A Tropa da Solidariedade, projeto social criado para ajudar pessoas em situação de rua e famílias periféricas cariocas por meio de educação, cultura, alimentação e revitalização urbana, tem ampliado a sua atuação para além das fronteiras brasileiras. O seu fundador, o rapper Shackal, está no Canadá alinhando diversas parcerias com entidades locais para transformar a Lapa, no Centro do Rio, num grande polo criativo, artístico e educacional. No entanto, diferentemente do respeito e admiração conquistados na América do Norte, ele tem enfrentado muitas barreiras e preconceito no Brasil.
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– Estamos trabalhando arduamente, com muita dificuldade, falta de patrocínio, pouco apoio para trazer artistas ao Brasil, para transitar em território canadense, mas estamos costurando essas conversas, esse intercâmbio cultural tão importante entre Brasil e Canadá. Sei que sou uma pessoa preta retinta e que sou uma pessoa preta em qualquer parte do planeta. E isso me impulsiona. Acredito na força da arte, sei da problemática no meu país para as pessoas pretas, para os homens e as mulheres alcançarem seus objetivos, mas a gente acredita na ideia para superar esses obstáculos. Estamos atentos, super atentos. Há muita dificuldade. É uma luta, mas precisamos manter o foco. Nosso povo é de luta – desabafa o rapper.
Rio Mural Festival
Um dos projetos liderados por Shackal por meio da Tropa é o Rio Mural Festival. Trata-se de uma parceria com o Vancouver Mural Festival, um dos maiores eventos de arte urbana do mundo. A iniciativa vai promover uma grande maratona de arte nas ruas no Centro, com atividades a céu aberto, shows e intercâmbio entre artistas do Brasil e do exterior.
Em 2023, o Vancouver Mural Festival acontece entre até 13 de agosto. Shackal se apresentará no dia 13, mostrando o que vem fazendo no Rio de Janeiro e muita música com o Tropabloco, uma das vertentes do projeto.
– Com patrocínio ou não, vamos fazer o nosso melhor, mostrar a nossa cultura, o bloco, o samba, o funk, a culinária brasileira… vamos ter uma rapaziada fazendo um barulho no centro de Vancouver como nunca se viu. Com o que a gente tem de melhor, que é o nosso carisma, o amor pelo que fazemos. A felicidade do povo brasileiro, a força do abraço do povo brasileiro. Estou sendo abraçado por pessoas que eu não imaginava e sendo chutado por pessoas que já sabia que me chutariam, pois me chutam sempre. Isso não vai nos paralisar, pois só a cultura cura – ressalta Shackal.
Dificuldades no Brasil e apoio de famosos
Diferentemente do prestígio internacional, Shackal tem encarado muitas dificuldades no Brasil para implementar as iniciativas da Tropa. Segundo o empreendedor social, o racismo estrutural é a maior barreira na busca de apoio.
Por outro lado, um grupo de famosos se uniu para mostrar que a classe artística precisa estar atenta ao seu papel social. Nomes como Adriana Birolli, Gregório Duvivier e Ernesto Piccolo têm manifestado seu apoio à Tropa e pedido que entes públicos e privados se unam à causa de fazer da arte uma ferramenta de transformação social.
– Não tem nada mais importante do que projetos como a Tropa da Solidariedade, pois a saída para o problema do Brasil é coletiva e acho que os artistas precisam tomar parte dessa pauta, pois temos alcance. E, quanto mais alcance você tem, maior também é a responsabilidade. E eu acho que a nossa responsabilidade é transformar o Brasil. E todo mundo é importante nesse processo. Por isso, convoco artistas, celebridades e influencers a estarem juntos nessa causa. A arte é política. A arte é ativismo – destaca.
“Nós por nós”
Em 2020, Shackal criou a Tropa da Solidariedade, que começou no início da pandemia com o objetivo de ajudar as pessoas mais vulneráveis e à margem da sociedade com itens básicos de higiene e de alimentação, com alimentos orgânicos obtidos diretamente com pequenos agricultores fluminenses e, através de mutirões, juntam um grupo numeroso e diverso de voluntários para preparar refeições e distribuir aos moradores em situação de rua. Desde então, o movimento já impactou mais de 20 mil famílias.
– Temos histórias silenciadas pela dor, o abandono, a indiferença e a falta de perspectiva. Nessas ações, conseguimos juntar a cidade partida, levando para um campo de reflexão pessoas de diferentes bairros da cidade. Assim nasceu a Tropa: de um desejo de sobrevivência e com muita sede de uma sociedade mais justa e digna para todos. Devido ao sucesso dos mutirões, conseguimos a doação de um espaço no Beco dos Carmelitas, que se tornou a nossa sede. Lá, realizamos uma série de atividades com enfoque social e recebemos doações diversas, como agasalhos, alimentos e itens de higiene básica – explica Shackal.
Beco do Pantera
A ocupação e a revitalização de espaços públicos estão entre as prioridades da Tropa. Por isso, reuniu nomes de destaque da arte urbana com o propósito de transformar o antigo Beco dos Carmelitas, na Lapa, num pólo onde educação e cultura vão reverberar a oportunidade de uma vida melhor para quem mais precisa: o Beco do Pantera. O local é a pedra fundamental do projeto e vem passando por uma profunda intervenção artística de Airá Ocrespo, Agrade Camíz, Bragga, Brutto, Carlos Bobi, Carol Lyra, Jotape Pax, Lídia Viber e Marcelo Ment. A finalização está prevista para este ano.
– O Beco do Pantera será um ponto de interseção entre cultura, arte, educação, empreendedorismo e impacto social. Para isso, contamos com o apoio desses artistas – destaca o rapper.
Tropa da Educação
O ano começou com o projeto dando mais um passo importante na sua história: a criação da Tropa da Educação, iniciando com um curso de inglês voltado para crianças. As aulas são semanais, sempre nas tardes de quarta, e a turma já conta com 10 alunos.
A ideia é ampliar a ação com mais turmas, matérias e abrir oportunidades para jovens e adultos. Mas, para dar mais esse passo, precisa e está em busca de apoios e parcerias.
Grupo de autoajuda
Outra frente importante da Tropa é o auxílio a quem luta para se livrar do vício das drogas. Os encontros acontecem às terças e quintas, das 21h às 23h.
– Acabo de fazer sete anos longe do álcool e das drogas. Afundei-me e me recuperei. Agora estamos abrindo as portas para que outras pessoas possam usufruir de uma vida longe do álcool e dos entorpecentes. Tenho muito orgulho de dizer que podemos ajudar – ressalta.