Modesto – “É Mauro Modesto porque é mais fácil de gravar. É eufônico”, explica o homem que na verdade se chama Gilson Benício – organiza no chão cinza suas frases de efeito, escritas em azul. A mão manchada pela tinta expressa os pensamentos de alguém castigado por uma hérnia de disco, sem dente, ex-cobrador de ônibus, que hoje não encontra emprego “porque é feio”.

Costuma expor seus pensamentos na altura do número 200, em frente ao hospital Santa Catarina. As cartolinas, o homem e sua mala, onde carrega sua vida – as roupas, o que lhe resta depois de um casamento mal sucedido de dez anos, por causa da infertilidade da mulher – estão localizados entre o Espaço Haroldo de Campos e a escola pública Rodrigues Alves. Ele, que por sinal escreve bem, não chegou a estudar o colegial, cursou até a oitava série. Também não está no hall de grandes poetas nacionais, como Haroldo de Campos, um dos precursores do concretismo.

Modesto faz o tipo autodidata. Já leu grandes nomes da literatura: Tolstoi, Verne e Kafka. Diz que Pablo Neruda é sagrado. Convidado a visitar o Haroldo de Campos, estranha e nega o convite. Mal sabe que sua poesia, como a homenagem ‘Para São Paulo’, se encaixa bem no estilo.

E na caminhada por esse mundo de diferentes faces, não faltam pessoas assim anônimas, de futuro incerto, porém fundamentais no cenário. Camelôs se espalham pelas calçadas. A mercadoria é variada, mas o que a gente mais encontra são DVDs piratas que chegam a ser mais populares que as cerca de 40 salas de cinema da região.

Modesto não costuma ver filmes e também não freqüenta os vários tipos de restaurantes, de culinárias de vários países, da região. O poeta vive com a boa vontade dos que apreciam seu pensamento. Ganha em média 40 reais por dia, usados para pagar a pensão onde mora, o café da manhã de três pães com manteiga, o almoço (um chocolate Suflair) e a janta. “Ah, de noite eu como bem: bife, arroz e feijão. Pego no bar ali, que é baratinho”, explica.

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Ele não vai aos cinemas nem freqüenta os restaurantes

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