Famosos na peça de César Polvilho ou porque será que Sabrina se escondeu na saída do teatro?
Créditos: Manuela Scarpa / Photo Rio News
Sei, você entrou aqui nessa matéria com a certeza que veria alguma fofoca ou baixaria de famoso. Será que a Sabrina Sato ainda está com o deputado? Quem do Pânico apareceu por lá? Houve algum bafo na performance de César Polvilho, ou melhor, Eduardo Sterblitch que fez a apresentação de sua agora comentadíssima peça Minhas Sinceras Desculpas, no HSBC Brasil, na Chácara Santo Antônio, em São Paulo, na noite de sábado (07)? Sim, você veio aqui achando que era o Virgulando, nem atentou que já mudamos de nome para Virgula Famosos, mas sim, continuamos cobrindo a baixaria humana em forma de notícia. É o que vende. E ninguém quer pagar, ou melhor, gastar o seu tempo lendo sobre o nada. Mas será que o que você lê todo dia nos sites de fofocas não é na verdade o suprasumo do nada?
Bom, tenho chefe que paga meu salário para produzir notícias, então vou escrever esse texto para vocês. A peça daquele que vocês conhecem como o cara que se pinta de prateado do Pânico é um dos grandes acontecimentos artísticos dos últimos tempos. Antes que me trollem porque Virgula e Pânico são parceiros e tal e isso pode não passar de um jabá, eu assumo, fui pra ver um stand up comedy com mais do mesmo – afinal tá na modinha, dá dinheiro. Vai umas celebs, dá-se umas risadas amarelas e depois podemos, livres, ir jantar uma pizza em algum lugar pra complementar o programinha cultural da semana. E também iria entrevistar quase que cumprindo tabela o ator com perguntas como: De onde veio sua inspiração? Quanto você gastou pra produzir a peça? Ainda vai ter apresentações em que cidades?
[Um adendo: eu gosto pra caralho de escrever, gostaria de ser o Paulo Francis, sabe, Paulo Francis é que é macho pra caralho, tripudiava com os governantes, detonava tudo e todos e morava em Nova York. É, eu moro em um quarto e sala, tenho 43 anos e ainda tenho que todo dia bater ponto pra não ter meu salário descontado. Enfim, nem sei porque quis ser jornalista, profissão de merda]
Então, – calma, eu preparei um final muito importante , aguentem até o fim -, o lugar que a peça é apresentada não é um teatro tradicional e sim uma casa de show, com as mesas dispostas na perpendicular ao palco, isto é, tem que fazer a egipcia pra assistí-la. Isso eu já achei interessante, pois a arquiteta Lina Bo Bardi e o Teatro Oficina oferecia um desconforto proposital na plateia. Cadeiras ruins para peças longas. Aliás, uma plateia composta em sua grande maioria por muitas chapinhas loiras acompanhadas por homens que sairam da academia com músculos em forma. Gente bonita, nada “diferenciados”.
A peça começa e chega aquela porção de frituras para essa gente nada “diferenciada”. Enquanto elas abrem a boca para saborear as fritas ou o provolone, um vídeo apenas com bocas falando é projetado. Me veio logo na cabeça Samuel Beckett [um dos maiores dramaturgos de todos os tempos e defensor do caos no teatro] e uma peça que assisti dele feita pela grande Maria Alice Vergueiro. Era iluminada apenas a boca e ela falava sem parar coisas malucas. Mas não foi pelo Beckett, nem pela contribuição no Ornitorrinco que ela ficou conhecida. Todo mundo sabe quem ela é pelo vídeo da maconha, o Tapa na Pantera, lembram?
Maria Alice do Tapa acima e da Pantera becketiana abaixo:
De certa forma ela é uma atriz do porte de uma Fernanda Montenegro, mas não faz novelas, por isso até o vídeo ela era bem pouco conhecida assim como o Eduardo Sterblitch que realmente só fez sucesso quando virou o Serginho, Freddy Mercury prateado, etc, etc do Pânico. Tem um pouco de Maria Alice em Polvilho ops, Eduardo nisso, o ator que o pop reconheceu pelo avesso. E todos foram lá para ver e rir do Pânico, mas saíram alguns em verdadeiro pânico, muitos riram muito, outros ficaram encanados pelas suas próprias risadas. A todo instante, nossa risada é questionada e posta em reflexão e cheque. “O que tem de engraçado no fato do meu pai vender x-bacon?”, pergunta Eduardo para uma plateia que tinha acabado de se gargalhar sobre esse mesmo fato.
Podemos falar que a peça é sobre o teatro, a descontrução do teatro ou sobre os perdedores que nós adoramos chamar de “losers” – aí também é sobre os atores de teatro perfeitos losers de sempre – ou ainda sobre a relação arte versus mercadoria. Mas a peça desse mais jovem e brilhante filho de Beckett é sobre o nada, sobre o absurdo do nada, não o nada impassível, mas aquele que questiona a nossa existência e valores.
E naquele momento eu, editor de Famosos, me lixei se o Fiuk estava ou não reatando com a ex-namorada. Naquele momento eu só queria entender completamente enlouquecido como esse ator Eduardo Sterblitch conseguiu me explicar a ponte entre Beckett e o comediante Buster Keaton.
[Só uma informação, o grande Keaton, já um mito do cinema hollywood resolve fazer o único filme de Beckett, chamado Film, em 1965]
Buster Keaton criou uma escola de humoristas, ele era o cara que sempre estava impávido diante das mais absurdas situações, nunca ria. Sua impassividade é copiada até hoje quando os humoristas contam uma piada e seguram o riso. Isso que eu chamo de riso de Buster Keaton – ou não sorriso – e foi isso que Eduardo nos ensinou na peça. Ao pedir que não ríssemos de certas coisas e ao repetir pedindo pra ninguém rir de seus chavões – momento esperado por muitos – dos personagens do Pânico. Ele caoticamente nos colocou o não sorriso de Buster Keaton na cara.
Minhas sinceras desculpas se não contei nenhuma fofoca e nem nada que te interessasse, pois tentei humildemente fazer um texto sobre o nada, sobre esse nada que une Beckett, Buster Keaton e Eduardo Sterblich.
