Os novos musicais que estão em cartaz no teatro
Vai longe o tempo em que montar um espetáculo musical no Brasil era trabalho digno de Hércules. Hoje o mercado local é o terceiro maior produtor de musicais do mundo, atrás somente de EUA e Inglaterra. Mas nem sempre foi assim.
Desde a década de 60, o teatro brasileiro buscou, em diversos momentos, produzir por aqui versões nacionais de sucessos da Broadway – a primeira foi My Fair Lady, montada em 1962 com Paulo Autran e Bibi Ferreira.
Depois, foi a vez de Hair, em 1970, que trazia no elenco um time de atores que fariam história: Aracy Balabanian, Armando Bógus, Sonia Braga, Antonio Fagundes, Ney Latorraca, Altair Lima, Ariclê Perez, Nuno Leal Maia…
Nos anos 70, novas investidas vieram, com montagens de Rocky Horror Show e outros musicais pop. Na época, também já se faziam experiências com musicais originais, criados no Brasil – o maior expoente do ramo foi Chico Buarque, então astro da MPB, que escreveu e compôs musicais antológicos: o censurado Calabar (1973), Gota D’Água (1975), A Ópera do Malandro (1978). Chico já havia investido na área nos anos 60, ao musicar o poema Morte e Vida Severina (1965), e criando o musical Roda Viva (1968).
Nos anos 80, chegavam algumas superproduções: A Chorus Line (1983), produzida por Walter Clark e com a adolescente Claudia Raia no elenco; Evita (1983) e Cabaret (1989).
Mas foi somente no final dos anos 90, em 1999, com a montagem de Rent, que começou a nascer uma indústria de musicais brasileiros. Les Misérables (2001) resgatou o Teatro Paramount, em São Paulo, rebatizado como Teatro Abril – hoje Teatro Renault. O local passou a ser o lar das produções da então CIE (hoje Time for Fun), que levou aos palcos franquias da Broadway como A Bela e a Fera (2002), O Fantasma da Ópera (2005), Cats (2010), A Família Addams (2012), O Rei Leão (2014)…
Simultaneamente, o veterano diretor Jorge Takla (que dirigira Cabaret em 1989) voltou aos musicais, pilotando My Fair Lady (2007), West Side Story (2008), O Rei e Eu (2010), Evita (2011), Jesus Cristo Superstar (2013).
O global Miguel Falabella também ergueu uma fábrica de musicais, em parceria com a Chaim Produções, levando ao palco Os Produtores (2008), Hairspray (2009), A Gaiola das Loucas (2010), Alô Dolly (2013)…
Enquanto isso, os cariocas Charles Moeller e Claudio Botelho criavam um pequeno império de musicais, montando Sweet Charity (2006), A Noviça Rebelde (2008), Avenida Q (2009), O Despertar da Primavera (2009), Gypsi (2010), O Mágico de Oz (2012), num total de 33 musicais desde 1997.
Alguns espetáculos da grife Moeller & Botelho foram produzidos pela Aventura Entretenimento, como Hair (2010), A Noviça Rebelde, Gipsy. Até que a Aventura se lançou na produção de seus próprios musicais, optando por produzir obras ligadas à cultura brasileira, e se afastando do universo da Broadway.
Nessa nova fase, o primeiro trabalho foi Rock in Rio – O Musical (2012), seguido de Tudo Por um Popstar (2013). E então veio o estrondoso sucesso de Elis – A Musical (2014).
O espetáculo sobre Elis Regina se insere na nova tendência de musicais brasileiros, que investem nas biografias de grandes nomes do pop-rock nacional e da MPB. O primeiro foi Tim Maia – Vale Tudo (2011). A partir dali, além de Elis, outros artistas viraram tema de musicais: Rita Lee Mora Ao Lado, Cazuza – Pro Dia Nascer Feliz, Cássia Eller, o Musical, Milton Nascimento…
Essa tendência promete ser um dos caminhos mais férteis dos musicais vindouros: buscar em assuntos brasileiros os novos temas dos espetáculos. Essa é a opção da Aventura, como comenta um de seus sócios, o empresário Luiz Calainho: “Decidimos investir no produto nacional até para dar brilho aos nossos artistas, cantores, compositores. A gente tá criando uma linguagem brasileira de musicais. Aquela coisa impostada da Broadway, aquela coisa dura, é ótimo pra Broadway mas eu particularmente não gosto”.
Calainho afirma que a Aventura não produzirá mais versões da Broadway, preferindo produzir somente conteúdo nacional. Depois de Elis (universo da música), a empresa produziu Se Eu Fosse Você (inspirado nos dois filmes da Globo Filmes) e está produzindo Chacrinha Velho Guerreiro (sobre o ícone televisivo Abelardo Barbosa). “Até porque Chacrinha é o maior mito da televisão brasileira ever!”, diz Calainho.
“Mesmo os musicais nacionais da Aventura já são com um tempero absolutamente brasileiro, muito nosso”, prossegue o empresário. “Chega de receber só cultura internacional ou americana. Eu já engoli demais cultura americana e europeia. Nada contra, é lindo, mas agora é chegada a hora da gente valorizar a cultura brasileira”, argumenta Calainho.
“Eu vou ficar falando de Mágico de Oz, de Moulin Rouge, de Chicago? Não quero mais falar de nada disso. Quero falar de Chacrinha, quero falar de Raul Seixas, e assim vai”, conclui.
Na sequência, a Aventura pretende lançar o espetáculo Todo DJ – Um Musical na Pista, baseado no livro Todo DJ Já Sambou, de Claudia Assef (que chega aos palcos no 1º semestre de 2015), e Barbaridades, um musical sobre a terceira idade, com texto escrito por Zuenir Ventura, Luiz Fernando Veríssimo e Ziraldo; entre outros projetos.
E o mercado dos musicais brasileiros segue mais aquecido do que nunca. A Time For Fun se prepara para estrear mais um musical trazido da Broadway, Mudança de Hábito, que estreará no Teatro Renault no lugar de O Rei Leão; Cássia Eller, o Musical, segue em turnê pelo Brasil (estará em São Paulo a partir de setembro e em Brasília de dezembro a janeiro); Cazuza – Pro Dia Nascer Feliz está em cartaz em São Paulo até final de setembro.
Na safra atual ainda há espaço para homenagens aos 70 anos de Chico Buarque. Duas montagens de A Ópera do Malandro estão em cartaz (no Rio e em São Paulo), além de O Grande Circo Místico e Todos os Musicais de Chico Buarque em 90 Minutos – este último, produzido por Moeller & Botelho.
Produzidos pela Aventura, Se Eu Fosse Você – O Musical segue em cartaz em São Paulo até final de setembro, e Chacrinha Velho Guerreiro estreia no Rio em novembro.