“Eu me divirto com os derrotados sem talento em conflito com minhas aparições na TV, desqualificando minhas ações” canta MV Bill na música “Sou Eu” de seu último álbum, o Causa e Efeito. E foi inspirado nessa frase que o Virgula conversou com exclusividade com o “soldado do morro”, homem que sempre deu voz às periferias e agora faz parte do elenco de Malhação, a novela teen de maior sucesso no país.
Bill não é celebridade, não é o cara que você imagina dando pinta na praia e sendo fotografado por paparazzi. O “Mensageiro da Verdade” não perde tempo, batalha por ele e por toda comunidade carente, levando o sentido da palavra globalização ao seu conceito mais profundo. MV Bill ainda não sabe como vai lidar com esse novo tipo de fama, mas sabe muito bem o que quer com sua exposição cada vez maior. “Minha participação acho que ajuda a mostrar pros jovens das favelas que eles podem ser o que quiserem!”, comemora.
Em cena no programa Malhação como Antônio, “um professor de matemática e física, oriundo da periferia, que se formou sem o sistema de cotas. Hoje é bem sucedido, tem grana, é viúvo, tem uma filha e leciona no colégio mais caro do Rio de Janeiro”, Bill acredita poder falar para mais pessoas e levar uma mensagem positiva aos jovens da periferia, além de garantir mais respeito na forma de retratar a realidade da pobreza – “sempre ligada a violência, sempre marginalizada e em formato pejorativo” – nos programas televisivos.
O falso respeito que as classes mais baixas vem ganhando são atribuídos ao aumento do poder de compra – “O crescimento econômico das classes ‘c’ e ‘d’ fez a postura de alguns veículos de mídia ser modificada, com isso alguns pequenos passos foram dados, mas ainda tá muito aquém do ideal” -, mas não a uma mudança verdadeira. É aí que entra a nova fase da novela.
Apesar de ainda serem poucos os negros na televisão – muitos se comparado a anos atrás, poucos se comparado a realidade racial brasileira -, o processo de inclusão vem acontecendo: “Acredito que esses espaços não serão doados, serão conquistados!”. Essa é a crença de MV Bill, nada deve ser de graça.
É claro que o poeta e porta-voz de uma realidade distante daquela exibida pela rede Globo não acredita que mudará o mundo a partir da Malhação – “Não acho que devemos esperar que ‘Malhação’ mude a realidade social do Brasil. Embora o programa traga uma nova temática, um pouco diferente da habitual, não acho que um programa de meia hora diária vá mudar o histórico de exclusão entre a televisão e o povo periférico”. Bill acredita que quem pode mudar esse panorama é o povo.
“Fui convidado pelos diretores e o autor para participar, pois eles queriam trazer um tom mais real à trama e disseram que eu traria credibilidade aos assuntos como gravidez precoce, bolsas pra alunos da rede pública, uso de preservativos, pretos bem sucedidos, casais inter raciais, a importância da educação… Como sempre, questionei pedindo mudanças, deu vontade de participar desse desafio”, explica o ator novato, apesar de acreditar que uma novela não consiga “transmitir fielmente o que é a realidade favelada”.
O rapper acredita que o orgulho racial exibido na televisão influencia positivamente os jovens e espera que os exemplos mostrados ali possam dar novas visões de futuros aos adolescentes das periferias. “Chega de ter o crime como única alternativa. Muitas vidas já foram perdidas com essa única via; as comunidades precisam de mais lideranças e menos criminosos”.
Quando perguntado sobre a cultura brasileira de associar o sucesso e o crescimento profissional e financeiro a uma tentativa de abandonar as raízes, o passado e sua condição humilde, Bill é taxativo: “Não chamaria de cultura brasileira, mas de comportamento medíocre dos derrotados! A fila anda e o bonde não para!”. E a gente concorda com ele!
Aproveitando o orgulho negro de Bill, conheça as maiores cantoras negras da história!