A arquiteta santista Thaís Frota, hoje residente em São Paulo, tem chamado atenção no Twitter com o seu interessante trabalho sobre acessibilidade. Mesmo não sendo deficiente, ela se interessou pelo tema ainda na faculdade e hoje é defensora ferrenha da questão que, para ela, deveria ser um assunto tão corriqueiro quanto sustentabilidade e crise econômica.

Thaís explica que acessibilidade não se trata apenas de deficientes físicos, auditivos e visuais. Idosos e grávidas também ficam com mobilidade reduzida, portanto todos precisaremos de lugares com acesso universal algum dia.

Para a arquiteta, o deficiente não quer entrar só em escola, agência bancária e hospital, todos os espaços têm que ser pensados para qualquer tipo de pessoa – com segurança, conforto e acessibilidade. “Se o lugar não está pronto para receber TODAS as pessoas, o lugar é deficiente”, costuma dizer.

Leia entrevista do Virgula com Thaís Frota:

Como surgiu a vontade de trabalhar com acessibilidade?
No meu TFG (Trabalho Final de Graduação) da faculdade, eu via que a maioria dos temas dos trabalhos eram sempre mais do mesmo. Comecei a pensar: o que eu posso fazer que ainda não foi feito e que seja uma coisa útil? Nesse meio tempo uma aluna de outra turma ficou cega. Aí me deu vontade projetar com esse desafio. E o tema do meu TFG foi “Parque sensorial para pessoas com deficiência visual”. Tirei 10 e o trabalho foi indicado para um concurso. Apresentei este trabalho para a SMPED, comecei a trabalhar na área e nunca mais quero outra coisa.

As pessoas se surpreendem quando você revela que não é deficiente mas trabalha nessa área?
Sim, 100% das pessoas se surpreendem, até pessoas da minha família. As pessoas que não me conhecem fazem essa pergunta; “Mas porque você abraçou essa causa? Tem alguém na família?” ou ainda, “Você não tem vontade de fazer outra coisa?” Eu respondo que alguém precisa fazer este trabalho. O papel do arquiteto é projetar espaços para pessoas de todos os perfis.

A Avenida Paulista realmente ficou acessível depois da reforma?
Em partes. Não se pode pensar em uma calçada isoladamente. A Av. Paulista se adaptou e os estabelecimentos adjacentes ganharam um baita degrau. Alguns edifícios que já estavam acessíveis viraram um obstáculo! Agora esses locais vão ter que se adaptar novamente. A cor clara do piso ficou um pouco ofuscante em dias de sol. No geral está agradável, as pessoas andam de skate, as mulheres podem ir trabalhar à vontade de salto alto, enfim. Ficou mais agradável. Só não foi alterada a calçada em frente o Conjunto Nacional por ser um edifício tombado.  

Quais cidades do Brasil e exterior são mais acessíveis?
O que existem são países que são referências neste assunto. Estados Unidos, Canadá e Austrália estão ganhando disparado em termos de acessibilidade. Algumas das nossas cidades já se empenham bastante para se tornarem acessíveis, mas estamos longe de ter um modelo 100% pronto.

Quais as baladas e casas noturnas mais acessíveis em SP?
Algumas revistas e sites indicam alguns locais como acessíveis mas na prática não são: faltam sanitários adaptados, ou até percurso acessível até eles. O acesso deve ser único, pois não considero inclusão todas as pessoas entrarem por uma porta com degrau, e a pessoa com deficiência entrar por uma rampa lateral escondida que quando chove a pessoa se molha. Falta também cardápio em Braille, o estabelecimento precisa ter apenas um, o que não é caro. Um exemplo de lugar acessível é o Sesc. Todos os Sesc estão acessíveis e eu fico muito feliz com isso! As grandes casas de shows também têm muita preocupação em se tornarem acessíveis. Um parque acessível é o Villa Lobos, que inclusive conta com brinquedos adaptados para crianças com deficiência. O deficiente não quer acessar só escola, agência bancária e hospital. Quem consegue só fazer isso?

Os novos estabelecimentos já estão adequados às novas leis?
Os locais continuam sendo inaugurados sem acessibilidade, e só depois são adaptados. Adaptado é diferente de acessível, pois o projeto acessível desde a sua concepção já visa a questão da acessibilidade. Geralmente o que eu mais vejo é que os escritórios de arquitetura não tem departamento de acessibilidade e também não contratam um especialista para revisar os projetos. Recentemente, uma marca brasileira que é referência mundial inaugurou uma loja que não é acessível em plena Rua Oscar Freire.

Como surgiu a vontade de abrir o Twitter pra divulgar a acessibilidade?
Meu marido começou a usar e me incentivou a expor as minhas idéias também. Queria ter um espaço público para expor as minhas idéias sobre este tema e com isso tornar o assunto rotineiro assim como sustentabilidade, crise econômica etc. E queria também uma resposta rápida das pessoas, sentir o que as pessoas sabem sobre isso, saber por que existe tanta resistência em adaptar edificações. E no Twitter tenho esse termômetro de imediato, as pessoas tiram suas dúvidas e deixam comentários. O meu trabalho como arquiteta fica mais fácil se eu entender quais são as dúvidas das pessoas. Eu aprendi uma forma melhor e mais informal de tratar do tema. Consigo traduzir uma linguagem técnica de uma norma para uma linguagem mais clara.

Você recebe muitas denúncias e sugestões?
As pessoas me perguntam se podem denunciar. Eu respondo que DEVE denunciar, pois assim agimos como cidadão. No site da Prefeitura de São Paulo as pessoas podem fazer denúncias anônimas. Eu adoro receber sugestões, escuto muito o que as pessoas com deficiência tem a dizer sobre o meu trabalho.

Se você passou por algum local em São Paulo que não conta com acessibilidade, denuncie: (11) 3242 9620 (Comissão Permanente de Acessibilidade).
 
Para saber mais sobre o tema e tirar dúvidas com a arquiteta, assine www.twitter.com/acessibilidade ou visite o seu blog.

Dados IBGE/2000

. 14,5% da população brasileira tem alguma deficiência
. 27 milhões de brasileiros
. Em São Paulo são 3 milhões de pessoas com deficiência ou com mobilidade reduzida
. Estudo divulgado pelo IBGE, feito a partir dos censos de 1991 e de 2000, mostra que na década passada havia 7 milhões de brasileiros com mais de 65 anos de idade
. Nove anos depois, esse contingente chegou a 9,9 milhões, um acréscimo de 41%


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Arquiteta utiliza Twitter para divulgar acessibilidade