Quando Daniela Mercury veio a publico declarar seu amor por uma mulher, muita gente foi pega de surpresa. Sobretudo porque a cantora, mãe de cinco filhos, havia sido casada duas vezes, ambas com homens – coisa que, de acordo com “padrões da sociedade”, já a qualificaria como hétero de carteirinha.
Ao quebrar um “padrão”, Daniela não só ajudou a desmitificar um comportamento, como acabou gerando mais discussão em relação à homossexualidade, tão debatida em tempos de Marcos Feliciano. A saída do armário da cantora, muito além de uma libertação pessoal, como ela própria definiu, ainda fez com que o amor entre pessoas do mesmo sexo fosse fato discutido com a família reunida à mesa de jantar.
Para Gustavo Venturi, professor de sociologia da Universidade de São Paulo, a atitude da cantora ajuda a dissolver alguns paradigmas sociais: “A saída do armário de Daniela Mercury, que é considerada um símbolo sexual hétero, quebra os estereótipos do que é ser homossexual. Isso ajuda a fazer com que a heterossexualidade não seja a única orientação sexual a ser encarada como natural e coloca as outras identidades na lista”, disse.
O sociólogo ainda usa como exemplo a pesquisa nacional realizada pela Fundação Perseu Abramo sobre a temática da homofobia. Através de dados coletados no estudo que se transformou em livro (Diversidade Sexual e Homofobia no Brasil – Intolerância e Respeito às Diferenças Sexuais) foi constatado que a proximidade e contato com homossexuais diminui o preconceito. Portanto, segundo Venturi, a declaração de amor de Daniela pela jornalista Malu Verçosa é muito positiva para que a homofobia diminua na sociedade brasileira.
No entanto, Venturi ressalta que declarações de famosos assumindo comportamentos tidos como tabus quase sempre se dão em momentos em que vários outros fatores pressionam numa mesma direção.
É o caso de Arethuza Aguiar, a primeira divorciada do país em 1978, um ano após a aprovação da lei no Brasil. Antes disso, a mulher separada era vista com maus olhos na sociedade brasileira e recaia sobre ela a culpa pelo fracasso do matrimônio. Outro que quebrou padrões foi o cantor Cazuza, uma das primeira figuras públicas a se assumir gay no Brasil. Ele revelou sua orientação sexual nos anos 80, quando a homossexualidade era ainda um tabu muito maior do que atualmente.
“Movimentos feministas ajudaram a disseminar o direito ao divórcio e à pílula anticoncepcional quando eram considerados tabus, assim como os movimentos GLBT se manifestam a favor dos direitos dos homossexuais atualmente. Há sempre uma discussão na sociedade que facilita que esses famosos venham à tona e se manifestem publicamente. Eles sempre têm um grande incentivo, além da coragem de declararem algo que pode, de certa forma, macular sua imagem”, explica.