As emoções são parte da vida de qualquer ser humano: um estudo publicado no Journal of Health Psychology apontou que os indivíduos experimentam algum tipo de sentimento em cerca de 90% do tempo, sendo que as emoções positivas ocorrem 2,5 vezes mais do que as negativas. E, quando elas vêm à tona, seja por tristeza ou alegria, o choro surge como uma válvula de escape, como uma forma de restaurar o equilíbrio emocional, segundo estudo da Universidade de Yale.
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Entretanto, para algumas pessoas, pesares ou dores não funcionam como gatilhos imediatos para o choro. Uma revisão sistemática de estudos internacionais publicada no Comprehensive Psychiatry encontrou uma prevalência média de 30% de adultos que relataram dificuldade ou inabilidade de chorar por questões sociais, de saúde ou desconhecidas.
“Por isso, pessoas que não conseguem chorar podem ser mais tensas, estressadas e ansiosas, já que não têm no choro um meio de aliviar as emoções”, afirma Monica Machado, psicóloga e fundadora da Clínica Ame.C, e pós-graduada em Psicanálise e Saúde Mental pelo Instituto de Ensino e Pesquisa do Hospital Albert Einstein.
Diversos fatores podem contribuir para a supressão emocional, dificultando a capacidade de chorar. Neste 23 de abril, Dia do Choro, especialistas apontam as possíveis causas por trás das lágrimas represadas.
Experiências na infância: para quem cresceu em um ambiente carente de apoio e validação emocional, é possível que existam dificuldades ao reconhecer e expressar sentimentos. Um estudo publicado na Frontiers in Psychology, por exemplo, sugere que o apego evitativo está associado a emoções reprimidas e à crença de que chorar não é uma forma saudável de expressar emoções.
Segundo Danielle H. Admoni, psiquiatra geral e da Infância e Adolescência, pesquisadora e supervisora na residência de Psiquiatria da Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP/EPM); as vivências durante a primeira infância desempenham um papel significativo no desenvolvimento neuropsicomotor das crianças.
“Os neurônios-espelho, que são ativados em resposta a comportamentos observados, podem condicionar a criança a anular emoções, se ela estiver cercada por indivíduos emocionalmente reservados”.
Conforme a médica, especialista pela Associação Brasileira de Psiquiatria (ABP), nos primeiros anos de vida, os mecanismos de regulação emocional do cérebro, especialmente no córtex pré-frontal, podem se tornar hiperativos, suprimindo respostas naturais como o choro. “Daí a importância de dar espaço e oportunidades para a criança expor, à sua maneira, seus sentimentos e suas dúvidas sempre que precisar”.
Repressão Emocional: também chamado de estigma, constipação emocional, supressão emocional, entre outros nomes, o quadro se refere às emoções contidas e que não são facilmente acessíveis ou demonstradas.
Segundo a terapeuta sexual Claudia Petry, especialista em Educação para a Sexualidade pela Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC/SC), e professora no Instituto de Parapsicologia e Ciências Mentais de Joinville (SC); graças às redes sociais, a sociedade tem cultuado cada vez mais a invulnerabilidade.
“Celebridades são traídas, terminam relacionamentos, são ofendidas, mas não descem do pedestal. Adotam uma postura de dominância como mecanismo de defesa e lotam as redes sociais com fotos de alegria plena e textos que mais parecem de autoajuda. Além de afastar o direito de sentir e exteriorizar suas emoções, essa armadura emocional enaltece a cultura do ‘chorar é sinal de fraqueza’”.
Para a psicóloga Monica Machado, host do podcast Ame.Cast, mostrar o lado humano está fora de cogitação. “O exemplo que as pessoas famosas têm passado é algo como: engole o choro, levanta a cabeça, seja superior e vida que segue! Só que isso não é vida real”.
Segundo as especialistas, essa conduta acaba viralizando um padrão de comportamento que reprime as emoções consideradas negativas, motivando as pessoas a acreditarem que expressá-las pode resultar em julgamento por parte dos outros.
Transtornos mentais: determinados problemas de saúde mental também podem comprometer a facilidade do choro. Conforme a psiquiatra Danielle Admoni, pessoas com transtorno bipolar e transtorno esquizoafetivo têm um afeto plano e uma pequena gama de emoções.
“Já a depressão, ao contrário do que se pensa, não se manifesta necessariamente por meio de choro constante. Dentre seus diversos tipos e sintomas, a melancolia pode gerar uma sensação de vazio emocional e desconexão, tornando difícil reagir aos eventos e a capacidade de chorar”.
A anedonia, outro sintoma da depressão, é caracterizada pela perda total de interesse por qualquer atividade. “Pessoas com anedonia não sentem mais prazer nas coisas que costumavam fazer, e também podem ter uma resposta reduzida a estímulos negativos, incluindo sentimentos adversos e facilidade para chorar”, diz Danielle Admoni.
Estresse pós-traumático: passar por traumas durante a infância ou adolescência pode interferir no processo de regulação das emoções, gerando alterações complexas no cérebro, que seguem em desenvolvimento até os 25 anos.
Um estudo da Nature mostrou que jovens com histórico de Transtorno do Estresse Pós-Traumático (TEPT) apresentavam aumento da atividade na amígdala, uma região do cérebro responsável pelo processamento das emoções e do choro. Essa situação se torna ainda mais severa quando há exposição a traumas que provocam sequelas psicológicas múltiplas, como é o caso do abuso sexual.
“A violência sexual tem um impacto especialmente severo na saúde física e mental de um indivíduo, sobretudo para crianças. O trauma pode perdurar até a adolescência e mesmo até a idade adulta”, elucida a sexóloga Claudia Petry, especialista em Educação Sexual Infantil pela Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC/SC).
Considere ajuda profissional: a terapia pode ajudar a entender o que está sentindo, a processar essas emoções de forma saudável e a aprender a expressá-las. “Caso você tenha tido dificuldade para desabafar através do choro e perceba que seus níveis de estresse, tensão ou ansiedade aumentaram, talvez seja o momento de buscar um profissional que explore e compreenda suas questões internas”, finaliza Danielle Admoni.
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