Uma das maiores atrizes do Brasil nos últimos anos, Camila Pitanga passou pelo sofrimento de ver o amigo e companheiro de cena em Velho Chico, Domingos Montagner, ser levado pela correnteza do rio São Francisco e acabar morrendo na semana passada.
A atriz, que recebeu doses gigantescas de carinho do público, também foi alvo de piadas de mau gosto e teorias insensíveis sobre o que de fato teria acontecido naquela tarde.
Agora, com a passagem da tragédia e a tentativa da rotina de voltar ao normal, Maria Ribeiro, também atriz e escritora, dedicou sua coluna no jornal O Globo especialmente para Camila, reverenciando seu trabalho e lhe dando ainda mais carinho.
“Que tristeza, companheira. Que tristeza. Domingos era um ser que não acabava nunca, e não é à toa que seu nome próprio era também um plural, e também um gerúndio, uma gramática, um “Dicionário Houaiss” daqueles gigantes e que quase não existem mais. Gerúndios continuam, Camila. Gerúndios não terminam a ação. Não têm ponto final. Seguem existindo. São reticentes e donos do tempo”, escreveu ela.
A esposa do ator Caio Blat contou, inclusive, de um caso antigo que envolveu as duas no passado. “Eu tinha comentado no Saia Justa (programa do GNT) sobre um namorado de adolescência — por quem tinha sido completamente apaixonada — ter saído com você logo depois de terminar comigo. E continuei dizendo que o mais chato de tudo havia sido não ter podido sequer ficar com raiva, afinal, se eu fosse ele faria o mesmo — eu e a torcida do Flamengo. Sacanagem a pessoa ser alta, gata e legal ao mesmo tempo”, brincou.
Maria deixou claro que queria falar sobre Camila e festejar o fato dela estar viva, ao mesmo tempo em que lamenta a morte de Montagner. “Quando você estreou na TV, se não me engano em uma série da Globo sobre jovens modelos, o país todo parou pra dar valor à nossa cor, e, em meio à ditadura televisiva das louras de olhos claros, você chegou quebrando tudo, supra-Gabriela, Chapéu Mangueira, Pitanga-morena-rosa”, disse ela.
A atriz segue: “você fez questão de gritar sua negritude onde quer que fosse, e nada no Brasil importa mais do que isso. E, além disso, você foi amadurecendo linda, se transformando na grande atriz que hoje é, e sempre comprometida com causas invisíveis, como o trabalho escravo e a preservação do meio ambiente, e sempre na suavidade, rindo, sem nunca ostentar a moça politizada ou o tanto de formosura”.
Para encerrar, Maria Ribeiro ofereceu todo seu apoio nesse momento difícil pelo qual a companheira passa. “E agora você passou por tudo isso, e eu queria dizer que, ao lado da imensa dor de termos perdido artista tão especial e — mais grave e importante — pessoa tão especial, reganhamos você, e isso não pode ser deixado de lado. Domingos teve o privilégio da tua parceria, da tua mão estendida, do teu riso aberto, da tua inteireza, e, principalmente, da tua companhia. Nós, na plateia, também temos. Um viva pra você, Camila. Obrigada por estar aqui”, finalizou.
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