Heavy metal é o gênero musical mais peculiar.

Prova disso foi que, em um fim de semana prolongado em São Paulo, quando a população foge da cidade, a casa de shows Via Funchal foi recheada por cerca de quatro mil pessoas que foram assistir às apresentações de dois ícones do thrash metal (linha mais extrema do heavy metal): os norte-americanos do Exodus e os alemães do Kreator.

Não é pouca coisa. É a mesma casa que anunciava em seus telões como próximas atrações medalhões como Claudia Leitte e Franz Ferdinand.

Como a maioria do público, Exodus e Kreator são duas bandas bastante rodadas. Estão na ativa desde o começo da década de 80. E, também como os fãs, parecem ter parado naquela década, como revelam o estilo de bateria, os riffs extremamente rápidos e técnicos e a forma de se vestir – imensa maioria de camisas pretas com estampas coloridas que vão do pescoço ao umbigo, cinturões moldados com balas de fuzis e tarraxas, muitas tarraxas. A soma não torna o gênero nada glamouroso. E fãs e banda não fazem questão de muito alarde.

Chego com 15 minutos de atraso em relação à hora marcada para o início do show, 22h. Nada indica que está acontecendo um show grande no Via Funchal. Ou que, ao menos, trata-se de uma apresentação concorrida – silêncio nas ruas em volta, pouca gente em frente à casa noturna. Mas, quando piso no recinto, vejo que o Exodus já iniciou o trabalho de destruição de pescoços dos headbangers (no heavy metal, o acompanhamento dos fãs é o tradicional bate-cabeça).

A comunhão não acontece no barulho que as duas bandas fazem na mídia, mas na relação de devoção dos fãs. São quatro mil pessoas em um show praticamente não-anunciado e que cantam todas as músicas, com mais entusiasmo as do começo de suas carreira. Os cinco integrantes do Exodus sabem disso e salpicam a apresentação com os maiores sucessos de seu disco mais conhecido, Bonded by Blood, lançado há 25 anos.

Da banda original, no palco, está o dono da camisa 10 da turma, o
guitarrista Gary Holt, que com controle mágico de palhetadas influenciou
todos os guitarristas que montaram bandas de thrash metal após o nascimento do Exodus. E mesmo alguns contemporâneos, como Andreas Kisser, do Sepultura.

A banda fecha a performance com Strike of the Beast, do disco de um quarto de século atrás, mas que continua tão relevante que eles o regravaram inteiro recentemente.
 
Exodus

Terminado o show do Exodus, é hora da atração principal, Kreator, que igualmente se fez notar com a explosão do thrash metal no meio dos anos 1980. Mille Petrozza, guitarrista, vocalista e líder, anuncia o que poucos paulistanos sabem: “São Paulo é a cidade do metal. E quando o Kreator toca aqui, é como estar em casa”.

Ele aproveita todas as bolas levantadas da noite. Faz um discurso contra a religião, diz saber que existem muitos fanáticos por aqui, mas dá graças
a Satã (?) por existirem outros que “não acreditam nessa besteira religiosa”, e emenda para o gol com a música que batiza o penúltimo disco da banda, Enemy of God (“inimigo de Deus”).

Dá tempo ainda para Petrozza dizer que é a última noite da turnê sul-americana das duas bandas, lembrar que é noite de Halloween e fazer valer o título do disco mais recente do Kreator, Hordes of Chaos (“hordas em caos”). Afinal, é apenas mais uma noite para a turma do metal. E só eles sabem disso.


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Exodus e Kreator mostram em SP que, mesmo sem alarde, o heavy metal continua vivo e forte

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