(Da redação) Carmo é um filme brasileiro que vai dar muito o que falar em 2009. Semana passada, ele foi um dos destaques estrangeiros do festival americano Sundance, o maior evento do cinema independente americano, onde foi aplaudido e bateu recordes de frequência.
Carmo é um filme de estrada, de amor bandido, como define seu diretor Murilo Pasta. É um filme expansivo, de lugares abertos, que usa locações como a Bolívia e Mato Grosso do Sul, ao mesmo tempo em que procura capturar a tensão e o risco da vida na fronteira.
O elenco traz desde nomes conhecidos como Marcio Garcia, Rosi Campos e Seu Jorge até a revelação Mariana Loureiro no papel feminino principal. Murilo Pasta tem um currículo sólido no Reino Unido: além de dirigir vários curtas, alguns premiados, ele fez muitos trabalhos de ficção para a TV britânica e uma série de programas para a MTV européia.
Curiosamente, ele corre por fora quando se trata do país de onde veio. Rejeitado nos festivais do Rio de de Brasília, Carmo foi conseguir reconhecimento no exterior. Nada de novo para o diretor Murilo, que mora em Londres há 20 anos e não poupa críticas ao meio cinematográfico brasileiro. Para ele, o que imprera aqui é o provincianismo e só vive de fazer cinema quem vem de família rica.
O Virgula conversou com Murilo Pasta, que ainda está em Sundance, via email.
Resuma Carmo em uma frase.
Carmo é uma estória de amor bandido/road movie de fronteira, filmado no Mato Grosso do Sul, Bolívia e Andes argentinos.
Por que um road movie?
Porque o road movie é o gênero mais visceral e livre que existe. Num road movie, praticamente tudo vale. Mas, claro, dentro de uma estrutura muito precisa e consideravelmente rígida. Nas entrevistas que ando dando aqui nos EUA eu comparo road movies ao bebop jazz. Você tem o tema e sai improvisando que nem um louco, até que chega uma hora você tem que retomar o tema e amarrar o todo – senão você mata a audiência de tédio. É maravilhoso e divertidíssimo.
Como rolou de Márcio Garcia participar do filme?
O envolvimento de Márcio Garcia se deve à amizade dele com Murray Lipnik, que é um dos produtores executivos de Carmo. Murray trabalha com compra e venda de filmes no mercado internacional.
Márcio não era a escolha óbvia; Diamantino, o papel que ele interpreta, no roteiro original era um personagem sombrio, sinistro e letal. Mas eu me encantei com a energia de Márcio. Minha visão foi descaracterizá-lo, apagar o galã, totalmente. Eu adoro oferecer a atores papéis que são absolutamente o oposto do estereótipo em relação à percepção que o público tem deles. Então propus ao Márcio: uma prótese de nariz (nariz de batata), prótese dentária (dentes tortos e podres), cara suja, bronco, analfabeto. Ele adorou. E embarcamos nessa.
Eu, Márcio Garcia e Roberto Dávila estamos agora conversando a respeito de colaborar em um outro longa, Filhos do Morro, uma idéia original dele mesmo, Márcio. É uma mistura de Cidade de Deus e Tropa de Elite com mais ternura e humanidade. É uma estória muito bacana.
Como foram as filmagens no Brasil? Quanto tempo demoraram?
As filmagens foram uma loucura total, completa e absoluta. Duraram meras cinco semanas e meia. O orçamento infelizmente era limitado. Eram cerca de 110 locações, imagina isso em 5 semanas e meia. O tempo inteiro se deslocando. E filmar com carro é sempre complicado, você tem um monte de grips, câmera car, etc. Isso sem contar com o fato de termos uma equipe multinacional: o fotógrafo é irlandês e seus assistentes, ingleses; a equipe de som é espanhola; a fotógrafa de stills, suíça. Uma babel fervilhante, em perpétuo movimento. Foi delicioso. Todos trabalharam duríssimo, mas têm memórias fantásticas da filmagem.
O filme foi muito aplaudido aí em Sundance. Essa boa repercusão já rendeu frutos aí pelo festival? Como tem sido a social e o networking por aí?
Como consequência de Sundance, fomos convidados para fechar o 1º. Hollywood Brazilian Festival, nessa quinta-feira, 29 de janeiro, no lendário Chinese Theater, de Los Angeles.
A outra consequência da repercussão é que estou sendo caçado por uma batelada de agentes, managers e produtores americanos. Eu iria retornar ao Brasil no final de Sundance, mas tive que vir para Los Angeles para negociar meu futuro.
Ao final da competição, os programadores de Sundance me procuraram para revelar que Carmo, além de ter sido um dos filmes mais aplaudidos, bateu o recorde de menor número de abandono das salas de projeção durante o festival. Nas últimas 3 das 6 sessões – todas com ingressos esgotados, por sinal – nem apenas uma pessoa saiu da sessão antes do final, o que é um milagre.
Mas filme divertido não ganha prêmio, nem leva Oscar. Melhor do que isso, no entanto, é ser parado na rua, em Park City, e Salt Lake City, onde acontece Sundance, por pessoas de todo o tipo de nacionalidade querendo lhe contar o quanto amaram o filme.
Você declarou que o fato do filme ter sido rejeitado em festivais brasileiros foi "provincianismo e clientelismo". Vocês acham que questões além do mérito artístico entram em jogo na seleção desses festivais?
Alguma dúvida? Apenas para esclarecer: este ano, mais de 9 mil filmes do mundo todo se inscreveram para Sundance, entre curtas, longas e documentários. Só na nossa seção, World Cinema Dramatic Competition, foram submetidos 1012 filmes. Eles escolhem 16 longas para a competição. Ou seja, Carmo, e os outros 15 filmes selecionados, eliminaram, cada um, 70 longas. Para entrar em Sundance não adianta apadrinhagem, carteirada, troca de favores ou negociação escusa por debaixo do pano. Quem entra, entra por mérito artístico, ponto final. Carmo é um filme de estatura internacional.
O que aconteceu no Rio e em Brasília é um escândalo. Pessoalmente eu fico dividido entre chutar o pau da barraca ainda mais ou ficar na minha. Provincianismo é pouco pra descrever o que rolou. Esse pessoal faz safadeza com dinheiro público. E ainda me perguntam por que não volto para o Brasil em definitivo.
É mais fácil fazer cinema como gringo em Londres do que como brasileiro no Brasil?
Porque em lugares como Londres, Espanha (onde vou rodar meu próximo longa) e Estados Unidos você se estabelece por mérito e talento. Quem não conta com isso não nunca, nem em um milhão de anos, vai se estabelecer nes ses lugares. No Brasil, todo mundo sabe como são as coisas. Na verdade é imensamente triste.
É óbvio que eu gostaria de estar trabalhando no Brasil. Eu tenho uma filha, Rosa, de onze meses de idade, que nasceu e vive aí. Eu tive que deixar o país, há quase 20 anos, porque sou completamente apaixonado por cinema; eu definharia se não pudesse dirigir e escrever. No Brasil só vive de fazer cinema quem vem de família rica. Essa é a realidade.
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