A professora de sociologia Luiza Oliveira, de 28 anos, expôs em suas redes sociais uma acusação de estupro contra um integrante do Movimento Mais, corrente interna do PSOL.
O crime teria ocorrido em 14 de outubro de 2016. Na ocasião, Luiza, que mora em Brasília, segundo ela mesma, teria viajado a São Paulo para visitar um amigo em busca de superar um quadro de depressão após terminar um relacionamento.
No penúltimo dia em que esteve na capital paulista, ela relatou ter consumido bebida alcoólica em excesso e ficado embriagada. Enquanto isso, seu amigo e seu colega de apartamento participavam de uma reunião política.
O Mais não fazia parte do PSOL na época. O movimento havia acabado de nascer como uma dissidência do PSTU e não integrava nenhum partido político, até passar a fazer parte do partido de Luciana Genro, Jean Wyllys, Ivan Valente e outros a partir de agosto deste ano.
Segundo a professora, quando os amigos voltaram da reunião, eles ainda foram a um bar, o que acabou deixando-a “completamente embriagada”. Foi aí que teria começado o assédio. “O cara que morava com meu amigo insistiu pra ficar comigo. Disse que não, duas vezes. Não tive o direito de decidir. Sem que eu tenha memória ou consciência do que se passou, acordei no seu quarto”, escreveu ela.
Luiza fez o boletim de ocorrência no dia 14 de julho passado. Ela explicou a razão da demora: “como muitas mulheres, não reconheci logo que foi estupro”.
O B.O. foi feito na 1ª Delegacia de Defesa da Mulher, no centro de São Paulo, e nele foi anexado um relatório médico, onde é indicado que a quantidade de álcool no sangue era “capaz de evidenciar os impactos da embriaguez sobre as capacidades funcionais da vítima”. A denúncia foi feita também no PSOL e no Mais. Ela, porém, afirma não ter sido apoiada nem pelo partido, nem pelo movimento.
“Apesar de se dizerem feministas, eles inocentaram o cara e desconsideraram os elementos apresentados (prints, áudios, extratos bancários, laudo médico)”, diz.
Em entrevista ao site Ponte, Luiza afirma que também é filiada ao PSOL, mas critica a forma como o partido levou o caso. “Espero que ele seja expulso do partido e seja responsabilizado pela justiça. Espero também que todas as pessoas que cometeram violência verbal e psicológica, calúnia e difamação, acobertamento do estupro, sejam punidas pelo partido. Que o Mais se retrate publicamente e que nunca mais faça isso com outras mulheres”, pediu ela.
Outro lado
Em nota publicada nas redes sociais na terça-feira (26), o Movimento Mais diz ter a intenção de investigar o caso de forma independente. Eles também afirmam que, na época da denúncia, Luiza não apresentou nenhum laudo médico, o que teria dificuldade a apuração.
O movimento diz, ainda, que nenhuma testemunha ouvida por eles confirma a versão de Luiza. Leia abaixo:
PSOL também se posiciona
O PSOL também divulgou em seu site uma nota oficial sobre o caso. Leia:
A Setorial Nacional de Mulheres do PSOL recebeu no dia 26/09 e acolheu grave denúncia de estupro feita por uma companheira, que tem sido tema de debate nos movimentos. O acusado é militante de uma organização que, recentemente, decidiu por seu ingresso em nosso Partido.
De imediato, queremos manifestar nossa solidariedade à companheira, e nos colocamos a sua inteira disposição. Compreendemos o quanto é difícil reconhecer-se como vítima de violência e abuso e, principalmente, levar adiante a denúncia deste tipo de violência.
Nossa luta contra o machismo e o conservadorismo se dá todos os dias, por isso mesmo quando este tipo de denúncia feita pela companheira ocorre em nossas fileiras as providências devem ser enérgicas.
Desde que tomamos ciência da denúncia, no dia 26/09, nos dispusemos a participar de uma comissão de mulheres composta por várias organizações, uma reivindicação tanto da companheira denunciante como da organização MAIS, para tratar o caso. No dia 03 de outubro também será realizada uma reunião auto-organizada das mulheres do PSOL DF, onde milita a filiada denunciante, com o intuito de debater a grave situação e acolhê-la. Além disso, ela foi aconselhada a enviar uma denúncia formal para a Comissão Nacional de Ética do partido, instância responsável pela apuração de todos os casos de denúncias de desvio moral, mesmo o caso tendo ocorrido um ano antes do militante denunciado ter ingressado no PSOL.
Lembramos que o 5º Congresso Nacional do PSOL, ocorrido em 2015, aprovou por consenso uma resolução orientando o tratamento de casos de violência contra a mulher pela Comissão de Ética. Entre os indicativos definidos em congresso para qualquer caso desse tipo estão a celeridade na apuração e a possibilidade de afastamento imediato do filiado acusado durante o decorrer do processo, além de elencar punições para os considerados culpados, sendo a máxima a expulsão do partido. À exceção do afastamento do acusado das instâncias, a fim de que não se prolonguem situações de sofrimento à denunciante, todas as demais medidas só poderão ser levadas a cabo após apuração que assegure à denunciante a possibilidade de colocar todos os elementos que já se dispôs a fazer e também assegure ao denunciado seu direito de defesa.
Em meio a esse conjunto de encaminhamentos, nos defrontamos com posições que não condizem com o acúmulo e com as lutas feministas que travamos ao longo da nossa história.
O estupro de uma mulher a cada 11 minutos, um crime abominável e repugnante, evidencia a cultura do estupro presente em nossa sociedade machista e patriarcal, que objetifica o corpo e a vida das mulheres. Como manifestação desta cultura, estão a tentativa de justificar ou relativizar as denúncias realizadas por mulheres que, além de serem vítimas, ainda são expostas e desacreditadas, gerando um ciclo que perpetua esta cultura e violência brutais. Felizmente, como resultado das lutas feministas que travamos na sociedade, as mulheres vítimas de estupro não estão mais obrigadas a fazer um boletim de ocorrência para poderem acessar todos os cuidados e garantias a que têm direito para, minimamente, mitigar as sequelas físicas e psicológicas resultantes desse crime. Esses avanços nos animam a continuar na luta.
O feminismo ocupa um lugar de centralidade para a construção de uma sociedade justa e igualitária. Por isso mesmo, o fortalecimento da auto-organização das mulheres e das agendas feministas cumprem papel fundamental no combate à opressão de gênero e à conquista de direitos que revertam este quadro de desigualdade entre homens e mulheres no Brasil. As violências sistêmicas contra as mulheres são manifestações desta desigualdade historicamente construída, que se relacionam em múltiplos sistemas de desigualdades, como raça, etnia, classe, orientação sexual e identidade de gênero.
Estamos juntas nesta luta. A solidariedade nos fortalece e como setorial de mulheres do PSOL, acompanharemos de perto o processo.