Cristina Maseda até tentou ser artista: depois da faculdade de jornalismo, resolveu cursar cinema na Espanha, na Universidade de Compostela. Mas nunca exerceu a profissão de cineasta. “Sempre fiquei na área de projetos e gestão cultural. Não adianta. Definitivamente, eu não sou artista”, ela brinca. Nascida e crescida na cidade de Paraty, litoral do Rio de Janeiro, Cristina, ou Cris, como prefere ser chamada, estudou em São Paulo, morou fora do país por sete anos e há 11 está de volta à terra natal.

Quando voltou, encontrou uma cidade “completamente diferente” na área de cultura. Em 2003, logo que chegou, se engajou na realização da Flip, a Feira Literária de Paraty, e até hoje é coordenadora geral da Flipzona e da Flipinha, eventos paralelos à feira, e dos programas educativos que acontecem ao longo do ano no escopo da própria Flip.

Como se já não tivesse trabalho suficiente, em maio do ano passado Cristina resolveu se desafiar mais uma vez. Juntou um grupo de pessoas e formou a Associação Paraty Cultural, ONG que se candidatou a gerir a Casa da Cultura de Paraty. Hoje, o lugar, instalado num casarão erguido em 1754, é destaque fundamental na programação da cidade, oferecendo uma programação semanal de atividades e eventos de música, artes plásticas, folclore, etc. E é claro que Cristina sonha em voar ainda mais alto: quer criar duas escolas livres e investir na formação de artistas plásticos e músicos.

Por que você resolveu se candidatar a gerir o espaço da Casa da Cultura e quais foram as dificudades enfrentadas?
Acompanho a história da Casa desde sempre, e ela passou por momentos difíceis, enfrentou problemas de gestão durante um tempo, teve várias dificuldades. Nós nos candidatamos em maio para assumir a casa e fomos os únicos concorrentes, porque acho que não tem muita gente querendo administrar espaços públicos, não é? Com parceiros como a Fundação Roberto Marinho e a prefeitura, reformamos o casarão, fizemos as adequações necessárias, e começamos a trabalhar.

Quais são os objetivos de vocês na Casa?
Somos um grupo bem coeso de curadores, composto por pessoas com formação artística e técnica – isso faz diferença. Somos profissionais da área cultural. Porque não basta só ser artista, e não basta só ter vontade, para fazer bem feito. É preciso ter vontade e formação artística. Mas várias pessoas colaboram e fazem uma história diferente. Nossa vontade é de fazer renovação. Passamos a funcionar com uma programação permanente, que inclui eventos semanais noturnos, como a Quinta Justa, com apresentações de músicos locais, a Quarta Jovem, que oferece shows de bandas jovens, rodas de ciranda às sextas, com mestres da cultura caiçara. Sábados têm oficinas e contação de histórias para a criançada e, aos domingos, Cineclube, porque Paraty não possui sala de cinema.

O que você nota de diferente na Paraty que deixou para estudar fora nos anos 90 e na de hoje, na área cultural?
É outra cidade. Tão diferente que dá até uma certa nostalgia. Eu penso: “Nossa, é coisa demais acontecendo, podia ser um pouco menos!” (risos). Hoje a cidade é muito movimentada, tem grandes eventos culturais o ano inteiro. Flip, Paraty em Foco, festival de jazz, Eco Fashion… É outra cidade mesmo. Antes, a gente esperava que viessem pessoas de fora, na alta temporada, e depois passava o resto do ano parado. Agora não, Paraty se tornou de fato um destino cultural o ano inteiro. Você respira cultura aqui.

Como são escolhidos os artistas e eventos que ocupam a Casa?
O grupo de curadores escolhe as exposições, a direção executiva escolhe, e então convidamos os artistas, ou porque há alguma efeméride, ou apenas porque queremos aquele artista. Mas lançamos a primeira convocatória da Casa para artistas nacionais, que termina neste 31 de  janeiro, e recebemos propostas e portfólios do país todo, o interesse superou nossas expectativas. Um grupo de pareceristas deve escolher seis artistas e nós vamos dar apoio logístico e de divulgação para os contemplados. Nossa ideia é ter aqui residências artísticas.

Quais são os sonhos de vocês em relação à Casa? O que ainda pretendem fazer?
Nosso sonho, e maior desafio, é implantar aqui uma escola livre de artes visuais e uma escola livre de música. Queremos começar a fazer formação cultural, essa é nossa principal aposta. Já apostamos na difusão, é o que estamos fazendo por enquanto, mas a gente acha fundamental também empreender o caminho da formação. Porque é preciso dar oportunidade às pessoas de Paraty, crianças, jovens, adultos. Queremos que eles participem como protagonistas deste processo. Não é uma questão de todo mundo se formar artista, é dar à população outras referências, dar a chance de abrirem os olhos e enriquecer os ouvidos culturalmente. Senão fica tudo muito superficial na Casa: o evento vem de fora, o turista vem para ver, e o morador fica em posição de subserviência em relação a tudo, não tem condições nem de participar dos eventos culturais que acontecem na cidade.

Como você avalia os resultados destes meses à frente da Casa?
Tem aumentado muito o número de pessoas que frequentam a Casa. No verão estamos com esta programação especial de quarta a domingo, vêm crianças, jovens, gente de todas as idades. Estamos com quatro exposições em cartaz atualmente. Ficamos fechados dez dias em dezembro para fazer uma reforma pontual, reabrimos com força total no fim do ano.

 


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À frente da Casa da Cultura de Paraty, Cristina Maseda promove mudanças radicais na programação