chile.


 


Pinheiro, que atuou como consultor para a elaboração do PNDH 3, criticou a ameaça de Jobim de pedir demissão.


 


“Ministro que não está contente deve pedir demissão. É ridículo ministro ficar pedindo demissão, sabendo que todos os ministros, para não ser pedante, são demissíveis ad nutum [basta a vontade do presidente]. Os ministros, desde [o filósofo moderno Nicolau] Maquiavel, são demissíveis pela vontade do príncipe.”


 


De acordo com Pinheiro, não há razão para temor entre os militares. “Nenhuma Comissão da Verdade julga. Isso é conversa para boi dormir. As comissões da Verdade só expõem os fatos e depois o Judiciário faz o julgamento.”


 


O deputado Pedro Wilson (PT-GO) destaca que “não há busca de revanchismo” na proposta de funcionamento da Comissão da Verdade, que considera “fundamental para o Brasil se reconciliar com a história”.


 


Membro da Comissão de Direitos Humanos e Minorias e da comissão representativa que funciona no recesso da Câmara, Wilson informou que as duas comissões se reunirão até quinta-feira para tratar da repercussão do plano.


 


Segundo o coordenador da ONG Terra de Direitos, Darci Frigo, que também participou da elaboração do PNDH 3, os setores que agora se opõem ao plano não deram a atenção devida ao processo democrático de participação da conferência.


 


Para ele, “a democracia brasileira só será uma democracia substantiva, se ela se colocar em paz com a própria história. A sociedade precisa saber.”


 


Em março do ano passado, a Corte Interamericana de Direitos Humanos, ligada à OEA, foi acionada por causa de um processo iniciado em 1982 sobre o desaparecimento de 70 pessoas que participaram da Guerrilha do Araguaia, que reuniu opositores à ditadura militar, no anos 70, em um movimento no sul do Pará e norte de Tocantins (Goiás, na época).



 


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Justiça Global denunciará Brasil se for anulado plano de direitos humanos